Máfia dos transportes: ação que aponta prejuízo de R$ 30 bi aos cofres públicos de SP será julgada após seis anos
A 13ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo está prestes a julgar, conjuntamente, dois processos que somam mais de 50 mil páginas. As denúncias de irregularidades encontram respaldo na constatação do Tribunal de Contas do Município de que os cofres públicos sofreram prejuízo de 30 bilhões de reais por mais de 16 anos
Por Paulo Henrique Arantes, para o 247 - Há quanto tempo o leitor e a leitora não têm notícia da máfia paulistana dos transportes? Pois agora essa frente de corrupção e ineficiência voltará à cena. A 13ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo está prestes a julgar, conjuntamente, dois processos que somam mais de 50 mil páginas – o primeiro, fruto de ação popular movida em 2015 pelo advogado Wellington Catta Preta Costa; outro, de 2020, decorrente de ação civil de improbidade movida pelo Ministério Público do Estado de São Paulo. Ambos foram considerados conexos pela Justiça.
As denúncias de irregularidades encontram respaldo na constatação do Tribunal de Contas do Município de que os cofres públicos sofreram prejuízo de 30 bilhões de reais por mais de 16 anos de não realização de licitação para contratação de empresas de transporte coletivo para prestação de serviços à população. São gastos excepcionais, efetuados para contratações em caráter emergencial.
Os contratos licitados da Prefeitura com as empresas de transporte, firmados em 2003, venceram em 2013. Novos editais de licitação foram lançados e apresentados ao Tribunal de Contas, todos suspensos por conter irregularidades, o último deles em 2018, mais de um ano depois de anunciado pelo então prefeito João Doria. O TCM mais uma vez suspendeu a licitação por irregularidades, e o conselheiro Edson Simões indicou que o custo dos atrasos seria de aproximadamente R$ 30 bilhões de reais.
Segundo o Sindimotoristas (Sindicato dos Motoristas e Trabalhadores em Transporte Rodoviário Urbano de São Paulo), o TCM encontrou 51 irregularidades e 20 impropriedades no último edital. A Prefeitura foi notificada e só poderá retomar o processo licitatório quando proceder a todas as correções.
“Para o TCM, as contratações emergenciais de empresas que surgiram de cooperativas custam 50% mais que se as operações fossem regidas por contratos já definidos. O órgão considera astronômicos os valores da remuneração bruta às empresas de ônibus que surgiram das cooperativas”, observou o Sindimotoristas.
“A Constituição diz que contratos emergenciais só podem ser firmados pelo prazo máximo de 180 dias - passou disso, é ilícito. A Prefeitura firmou diversos contratos emergenciais com várias empresas de ônibus que beneficiaram os empresários. Eles cobraram quanto quiseram e isso deu 30 bilhões de reais. É um escárnio com a população”, indigna-se Wellington Catta Preta Costa.
O advogado relatou ao Brasil 247 seu périplo judicial até que a ação popular que moveu chegasse à fase de julgamento em que está agora.
“Eu entrei com essa ação inicialmente contra a Prefeitura e a Câmara dos Vereadores, porque eles são os responsáveis por executar e fiscalizar os serviços de ônibus, conforme a Lei Orgânica Municipal. O Ministério Público entendeu o meu processo, mas a promotora inicial foi substituída. Depois, outros promotores da ação também foram trocados. Vieram promotores das mais variadas esferas, nenhum do Patrimônio Público e Social, que é a área responsável para esse tipo de ação. Cinco anos depois, o MP, por meio de outro promotor, este do Patrimônio Público e Social, ingressou com a ação que está sendo conexa com a minha e afirmando tudo que eu afirmei na minha ação”, relata Catta Preta. “Esse promotor arrumou mais provas e na minha ação principal fui ordenado a incluir José Ruas Vaz, apontando-o como o maior responsável e formador de conluios para se manter no poder e no controle das empresas de ônibus”.
José Ruas Vaz é dono da Caio Induscar e considerado o “magnata” dos transportes públicos de São Paulo. Segundo Catta Preta, Vaz controla 90% da frota de ônibus na capital paulista. Paralelamente, o “mercado” de vans, mini-ônibus e Kombis nas regiões periféricas é controlado pelo PCC, diz o advogado, ratificando o que é sabido há tempos.
"O PCC utiliza o meio de transporte público para lavagem de dinheiro, segundo denúncias de vários meios de comunicação, e, se é assim, para eles é o melhor meio, tendo em vista que os transportes não emitem recibo ou nota, sendo fácil manipular o sistema", diz Catta Preta.
"Você pode entrar em qualquer ônibus e perguntar quem é o dono da empresa. Eles dirão: José Ruas Vaz. Se você perguntar para qualquer taxista, qualquer cobrador de lotação, qualquer um nesses ônibus menores, principalmente da periferia, eles vão falar que o PCC está envolvido”, denuncia o advogado.
A atuação do PCC no transporte público é investigada pelo Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), órgão do Ministério Público do Estado de São Paulo, mas sem resultados efetivos.
Do empenho de Wellington Catta Preta Costa pode resultar a solução de um dos maiores problemas da cidade de São Paulo - a má qualidade dos transportes públicos, que vêm sofrendo redução de frotas, "com ônibus lotados e ultrapassados, que agridem o meio ambiente e as pessoas, contrariando inclusive lei municipal prevendo que todos os ônibus deveriam ser movidos por combustíveis não fósseis até 2019 no município. Não conseguiram cumprir a lei e a revogaram, contrariando a Lei de Introdução as Normas do Direito brasileiro", afirma o advogado.
