Curso leva práticas integrativas de saúde a comunidades camponesas do Paraná
Iniciativa do Projeto Bem Viver promove formação em Pics, agroecologia e saúde popular, com foco em mulheres e territórios da reforma agrária
247 - Um novo olhar sobre a saúde vem ganhando espaço em comunidades camponesas do Paraná, por meio da articulação entre agroecologia e saberes populares. Como destacou reportagem da Brasil de Fato, as Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (Pics) estão no centro de um projeto de formação que busca fortalecer o cuidado integral nas áreas da reforma agrária. Com enfoque no território, na cultura local e no bem-estar das pessoas, essas práticas propõem um modelo de atenção que ultrapassa o tratamento dos sintomas, promovendo a saúde como um direito coletivo e ambiental.
As Pics tratam o ser humano em sua totalidade – física, emocional e social – e integram uma política nacional do SUS, reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como parte das Medicinas Tradicionais, Complementares e Integrativas (MTCI). No Brasil, o SUS oferece 29 modalidades dessas práticas, entre elas a fitoterapia, a homeopatia e a aromaterapia. Ao se basearem em saberes ancestrais e no respeito à natureza, elas representam também uma conquista da saúde popular e um elo com a agroecologia.
Para expandir o acesso e a formação em torno dessas práticas, o Projeto Bem Viver, coordenado pelo Instituto Latino-Americano de Agroecologia Contestado (ICA), promove cursos voltados especialmente a mulheres camponesas. A iniciativa conta com o apoio da Itaipu Binacional, por meio do programa Itaipu Mais que Energia, da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste) e do Setor de Saúde do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
“A gente pensa em utilizar um medicamento ou uma metodologia para sanar aquela dor daquele estômago. Quando a gente pensa esse olhar dentro da saúde integrativa, eu vou investigar quais são as causas que estão levando ao adoecimento do estômago dessa pessoa”, explica a farmacêutica Ana Carla Prade, que atua no SUS de São Bento do Sul. “É um exemplo de uma prática simples, de baixo custo, acessível, que as pessoas podem se beneficiar muito e que tem dentro do SUS”, completa.
Além da atuação clínica, Prade reforça o potencial das Pics em territórios muitas vezes negligenciados pela saúde institucionalizada. “A saúde popular é capaz de acessar pessoas e territórios que a saúde institucionalizada não chega – do campesinato, por exemplo.”
A coordenadora do Setor de Saúde do MST, Sirlei Moraes, destaca a importância das formações para o cuidado cotidiano no campo. “No Paraná temos áreas que não têm ainda o agente comunitário do município, então quem faz o papel do cuidado somos nós mesmas, nossas famílias”, relata. Camponesa do assentamento Guanabara, em Imbaú, Sirlei integra um coletivo de produção agroecológica e defende: “Agroecologia é saúde, saúde é agroecologia.”
Uma das referências na integração entre Pics e medicina tradicional é a Unidade Básica de Saúde (UBS) Chica Pelega, no assentamento Contestado. A UBS conta com sala de terapias como a auriculoterapia e um horto medicinal. Maria Natividade de Lima, que atua há mais de 30 anos com saúde popular, alerta: “Ingestão de comida envenenada e de água contaminada levam o povo a ingerir medicamentos alopáticos, que também envenena. Tratam só dos sintomas e não vão na causa.”
Para Maria, preservar a saúde passa por proteger a natureza: “Temos que aprender a proteger as cabeceiras de rios para abastecer as famílias com água limpa.”
A educanda Cláudia Feltrin, do assentamento Eli Vive, em Londrina, valoriza o resgate dos saberes tradicionais: “A saúde não é a ausência de doença, é ter nossos direitos, que sempre são negados. [...] É não esquecer a ancestralidade. Minha vó era benzedeira, foi daí que me interessei pelas plantas medicinais.”
Com carga de 130 horas, o curso das Pics inclui aulas teóricas, oficinas, visitas de campo e intercâmbio entre comunidades. As etapas já realizadas passaram por Lapa, Maringá e Rio Bonito do Iguaçu, com encerramento previsto para junho, no campus da Unioeste em Foz do Iguaçu. As educandas também constroem hortos comunitários e preparam uma cartilha sobre saúde popular e uso de ervas medicinais.
Além do curso, o Projeto Bem Viver desenvolve outras ações de fortalecimento da agroecologia no estado, como reflorestamento, implantação de Sistemas Agroflorestais e formações em arte e comunicação. A saúde, nesse contexto, não é vista como um setor isolado, mas como parte de uma transformação mais ampla das relações entre seres humanos, meio ambiente e modos de vida.
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