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O “previsível e anunciado” fogo no Borba Gato: entenda

Historiadora Deborah Neves avalia que o incêndio na estátua do personagem neste sábado em São Paulo se deve a um ‘silêncio’ do Estado, que não quis debater a mudança de nome de ruas e espaços públicos no Estado, além da retirada de monumentos

Incêndio na Estátua do Borba Gato (Foto: Reprodução/Instagram)
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Por Deborah Neves, no Opera Mundi - Quatro anos atrás eu dei uma entrevista para o El País falando sobre a redução do debate a “vandalismo” quando alguém fazia ação direta em monumentos aqui no Brasil. Foi quando rolou aquela treta em Charlottesville que virou até cena de Infiltrado na Klan.

Os movimentos populares vem dando a letra que, cedo ou tarde, algo do tipo aconteceria aqui.

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Ano passado, a Deputada Erica Malunguinho fez um projeto de lei que propunha debater a mudança de nome de ruas e espaços públicos no Estado de São Paulo, além da retirada de monumentos com um conselho permanente formado por estado e sociedade civil pra isso (PL404/2020).

Eu fiz um parecer técnico falando que o debate era necessário, sugeri a realização de inventários participativos e audiências públicas para tornar o debate o mais amplo e democrático possível.

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Estranhamente, o meu parecer que era apenas consultivo, de praxe entre o Legislativo e o Executivo, foi para deliberação do Condephaat que, pautado por um voto permeado de equívocos, falsas simetrias e senso comum, fez moção contrária ao Projeto de Lei. Chamaram inclusive de “revisionismo”. Retrato do que pautou o debate em 2020 - o conservadorismo e o apego à normalização do passado violento e escravista que dita nossa sociedade desde 22 de abril de 1500.

O PL não foi adiante por uma questão jurídica menor, que poderia ser corrigido nas comissões.

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Ou seja, o Estado lavou as mãos. Não ouviu o clamor popular legítimo e necessário, urgente e não se colocou no papel de mediador que cabe ao Estado Democrático. Escolheu se calar e deixar o barco correr.

Daí hoje, depois de muitos avisos antecipados, botaram fogo no Borba Gato. Previsível, anunciado. O silêncio conivente do Estado contemporâneo teve um preço.

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E o que virá agora? Debate público pra “apagar o incêndio”, com todo o trocadilho possível? Não.

Virá a criminalização da pauta, virá o grito dos preservacionistas de ocasião que só se importam com a dilapidação e a depredação de alguns bens públicos enquanto outros estão aí, sendo pilhados, demolidos, abandonados, destruídos ou concedidos para privados com contratos que têm tudo, menos interesse público. 

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“Vandalismo”, “bandidos” etc etc. Não haverá debate qualificado. Vai ter criminalização.

Os recursos públicos que serão empenhados para investigar, perseguir e punir os responsáveis pela ação direta de hoje poderiam ter sido investidos ao longo dos anos para fazer política pública proativa.

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Mas no Brasil o que importa mesmo é ação dos órgãos públicos para punir. A mentalidade do Estado é a de ditar regras e nunca ouvir a população pra mudá-las. O Estado brasileiro só faz audiência pública pra cumprir protocolo exigido pela legislação.

Então, não surpreende a ação de hoje. Nem a reação que já começou. Temos um longo passado pela frente. E nem a Lei de Anistia de 1979 conseguiu fazer esse passado passar.

*Deborah Neves é historiadora da Unidade de Preservação do Patrimônio Histórico da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo, vinculada ao Condephaat. É autora do livro "A Persistência do Passado: Patrimônio e Memoriais da Ditadura em São Paulo e Buenos Aires" (Editora Alameda, 2018). Texto publicado no Facebook da autora.

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