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Jeffrey Sachs: países neutros devem mediar conflito entre a Rússia e a Ucrânia

Provavelmente, nem a Rússia, nem a Ucrânia, conseguirão uma vitória militar decisiva na guerra em andamento

Jeffrey Sachs (Foto: Reuters)
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Artigo publicado originalmente na revista The Economist em 18.01.23. Traduzido e adaptado por Rubens Turkienicz com exclusividade para o Brasil 247

Provavelmente, nem a Rússia, nem a Ucrânia, conseguirão uma vitória militar decisiva na guerra em andamento entre elas: ambos os lados têm considerável espaço para escalá-la. A Ucrânia e os seus aliados ocidentais têm poucas chances de expulsar a Rússia da Criméia e da região do Donbas, enquanto a Rússia tem poucas chances de forçar a Ucrânia de se render. Como Joe Biden assinalou em outubro, a espiral de escalação marca a primeira ameaça direta de um “Armagedom nuclear” desde a crise dos mísseis cubanos há 60 anos.

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O resto do mundo também sofre junto, apesar de não ser na escala do campo de batalha. A Europa provavelmente está em recessão. As economias em desenvolvimento lutam com a crescente fome e a pobreza. Os fabricantes de armamentos estadunidenses e as grandes petroleiras têm ganhos inesperados, mesmo enquanto a economia dos EUA piora. O mundo sofre com a incerteza agudizada, a interrupção das cadeias de suprimento e os riscos horrendos de uma escalada nuclear.

Cada lado pode optar por uma guerra continuada, na crença que tem uma vantagem militar decisiva sobre o seu inimigo. Pelo menos uma das partes estaria equivocada em manter esta visão, ou provavelmente ambos. Uma guerra de atrito devastaria ambos os lados.

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No entanto, o conflito poderia continuar por outra razão: nenhum dos lados vê a possibilidade de chegar a um acordo de paz exequível. Os líderes ucranianos acreditam que a Rússia usaria qualquer pausa na luta para se rearmar. Os líderes russos acreditam que a OTAN usaria qualquer pausa na luta para expandir o arsenal da Ucrânia. Eles escolhem lutar agora, ao invés de enfrentar um inimigo mais forte depois.

O desafio é encontrar uma maneira de fazer um acordo de paz aceitável, crível e exequível. Eu acredito que o caso para uma paz negociada precisa ser ouvido mais amplamente — primeiro para poupar a Ucrânia de se tornar um campo de batalha perpétuo e, mais geralmente, como benéfico para ambos os lados e para o resto do mundo. Um forte argumento pode ser feito para envolver países neutros para ajudar a fazer cumprir um acordo de paz que beneficiaria a muitos.

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Um acordo crível precisaria primeiro atender os interesses de segurança centrais de ambas as partes. Como John F. Kennedy sabiamente disse no percurso para a assinatura de sucesso do Tratado Parcial de Proibição de Testes Nucleares [Partial Nuclear Test Ban Treaty] com a União Soviética em 1963, “pode se contar até mesmo com as nações mais hostis que aceitem e mantenham estas obrigações do tratado, e apenas aquelas obrigações do tratado que são do seu próprio interesse.”

Num acordo e paz, a Ucrânia precisa ser assegurada da sua soberania e segurança, enquanto a OTAN precisaria prometer não se expandir para o leste. (Apesar da OTAN se descrever como uma aliança defensiva, a Rússia certamente sente algo diferente e resiste firmemente à expansão da OTAN.) Algumas concessões teriam que ser encontradas com relação à Crimeia e a região do Donbas — talvez o congelamento e a desmilitarização destes conflitos por um período de tempo. Um acordo também será mais sustentável se incluir uma eliminação em fases das sanções contra a Rússia e um acordo entre a Rússia e o Ocidente de contribuírem para a reconstrução das áreas dilaceradas pela guerra.

