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Ginecologistas de hospital em comunidade de SP são flagradas em compras e pilates durante expediente

A cozinheira Rita de Cássia relata que tenta marcar atendimento há mais de seis meses e nunca encontra vaga

Hospital Heliópolis (Foto: Reprodução)

247 - Uma investigação publicada pelo g1, revelou que três médicas ginecologistas do Ambulatório de Especialidades do Complexo Hospitalar Heliópolis, na Zona Sul de São Paulo, foram flagradas realizando atividades pessoais — como compras e aulas de pilates — durante o horário em que deveriam estar atendendo pacientes. A reportagem acompanhou a rotina das profissionais por um mês.

Segundo mostrou a apuraçã, as médicas Márcia Kamilos, Silmara Fialho e Mara Gomes constam oficialmente na escala de ginecologia, afixada na recepção do ambulatório. Entretanto, pacientes afirmam enfrentar grande dificuldade para conseguir consultas na especialidade, mesmo após meses de tentativas.

A cozinheira Rita de Cássia relata que tenta marcar atendimento há mais de seis meses e nunca encontra vaga. A resposta, diz ela, tem sido recorrente: “Ah, moça, não está tendo vaga para ginecologista. A gente está sem. A gente está sem médico, na verdade, né?” A irmã de Rita vive situação semelhante. Ela afirma se sentir desrespeitada: “A gente vai marcar e não tem. É difícil. A gente se sente humilhada. Você contribui, trabalha a vida inteira, contribui com seus impostos. Se o SUS existe, agradeça a gente porque é pago os impostos, e quando a gente precisa tudo é negado”.

Médica afastada por atestado continua atuando na rede privada

A TV Globo constatou que a ginecologista Márcia Kamilos não comparece ao hospital há um ano. Um atestado médico de 365 dias, emitido em dezembro de 2024, justificou o afastamento por “capacidade laborativa prejudicada”.

Apesar disso, a reportagem conseguiu marcar consulta com Kamilos em uma clínica particular nos Jardins. A profissional também participou de congressos, ministrou aulas e palestrou em diferentes estados ao longo de 2025 — atividades registradas por ela mesma nas redes sociais.

Silmara Fialho: atrasos, saídas antecipadas e faltas

A rotina de Silmara Fialho também foi monitorada. De acordo com sua escala, ela deveria trabalhar às segundas-feiras, das 7h às 15h, e às quartas, das 7h às 14h. No dia 17 de novembro, porém, bateu ponto às 7h38 e deixou o hospital duas horas antes do fim do expediente, sem registrar saída.

Dois dias depois, em 19 de novembro, chegou ao trabalho com uma hora e meia de atraso, atendeu até 12h30 e voltou a deixar o hospital antes do horário. Em outro momento, a equipe do SP2 flagrou Silmara fazendo compras na zona cerealista de São Paulo enquanto ainda deveria estar em atendimento. Em 24 e 26 de novembro, ela sequer compareceu ao trabalho.

Pilates e longas ausências do hospital

A ginecologista Mara Gomes também foi registrada cumprindo uma rotina diferente da prevista em sua escala — que determina 10 horas de trabalho às segundas e quartas e seis horas às sextas.

Em 19 de novembro, a TV Globo observou que, após bater o ponto às 7h, a médica deixou o hospital e permaneceu por três horas fora do local. Nesse período, ela fez aula de pilates, almoçou e só depois retornou ao ambulatório, sem ter atendido pacientes pela manhã. Em 24 de novembro, Mara voltou a sair após bater o ponto, quando foi novamente flagrada em uma aula de pilates em São Caetano do Sul.

Remuneração e ausência de respostas

Dados do Portal da Transparência do Estado de São Paulo mostram que, entre janeiro e outubro de 2025, as três médicas somaram mais de R$ 210 mil em remunerações.

A médica Márcia Kamilos afirmou, por meio de nota, que seu afastamento é de conhecimento da administração do hospital e está devidamente amparado por documentação. Já Silmara Fialho e Mara Gomes não responderam às tentativas de contato da reportagem: cinco ligações e mensagens enviadas por aplicativo não foram atendidas até a publicação.

Governo cobra apuração e pode aplicar sanções

Em nota, a Secretaria Estadual da Saúde informou ter determinado à organização social Albert Einstein — responsável pela gestão do Hospital Heliópolis — a apuração imediata e rigorosa dos fatos. A pasta afirmou repudiar “qualquer conduta incompatível com a ética profissional” e destacou que eventuais irregularidades poderão resultar em sanções administrativas, trabalhistas e legais.

A Organização Albert Einstein declarou apenas que iniciou melhorias nos mecanismos de controle interno, incluindo a implementação de registro de ponto por biometria facial, para aprimorar a supervisão das equipes.