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    Marina Silva: Mobilizações eram questão de tempo

    Presidenciável, ex-senadora diz que vem dizendo há muito tempo que não demoraria para que os movimentos virtuais se transbordassem para o presencial; "Está surgindo um novo sujeito político e um novo ativismo", diz Marina Silva, em entrevista ao Valor Econômico; ela se diz representada pela borda que está se movimentando; "Eu estou nestes protestos. Eles estão em mim"

    Marina Silva: Mobilizações eram questão de tempo

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    247 – Provável candidata à presidência da República pelo Rede Sustentabilidade, ainda em fase de criação, Marina Silva diz que vem dizendo há muitos anos que era questão de tempo para que as mobilizações virtuais se transformassem em presenciais. Em entrevista ao jornal Valor Econômico, a ex-senadora afirma ainda que a motivação para os protestos que ocorrem em todo o País é o surgimento de "um novo sujeito político no mundo".

    Ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva também alerta, na entrevista, que os vinte centavos são o símbolo das manifestações, e neles "estão incluídos o hospital que não funciona, o problema de segurança e a falta de canais para que se saiba qual é a agenda estratégia do País". Segundo ela, "os antigos partidos políticos vão ter que se repensar". Leia abaixo os principais trechos da entrevista, publicada na íntegra no site do Valor.

    Surgimento das mobilizações

    Venho dizendo há muito tempo que era só uma questão de tempo para que essas mobilizações virtuais transbordassem para o presencial.

    Porque está surgindo um novo sujeito político no mundo, e no Brasil não é diferente. Ele é uma característica deste tempo, que combina a grande quantidade de informação a que as pessoas têm acesso com a grande possibilidade de comunicação entre elas. E isso vai transformar a política. Todos os setores da sociedade estão sofrendo a influência da internet. Os negócios estão sendo transformados, os sistemas educativos, a produção de conhecimento, os meios de comunicação. Não sei por que as pessoas achavam que só a política ia ficar do mesmo jeito.

    Como vê os movimentos

    Neste momento temos uma crise econômica, social, ambiental, política e de valores, uma crise civilizatória. Estes movimentos não têm um centro único, são multicêntricos. E têm um núcleo estagnado. Há uma quantidade muito grande de pessoas que começam a sair desta estagnação e ir para a borda que está se movimentando.

    Liga dos movimentos

    Algo que os une é melhorar a representação e ampliar a participação. Mas cada um, como é livre, baixa a âncora ou levanta a âncora. Se está ou não concordando com aquela causa, vai à luta, vai à praça. Há uma liberdade, uma mobilidade. Não existe a velha forma do comando e se pode negociar pelo conjunto porque é um processo horizontal e com grande quantidade de pessoas. É por isso que há uma dificuldade grande dos que não conseguem perceber isso, de conversar com esses movimentos. Você não pode falar por um grupo achando que fala por todos. Nesta borda não tem centro, uma hora você é arco, outra hora é flecha; uma hora você lidera, outra hora é liderado. Neste momento me sinto liderada por este novo sujeito político e espero que se consiga fazer do Brasil a referência que poderia ser, de uma nova economia, que faça o deslocamento para modelos sustentáveis.

    O que dizem as manifestações

    Estão dizendo: vocês foram eleitos para me representar e estão nos substituindo, nós estamos retomando a prerrogativa de quem não está se sentindo legitimamente representado.

    Qualidade política

    No país do futebol, próximo à Copa do Mundo e em plena Copa das Confederações, as pessoas dizem claramente: "Queremos que o dinheiro do país seja investido em educação, em saúde, em segurança". Isso é um avanço, tem qualidade política. Podem dizer: "Ah, mas vai passar e não vai dar em nada." Talvez este novo sujeito politico tenha mais potência para as grandes transformações positivas do que tiveram as grandes mobilizações do ABC paulista que nos trouxeram até aqui, com os ganhos e as derrotas que tivemos. Porque os que eram transformadores e revolucionários, depois se tornaram conservadores. Esse novo sujeito político é desse tempo, da mesma forma que os sonhadores da década de 70, 80, 90 como foi o Lula, como foi o Florestan (Fernandes), como foi Darcy Ribeiro, Paulo Freire, Marilena Chauí e tanta gente que foi a sustentação daqueles movimentos. E muita gente era conservador e ficava tentando reter a corrente de água, se colocavam contra. Mas existiram aqueles que contribuíram para que algo pudesse surgir.