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O sucesso disso pode muito bem depender de quem é incluído em tentar encontrar e fazer cumprir a paz. Como os próprios beligerantes não conseguem forjar tal paz sozinhos, uma solução estrutural chave está em trazer partes adicionais ao acordo. Nações neutras, incluindo a Argentina, o Brasil, a China, a Índia, a Indonésia e a África do Sul têm conclamado repetidamente por um final negociado para o conflito. Elas poderiam ajudar a fazer cumprir qualquer acordo que seja encontrado.

Estes países não odeiam nem a Rússia, nem a Ucrânia. Eles não querem que a Rússia conquiste a Ucrânia, nem que o Ocidente expanda a OTAN para o leste — o que muitos poderiam ver como uma perigosa provocação não só para a Rússia, mas também para outros países. A oposição à expansão da OTAN se agravou quando os radicais instaram a aliança a enfrentar a China. Os países neutros foram pegos de surpresa pela participação dos líderes da Ásia-Pacífico — Japão, Coreia do Sul, Austrália e Nova Zelândia — numa reunião de cúpula no ano passado, supostamente de países do “Atlântico Norte”.

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O papel de fazer a paz de importantes países neutros pode ser decisivo. A economia da Rússia e a sua capacidade de fazer a guerra dependem de continuadas e fortes relações diplomáticas e de comércio internacional com estes países neutros. Quando o Ocidente impôs sanções econômicas sobre a Rússia, as maiores economias emergentes – como a Índia – não seguiram o exemplo. Eles não quiseram escolher lados e têm mantido fortes relações com a Rússia.

Estes países neutros são importantes jogadores na economia global. Segundo as estimativas de PIBs do FMI com paridade de poder de compra, o produto combinado da Argentina, Brasil, China, Índia, Indonésia e Africa do Sul em 2022 (US$ 51,7 trilhões, ou quase 32% do produto mundial) foi maior do que este das nações do G7 juntas — EUA, Grã-Bretanha, Canadá, França, Alemanha, Itália e Japão. As economias emergentes também são cruciais para a governança econômica global e ocuparão a presidência do G20 por quatro anos consecutivos, bem como posições de liderança em importantes corpos regionais. Nem a Rússia, nem a Ucrânia querem desperdiçar as relações com estes países, o que os torna importantes garantidores potenciais da paz.

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 Além disso, muitos destes países procurarão polir as suas credenciais diplomáticas ao ajudarem a negociar a paz. Diversos deles, obviamente incluindo o Brasil e a Índia, são aspirantes a um longo tempo de assentos permanentes no Conselho de Segurança da ONU. A possível arquitetura de um acordo de paz poderia ser um acordo co-garantido pelo Conselho de Segurança da ONU com diversas das maiores economias emergentes. Em adição aos países mencionados acima, outros co-garantidores com credibilidade incluem a Turquia (que mediou habilmente as conversações Rússia-Ucrânia); a Áustria, que se orgulha da sua duradoura neutralidade; e a Hungria, que neste ano ocupa a presidência da Assembleia geral da ONU e tem conclamado repetidamente por negociações para acabar com a guerra.

O Conselho de Segurança da ONU e os co-garantidores imporiam medidas comerciais e financeiras acordadas na ONU contra qualquer parte que viole o acordo de paz. A implementação de tais medidas não estaria sujeita a veto da parte violadora. A Rússia e a Ucrânia teriam que confiar no jogo limpo dos países neutros para assegurar a paz e as suas metas de segurança.

Não faz sentido que a luta continue na Ucrânia. Não é provável que nenhum dos dois lados vença uma guerra que está devastando a Ucrânia atualmente, impondo custos massivos de vidas e lucros na Rússia e causando danos globais. Os principais países neutros, juntamente com a ONU, podem ser os co-grantidores para iniciar uma nova era de paz e reconstrução. O mundo não deveria permitir que os dois lados continuem numa espiral temerária de escalada.

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