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Saúde

Raposa no galinheiro: ANS corre para autorizar Rede D'or a comprar SulAmerica e manter concentração ilegal de serviços de saúde

Quem perde é o usuário de planos de súde, que terá menos concorrência; jogo é tão escancarado que votos dos diretores vazaram antes do julgamento

(Foto: Divulgação | REUTERS/Kacper Pempel)
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247, por Joaquim de Carvalho - No apagar das luzes do governo Bolsonaro, a Agência Nacional de Saúde (ANS) pautou para esta segunda-feira (12/12), em sessão extraordinária e “restrita” (secreta), a votação da maior transação da história do mercado de saúde suplementar (privada), que é a aquisição da SulAmérica, uma das maiores operadoras de planos de saúde do Brasil, pela Rede D’or, que é a maior empresa hospitalar brasileira, que, por sua vez, já é dona de 29% da Qualicorp, também a maior administradora de benefícios do mercado. Essa verticalização total é expressamente vetada pela ANS, e acabou de ser questionada pelo senador Randolfe Rodrigues em ofício expedido à ANS, sem resposta até o momento. A alegação à não resposta é que o processo é secreto.

O assunto também é visto como surpreendente e suspeito por Arthur Chioro e Humberto Costa, ex-ministros da saúde e membros da área de saúde do governo de transição. Eles estão indignados com a atípica celeridade dada a um processo tão complexo e grande, no fim de um governo derrotado nas urnas. 

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O problema central é que há uma resolução normativa da ANS de 2009, retificada na íntegra em 2022, que proíbe expressamente uma administradora de benefícios, no caso a Qualicorp, fazer parte do mesmo grupo econômico de uma operadora de saúde, no caso a SulAmérica, por razões de conflito de interesses e não por concentração percentual mercadológica. 

Os votos

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A rapidez foi mantida mesmo diante de dois pareceres técnicos negativos à transação por parte da diretoria de normas e habilitação das operadoras (Diope), comandada por Jorge Antonio Aquino Lopes. Trata-se da diretoria técnica competente para esse tema. No parecer, os técnicos dizem:

(…) com o perdão da informalidade, que se adota em benefício da clareza: mesmo que a raposa se declare vegetariana, não se pode admitir que uma raposa tome conta do galinheiro.

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Presidente da ANS, Paulo Rebello, ex-chefe de gabinete de Ricardo Barros no Ministério da Saúde e diretamente ligado ao PP (Partido Progressistas), envolvido em polêmicas como a da Prevent Senior na CPI da Covid e de haver ilegalmente acumulado superpoderes na ANS por conta de diretores interinos com mandato vencido, antecipou-se às discussões e proferiu seu voto favorável à transação sem restrição alguma, imediatamente seguido, na mesma reunião de 30 de setembro, por Maurício Nunes da Silva, da diretoria de desenvolvimento setorial (Dides), pupilo político de Rebello. 

A diretora Eliane Medeiros, afilhada política do senador Alexandre Silveira (PSD-MG), da Diretoria de Normas e da Diretoria de Habilitação de Produtos (Difis), defensora pública aposentada do Estado de MG, ainda não se manifestou.

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Nos bastidores, é dado como certo que acompanhará o presidente Rebello na sua empreitada, ressalvando, entretanto, que não haja controle acionário da Rede D’or sobre a Qualicorp. Não há previsão legal para esse entendimento.

No ano de 2000, Eliane esteve envolvida em escândalos na CPI do narcotráfico da Assembleia Legislativa mineira e chegou a ser afastada da Penitenciária de Ipaba, onde era diretora de reeducação. Ela foi citada em uma denúncia feita à CPI de que faria parte de um esquema de facilitação de fuga.

