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Marconi Moura de Lima Burum

Mestrando em Direitos Humanos e Cidadania pela UnB, pós-graduado em Direito Público e graduado em Letras. Foi Secretário de Educação e Cultura em Cidade Ocidental. Trabalha na UEG. No Brasil 247, imprime questões para o debate de uma nova estética civilizatória

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Antônio Bigonha e Augusto Aras: o abismo do (ver o) Direito

"Para Aras, o Direito opera na conveniência e oportunidade. Isto é, sua função é exclusivamente discricionária. Para Bigonha, o Direito é emancipatório"

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É abissal a visão de mundo, ao menos do mundo do Direito, entre o atual Procurador-Geral da República, Augusto Aras, e o cotado para substituí-lo em um dos mais relevantes cargos do poder no Brasil, o Subprocurador-Geral, Antônio Carlos Bigonha.

Para Aras, o Direito opera na conveniência e oportunidade. Isto é, sua função é exclusivamente discricionária. Para Bigonha, o Direito é emancipatório e sensitivo. Ou seja: quem opera esta tecnologia humana, científica, técnica e mobilizadora das dimensões civilizatórias, deve fazê-lo com vistas à liberdade dos sujeitos, em todos os sentidos, a saber, no tornar a vida a semântica da arte, a semiologia do bem-viver, a simbiose dos fundamentos na catarse da vida real que é pelo corpo, pela alma e pela cognição humana; logo, a defesa de todos os Direitos Humanos.

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Não por acaso, Bigonha, que já coordenou por vários anos uma das mais importantes instâncias do Ministério Público Federal, a 6ª Câmara de Coordenação e Revisão, exatamente a que opera o Direito para as populações historicamente mais ofendidas pelo Estado e pela superestrutura brasileira, a de “Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais” no MPF, é também músico[1] por vocação, por segunda profissão e por encantamento (paixão). Assim, um sujeito que respira o Direito, no uso de suas estruturas para proteger os povos vulnerabilizados, e respira a Primeira Arte, que tem um poder de comunicação transcendente, todavia, também pragmática. A música conecta efetivamente pontos entre o Céu, a Terra, o Universo, mas não deixa de harmonizar a existência do Humano e da Sociedade perante estes entes. Propõe viver a harmonia que é, para os povos originários, a conexão entre as múltiplas relações que nós, humanos, podemos estabelecer com o todo da existência.

O Direito precisa entender essa ordem cosmológica. O Direito não é um castelo onde residem apenas os doutos da técnica, ou da Teoria Pura (de Hans Kelsen), entretanto, da “legítima organização social da liberdade”, da Teoria Crítica (de Roberto Lyra Filho). Aliás, Antônio Bigonha é um dos discípulos de Lyra Filho, sem deixar de respeitar o necessário saber positivista de Kelsen – face que a profissão também exige isso.

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Bigonha foi aluno de José Geraldo de Sousa Junior, o jurista que ficou conhecido em cada tela de celular e outras “instâncias” da geração “Touch Screen” a partir da lição[2] que deu na Deputada Federal, Caroline De Toni (PL-SC), na CPI do MST, e em seus colegas deputados que teimam em perseguir os movimentos sociais.

Com Sousa Júnior, Bigonha não aprendeu apenas a enxergar as “caravelas”, isto é, a compreender os sentidos cognitivos que aproximam os saberes e viveres de todos os seres, sem exclusão por ignorância e desconhecimento de outras formas de coexistir. Entretanto, aprendeu o conceito de “Sujeitos Coletivos de Direito” que, numa ampliação ressonante, além de servir para um reconhecimento de legitimidade de luta emancipatória dos povos tradicionais e outras comunidades, se espraia para a compreensão das vivências e reivindicações de direitos (e oportunidades) aos povos das favelas, das populações esquecidas no interior do Brasil, e de outros povos, ou vulnerabilizados, ou oprimidos ao longo de séculos neste País. Este é o saber que guarda o – torçamos que o Presidente Lula possa nomeá-lo – próximo Procurador-Geral da República: Antônio Carlos Bigonha.

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Retornando ao Augusto Aras, afinal, precisamos fazer o comparativo para entender que estamos diante de um sujeito que serve a “dois senhores” (e, não, não é da passagem Bíblica que estou a me referir). Aras ressuscitou na PGR seres coloniais de um Direito colonial, trabalhando para as elites e para a superestrutura (o Mercado; ontem o Mercantilismo). Não somente: serviu o quanto pode às cognições negacionistas e fascistas que ocuparam o poder por estes últimos quatro anos no País.

Entre as tantas omissões, ou ações (em contrário à população que deveria servir, na promessa constitucional de guarda ao Direito Coletivo e ao Direito Difuso), talvez a pior delas tenha sido “rasgar” o Relatório da CPI da Covid-19 que, no Senado Federal, desdobrou-se em fazer seguramente a mais bem realizada investigação parlamentar da história do Brasil.

