Justiça derruba 'auxílio paletó' a políticos de SP
Dinheiro chegava conta dos parlamentares duas vezes ao ano; era para pagar despesas com enxoval; ministrio pblico achou um acinte; assembleia defendeu polticos, mas juiz mandou acabar com a farra
Fernando Porfírio_247 - A Justiça proibiu a Mesa da Assembleia Legislativa e o Governo paulista de pagar aos deputados estaduais paulista a verba conhecida como auxílio paletó. O privilégio é depositado duas vezes por ano na conta dos parlamentares. A decisão, em caráter liminar, é do juiz Luis Fernando Camargo de Barros Vidal, da 3ª Vara da Fazenda Pública da Capital.
“Concedo parcialmente a tutela antecipada a fim de determinar à Mesa da Assembleia Legislativa que não ordene ou pague a ajuda de custo discutida nos autos, e à Fazenda Pública do Estado de São Paulo que não disponibilize sob qualquer fundamento o dinheiro do orçamento público para fazer frente às despesas respectivas”, afirmou o juiz em despacho.
O pedido foi feito pelo Ministério Público de São Paulo que entrou com ação civil pública. No processo, o MP requereu o corte imediato da verba, oficialmente chamada ajuda de custo. Os promotores de justiça Saad Mazloum e Silvio Antonio Marques sustentaram que a verba, além de “absolutamente indevida” seria “lesiva ao patrimônio público” e “flagrantemente atentatória ao princípio da moralidade".
Em 28 páginas, a Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social – braço do Ministério Público que combate improbidade e corrupção – aponta a inconstitucionalidade da verba. A ação questiona o artigo 1º da Lei Estadual 11.328/02 e os parágrafos 2º a 4º do artigo 88 do Regimento Interno da Assembleia, que garantem a concessão do auxílio paletó.
A Assembleia se defendeu. Alegou que a ajuda de custo é constitucional, pois é paga de acordo com o modelo de remuneração federal, criado por decreto legislativo. Além desse fato, o pagamento se ampara em lei estadual e no Regimento Interno. Sustentou, ainda, que a implantação do modelo de pagamento por subsídios não exclui o pagamento de parcelas remuneratórias.
Liminar
Na concessão da liminar o juiz entendeu de maneira diferente. Para o magistrado, a lei estadual excede os limites impostos pela Constituição Federal e Estadual, ao deixar de observar o regime dos subsídios nelas previsto na medida em que acresce duas parcelas às ordinárias.
“Não é difícil de perceber que a lei estadual, ao compor a remuneração dos deputados estaduais com os valores devidos no início e final de cada sessão legislativa, ordinária ou extraordinária, acresce duas parcelas de subsídios, pagas no começo e no final de cada ano”, afirmou o juiz.
De acordo com o magistrado, esta remuneração dos deputados estaduais, que corresponde a 75% dos vencimentos dos deputados federais, deve ser paga, na forma de subsídios, e em parcelas mensais únicas, sendo proibido qualquer acréscimo remuneratório.
O juiz afastou qualquer justificativa para a duplicidade de parcelas no pagamento dos subsídios dos deputados paulista. “Sendo uma espécie remuneratória de trabalho permanente, significa que é pago periodicamente”, afirmou o magistrado. “Logo, a unicidade do subsídio correlaciona-se com essa periodicidade”, acrescentou.
Para o juiz, a parcela do subsídio é única em cada período, que, por regra, é o mês. “Trata-se, pois, de parcela única mensal”. De acordo com o magistrado, historicamente, "subsídio" era uma forma de retribuição em duas parcelas: uma fixa e outra variável.
O pedido
A promotoria pediu que a Mesa Diretora da Assembleia se abstenha – sob pena de multa diária de R$ 100 mil – de efetuar o repasse e pagamento aos deputados da segunda parcela da ajuda de custo do exercício de 2011 e das parcelas dos demais exercícios subsequentes, “bem como não crie outra verba remuneratória ou indenizatória com natureza semelhante”.
O auxílio paletó cai na conta dos parlamentares no início e no encerramento de cada sessão legislativa. O valor corresponde ao subsídio mensal do deputado. Historicamente, o reforço no contracheque foi adotado para permitir aos deputados a renovação de seu guarda-roupas. Então passou a ser chamada de “auxílio enxoval”.
Não deu outra: virou chacota nacional. O privilégio mudou de nome e objetivo – virou ajuda de custo “para compensação de despesa com transporte e outras imprescindíveis para o comparecimento à sessão legislativa ordinária ou à sessão decorrente de convocação extraordinária”.
“Em que pese a tentativa do Parlamento estadual de caracterizar a ajuda de custo como verba indenizatória no momento de sua criação, não se verificou no plano fático tal natureza jurídica, eis que o auxílio paletó, na realidade, possui todas as características de verdadeira verba remuneratória”, advertem os promotores Saad Mazloum e Silvio Antonio Marques.
A ação aponta a inconstitucionalidade da Lei Estadual 11.328/02 e do Regimento Interno da Assembleia. “Referidas normas e o comportamento do administrador em dar-lhes cumprimento ferem de morte o princípio constitucional da moralidade”, afirmam os promotores.
De acordo como o Ministério Público, gastos com transporte e demais despesas inerentes ao exercício das funções dos deputados já estão previstos no dispositivo denominado Auxílio Encargos Gerais de Gabinete de Deputado, criado pela Resolução 783/1997.
O MP ressalta que o Auxílio Encargos Gerais corresponde mensalmente a 1.250 Unidades Fiscais do Estado (Ufesps) para cada deputado, o equivalente a R$ 21.812,50. “Todas as demais despesas já estão devidamente cobertas com o pagamento do mencionado auxílio, inexistindo motivo razoável ou causa jurídica própria que justifique o auxílio paletó”.
“Trata-se de ofensa ao princípio do devido processo legal”, diz a ação. “Os atos do poder público que se revelem injustos, desproporcionais ou não razoáveis, são inconstitucionais”. Os promotores anotam que a ajuda de custo nunca foi de natureza indenizatória.
A promotoria observa que o pagamento com habitualidade da ajuda de custo, a ausência de destinação específica, a dispensa de comprovação de despesas e a incidência de Imposto de Renda confirmam sua natureza remuneratória.
“A inclusão da ajuda de custo na remuneração dos parlamentares consiste em evidente burla à determinação constitucional de remuneração por subsídios em parcela única, devendo ser obstado seu pagamento, configurador de evidente prejuízo ao erário”, escreveram os promotores.
O auxílio paletó é dividido em duas parcelas. A primeira é percebida por todos os deputados. A segunda apenas é devida aos que comparecerem a pelo menos dois terços das sessões ordinárias ou extraordinárias da Casa. “Todos os parlamentares recebem a primeira parcela sem a comprovação de qualquer despesa. Manifesta a imoralidade”, assinalam Mazloum e Marques.
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