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O relatório da CPI a cita expressamente:

A Comissão apurou ainda que Eliane (então Diretora de Reeducação da Penitenciária Dênio Moreira de Carvalho) , comportando-se de forma totalmente ilegal, levou prisioneiros para prestarem serviços de pedreiro em sua residência. Há suspeitas da participação de autoridades num episódio em que um preso se fez passar por outro e falsificou a assinatura deste último numa intimação encaminhada pela Polícia Federal. (...) A CPI constatou que Eliane Medeiros e Tarcísio Ângelo, Diretor de Segurança do mesmo estabelecimento, estavam viabilizando a concessão de vários benefícios aos presos, mormente aos traficantes, sem o atendimento dos pressupostos e exigências da Lei de Execução Penal.”

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Nos bastidores, é dado como certo que Eliane acompanhará o presidente da ANS na sua empreitada em favor da Rede D'or, ressalvando, entretanto, que não haja controle acionário desta sobre a Qualicorp. Não há essa previsão legal na ANS. 

Alexandre Fioranelli, da diretoria normas e habilitação de produtos (Dipro), cirurgião vascular ligado à Santa Casa de São Paulo, embora já tenha prestado serviços à própria Rede D’or, deverá acompanhar a Diope e vetar a negociação, com questionamentos aos ritos processuais supostamente ilegais adotados por Rebello. Diope e Dipro são as áreas técnicas do órgão e são contra a transação na forma que está, segundo eles ilegal. 

O mais curioso é que Rebello determinou a exclusão do voto de Jorge Aquino à reunião (secreta) que ocorrerá nesta segunda-feira, sob alegação de ser ele o demandante originário. Considerando serem não mais cinco mas quatro os votantes, caso haja empate, o voto de minerva será do próprio presidente. Jogo jogado, com cartas marcadas.

No mercado, já há quem chame essa votação de “RNRD – Resolução Normativa Rede D’or”, mesmo não tendo sido uma RN, tão pouco cumpridos todos os preceitos regimentais internos inerentes à emissão de uma nova resolução. Sabe-se que, dentro da ANS, há graves celeumas sobre o tema, apontando irregularidades, ao que parece desconsideradas a toque de caixa pelo presidente. 

A Rede D’or já dá como certa a aprovação de seu pedido na ANS. Com isso. se tornará a maior empresa de saúde da América do Sul, maior até, em faturamento, que o SUS, tendo controle vertical sobre toda a cadeia econômica da saúde suplementar.

O caso é tão escandaloso que mereceria uma CPI ou uma investigação profunda, não com os vícios da Lava Jato, mas isenta. Na linha do parecer técnico do Diope, um órgão regulador e de proteção dos usuários de planos de saúde, a ANS não pode ajudar a raposa a entrar no galinheiro, ainda que ela jure ter se tornado vegana.

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Procurei a ANS e solicitei entrevista ao presidente Rebello. Segue a resposta da Agência:

A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) esclarece que o pedido de fusão da Rede D’Or e da operadora SulAmérica segue em processo sigiloso, em razão de imposição legal. Por essa razão, não podem ser concedidas entrevistas sobre o tema nem prestados esclarecimentos sobre a matéria divulgada pelo Brasil 247 na data de hoje (29/11/2022).

Da mesma forma, as reuniões reservadas de diretoria colegiada e suas deliberações também seguem sob sigilo, então é relevante destacar que a divulgação de temas sob sigilo podem implicar em responsabilização de quem der publicidade e vier a reproduzir o conteúdo da deliberação.

Ainda assim, a fim de manter a conexão com a realidade, é importante ressaltar que os posicionamentos das diretorias, bem como as decisões da diretoria colegiada da ANS são feitas com base em pareceres de suas áreas técnicas, sendo normal haver posições distintas e divergentes. Dessa forma, não cabe afirmar que o diretor-presidente da ANS "passa por cima de pareceres técnicos”.

A ANS preza sempre pelo diálogo aberto e irrestrito sobre os assuntos de sua competência com todos os canais de comunicação, mas é preciso reforçar o caráter sensível da matéria tratada.

Segue o ofício do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que também não foi respondido:

 

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