    Tarifa foi baixada. O que sobra?

    Não é o que sobra, é o que continua. Continuará com certeza a latência que está por trás do que levou milhares e milhares de pessoas às ruas. Elas não estão indo só pela tarifa, mas para dizer que não querem ser meros espectadores. Isso está acontecendo há algum tempo. As pessoas estão achando que podem continuar combinando em suas alcovas os interesses do país e os manifestantes estão dizendo que não querem mais estes segredos na República. É isso que está sendo dito.

    Não deram ouvidos antes

    Infelizmente os partidos foram se tornando projetos de poder pelo poder, achando que estão no controle. Veja as pesquisas: 84% da população não queria mudanças no Código Florestal. Não se deu ouvido. Fizeram uma mobilização de 1,5 milhão de pessoas contra o Renan (Calheiros), não deram a mínima bola e até desqualificavam: "Isso é coisa no virtual, na internet, não vale". E eu repetia: vai transbordar. Agora há que haver uma elaboração no acolhimento de tudo isso que está acontecendo. O Brasil é o lugar onde é possível que a força transformadora dessa borda que está aí se movimentando seja uma mutação e não uma ruptura abrupta.

    O que é isso?

    Uma mutação possibilitadora. Quando começamos o processo da Rede Sustentabilidade dizíamos que não é apenas um partido novo, é um novo partido que terá que ser horizontal, que não terá a velha fórmula estagnada e verticalizada e que tem que ser uma ferramenta para tentar contribuir com este novo sujeito politico que surge. Acho que os antigos partidos políticos vão ter que se repensar. Para mim, que estou há mais de 30 anos nesta borda, existe uma certa leveza.

    Por quê?

    Eu me sinto representada por esta borda que está se movimentando.

    Análise sobre a redução da tarifa pelos governos

    Temos que ter um aprendizado disso. Uma coisa é uma demanda objetiva que pode até ser atendida. Mas tem um tesouro muito maior para ser trabalhado, que é o que está em estado de latência. Se formos capazes de entender, todos nós, esta latência que está aí, vamos sair maiores e melhores para a democracia do que antes deste movimento aflorar. Alguém não se engane que vai dar os vinte centavos e "Pelo amor de Deus, saiam da rua, vão pra casa", e isso está resolvido. Não é isso, pelo contrário. Tem uma riqueza enorme para ser trabalhada, porque este novo sujeito político é protagonista. É melhor procurar entender o que pode ser produzido a partir daí.

    Por que a senhora não está nos protestos?

    Eu estou nestes protestos. Eles estão em mim. Há muitos anos estou andando este Brasil inteiro, no ano passado dei 129 palestras e vejo que está surgindo este novo sujeito político. Agora, se vou no protesto, vou como mais um. Minha escolha de não estar ali é para não ter nenhuma atitude de instrumentalização ou seria incoerente com o que estou dizendo. Que este ativismo é autoral, que não é dirigido pelo partido, nem pelo sindicato nem pelos líderes carismáticos. As pessoas têm que parar de se iludir que existem salvadores da Pátria. Existem homens e mulheres que juntos se dispõem a construir a Pátria.

    Nas manifestações se recolheram assinaturas para o Rede?

    Não quisemos fazer isso por respeito a este ativismo autoral, estamos colhendo assinaturas nos espaços adequados. Seria uma contradição. Este partido não é para ter os movimentos a serviço dele, mas para contribuir com eles. Não pode ser goela abaixo.

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