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Aras, naquela dimensão discricionária que é autorizada pela Constituição Federal, preferiu fingir que não existiram centenas de milhares de pessoas assassinadas pelo Coronavírus, pela ausência de vacina na omissão do Governo Federal, pelas deliberadas campanhas, falas e manifestações de massa para contrariar as medidas sanitárias recomendas pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Aras foi cúmplice, enquanto PGR, dos mercadores da morte que ocupavam, com ele, o Poder da República.

O Direito, para Aras, é o que Lyra Filho chama de “Antidireito”. Isto é, a máquina do Estado pode fabricar estatutos normativos para salvar vidas, para matar (necrodireito), ou para se vendar – com o uso da falácia de “técnica jurídica” – diante da dor dos sujeitos em miséria (os famintos; os desempregados etc.), dos povos Yanomami e até mesmo de políticos “trombadinhas” que usam seus cargos para “bater carteira”, neste caso, levar joias do Palácio do Planalto a fim de vendê-las como “muambas” superchiques em Miami e outros cantos do mundo; e assim ficarem mais ricos. E Aras, com tanto poder na caneta, preferiu acoitar tantos crimes e açoitar o povo brasileiro de maioria pobre.

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Volvendo ao José Geraldo de Sousa Junior que, ao lado de Antonio Escrivão Filho, escreveram assim: “torna-se possível compreender a tripla função tradicional assumida pelo judicial no Estado Moderno. Assim, (…) cumpre a tripla função de: i) controle legal dos atos dos poderes executivo e legislativo; ii) legitimação das atividades e do próprio funcionamento destes dois poderes; iii) controle social e solução de conflitos interindividuais na espera civil, administrativa e criminal”. E complementam, acerca de um paradoxo entre o sistema de Justiça e o empoderamento da sociedade que recebe uma Constituição Dirigente, ou Cidadã, para chamar de sua; em cujos direitos sociais, econômicos e culturais encontram guarida, no entanto, a “cultura judicial historicamente desinteressada e desacostumada a se pronunciar sobre os problemas sociais” não evolui no mesmo ritmo.[3]

É fundamental saber que essas também são as funções e o dever-ser, dever-fazer do PGR e que, nem de longe, Augusto Aras conseguiu cumprir ao longo de 4 anos; e que temos finalmente a esperança (esperançar) de vermos serem efetivadas por Antônio Bigonha, todavia, com um apelo: não meramente à obrigação funcional (um Direito falacioso, formalista) em si, destarte, com a carga de sensibilidade artística, dialética e emancipatória que existe na formação do sujeito Bigonha de ser.

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A julgar pela destreza com que toca seu piano, ou com que desafia a história colonial e ditatorial do Brasil para fazer a Justiça de Transição[4], ou ainda, como vislumbra o Direito[5] em seu sentido teórico e atitudinal (ao Direito e aos Direitos Humanos), podemos acreditar que Lula finalmente repousará tranquilo sua cabeça no travesseiro sabendo que indicou um intelectual orgânico, mas também um ser generoso a servir e transformar de verdade o Sistema de Justiça do Brasil – ainda tão cheio de abismos diante da vida real...

………………

[1] Escutemos um pouco da arte do jurista e músico, Antônio Carlos Bigonha:

Link: https://www.youtube.com/watch?v=85obgsR0MYo.

[2] Assista ao momento em que José Geraldo explica para os membros da CPI do MST o que significa “visão de mundo” (recortes cognitivos).

Link: https://www.youtube.com/shorts/1L5nrd9QU34.

[3] Referência: ESCRIVÃO FILHO, Antônio; SOUSA JUNIOR, José Geraldo de. Para um debate teórico-conceitual e político sobre os direitos humanos. Belo Horizonte: D’Plácido, 2019 (ler p. 155).

[4] Leia a matéria do MPF sobre o parecer ao STJ, do Subprocurador-Geral da República, Antônio Bigonha, que tem a coragem de enfrentar o espólio da marte do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o mesmo que, segundo a crueldade de Jair Bolsonaro, era “o pavor de Dilma Rousseff”:

Link: https://www.mpf.mp.br/pgr/noticias-pgr2/2023/justica-de-transicao-para-mpf-direito-a-indenizacao-por-danos-decorrentes-de-atos-da-ditadura-e-imprescritivel.

[5] Para conhecer a visão deste humanista emancipatório que pode vir a ser o novo Procurador-Geral da Repúblia, Antônio Bigonha, leia dois artigos dele.

O primeiro fala do Direito Achado na Rua e da UnB, como um berço científico.

Link: https://iree.org.br/darcy-ribeiro-a-unb-e-o-constitucionalismo-achado-na-rua/

E no segundo, Bigonha denuncia a “falácia do Marco Temporal”.

Link: https://iree.org.br/a-falacia-do-marco-temporal/.

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