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Brasília

O tesouro, objeto íntimo

O homem do dinheiro vai ter que lidar com o lado menos edificante da política e conferir de perto com quanta cartilagem se faz uma salsicha

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Em 1920 os puritanos e moralistas dos Estados Unidos tanto lobby fizeram que criaram uma lei proibindo a venda e o consumo de bebida alcoólica. O famoso Volstead Act, que decretava o início da Lei Seca (que durou mais de uma década), pode ser interpretado como um esforço ingênuo a fim de preservar a saúde da sociedade, mas também lido como um ato deliberado de burrice. Prefiro acreditar que civilizações emburrecem de repente, por motivos insondáveis.

Proibir a bebida também parecia uma péssima idéia a muita gente na época. Por outro lado, era uma bela perspectiva de investimento. Convencido disso, o tesoureiro do partido Republicano em Atlantic City Enoch L. Jhonson fez do contrabando uma máquina de fazer dinheiro pras campanhas dos seus correligionários. Com uma dedada se descobre que Jhonson não era só um tesoureiro, mas também gangster, mafioso e racketeer (escroque, extorsionário). Chamá-lo só de “corrupto” é elogio.

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Extravagante e violento, contemporâneo de Al Capone, um personagem dessa envergadura dava um filme. Melhor que isso, deu a série da HBO Boardwalk Empire, que nos leva aos anos 20 com um profissionalismo acachapante e uma contextualização histórica de alto valor agregado. Interpretado por Steve Buscemi e ficcionalizado como um tal Nucy Thompson, esse crápula adorável diz o seguinte no dia em que a lei é decretada: “ Senhores, como vocês sabem, em menos de duas horas a bebida será tornada ilegal pelos nossos nobres legisladores no congresso. Um brinde a esses bastardos ignorantes!” E as taças se erguem.

A ignorância dos legisladores bem intencionados fez um mal tremendo ao país. Ninguém parou de beber por causa da lei, só que agora existia tráfico, contrabando e guerra de gangues, além da bebida ser da pior qualidade. O uísque miserável que fabricavam em quase nada diferia da pura e simples gasolina. Hoje ocorre o mesmo com a maconha, já que os usuários são expostos aos piores venenos e ao constrangimento policial se querem fazer um simples movimento. Quem sai ganhando é o traficante.

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Longe de mim a leviandade de supor que os tesoureiros dos partidos políticos brasileiros tenham qualquer espécie de relação com o tráfico de drogas. Mas de tráfico de influência muitos já foram acusados e, a bem da verdade, não se pode ser tesoureiro impunemente. O homem do dinheiro vai ter que necessariamente lidar com o lado menos edificante da política e conferir de perto com quanta cartilagem se faz uma salsicha.

Ricardo Sergio, tesoureiro do PSDB nos anos noventa, é assim descrito na Privataria Tucana de Amary Ribeiro Jr: “Mister Big fuma Romeo y Julieta, cubanos de alta estirpe, desfruta vinhos de quatro dígitos, gosta de jogar tênis e, para alívio do Tucanato, é avesso a badalações.” Já no site da Veja descobre-se que Delúbio Soares, “centro do furacão do escândalo do mensalão como tesoureiro do PT, foi expulso do partido do mesmo ano em que a maracutaia veio à tona – 2005.” Depois reintegrado, o ex tesoureiro hoje pensa carreira política e até escreve colunas em certos veículos.

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Esses caras tem influência política. Em certos aspectos são como Nucky Thompson, tesoureiro de partido, que mandava a desmandava em Atlantic City nos tempos da Lei Seca calando a boca de todo mundo. Mandava mais que o prefeito. Peitava o governador do estado. Falava de igual pra igual com congressistas, muita vezes não escondendo o seu desprezo. Sabia dos podres de todo mundo. Arrecadava dinheiro de maneira ilegal, já que as leis eram imperfeitas. Sua função era arrecadar, afinal de contas.

Imagino Ricardo e Delubio sorrindo ironicamente e evocando aquela canção sempre que escutam notícias sobre esforços de moralização do sistema eleitoral e financiamento público de campanha. “Esses moços, pobre moços... ah, se soubessem o que eu sei...” O tema da pessoa que sabe mais do que deve é inclusive reutilizado em Tudo Pelo Poder (2011), dirigido por Geroge Clooney. No caso, um assessor de imprensa sabe de um segredo cabeludo e impublicável e chantageia o político idealista interpretado por Clooney. No final todo mundo acaba se corrompendo.

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Assessores, consultores, advogados e os poderosos tesoureiros orbitam o homem público maculando de realismo o mundo das idéias e dos discursos. Os bastidores, afinal, são muito maiores que o palco, que dura enquanto as câmeras estão ligadas e os jornalistas curiosos empunham com galhardia seus gravadores e cadernetas. Mas e todo o resto, e vida não gravada? Faça as contas. Eles fazem.

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