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Cynara Menezes

Baiana de Ipiaú, formou-se em jornalismo pela UFBA (Universidade Federal da Bahia) e já percorreu as redações de vários veículos de imprensa, como Jornal da Bahia, Jornal de Brasília, Folha de S.Paulo, Estadão, revistas IstoÉ/Senhor, Veja, Vip, Carta Capital e Caros Amigos. Editora do site Socialista Morena. Autora dos livros Zen Socialismo, O Que É Ser Arquiteto e O Que É Ser Geógrafo

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Ao atacar a Polícia do Rio, Veja pavimenta o caminho para a federalização do caso Marielle

"Observa-se, desde a posse de Jair Bolsonaro, uma clara queda-de-braço entre o governo federal, aliado ao Ministério Público do Rio, e a Polícia Civil carioca sobre os rumos da investigação do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes", assinalou a jornalista Cynara sobre a nebulosa ligação de Bolsonaro com a morte de Marielle. "A quem interessa tirar as investigações sobre o caso Marielle das mãos da Polícia do Rio?" questiona Cynara

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Por Cynara Menezes, do Socialista Morena e do Jornalistas pela Democracia

Observa-se, desde a posse de Jair Bolsonaro, uma clara queda-de-braço entre o governo federal, aliado ao Ministério Público do Rio, e a Polícia Civil carioca sobre os rumos da investigação do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. Esta disputa deu os primeiros sinais em março, quando o delegado titular da Delegacia de Homicídios, Giniton Lages, foi afastado imediatamente após ter confirmado que a filha de Ronnie Lessa, um dos suspeitos de matar a vereadora, namorou o filho mais novo do presidente, Renan.

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Na entrevista coletiva que deu, no dia 12 de março deste ano, sobre os andamentos da investigação, Lages fala a um jornalista sobre o namoro entre Renan e a filha de Lessa, de quem Bolsonaro afirmou não se lembrar. “Está confirmado que o filho mais novo de Bolsonaro namorou ou namora a filha de Ronie Lessa?”, pergunta o repórter. “Está confirmado, mas isso não é objeto de investigação neste momento. Mas poderá ser enfrentado num momento oportuno”, diz o delegado. No dia seguinte, Lages é afastado do cargo, sob a alegação dada pelo governador Wilson Witzel de que “estava cansado”.

A queda-de-braço da Polícia Civil do Rio com o governo e o MP fica ainda mais evidente diante do últimos acontecimentos envolvendo o caso Marielle. A Globo recebeu a informação de que, no caderno de registro de entrada do condomínio onde vive Bolsonaro, seu filho Carlos e Lessa, preso preventivamente pelo crime, estava escrito que Élcio Queiroz, apontado como motorista do carro que emboscou a vereadora, chegara ao condomínio dizendo que iria para a casa 58 –a casa de Bolsonaro. Iniciou-se, então, uma operação para tirar a Polícia Civil do caso, com a ajuda preciosa da revista Veja.

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Com o intuito de manipular seus leitores, a “reportagem” desta semana, a semanal da editora Abril assume na capa como verdadeira a informação de uma promotora do MP-RJ de que o porteiro “mentiu”. A revista sustenta que a investigação tem sido “um desastre”, o que explica o “depoimento mentiroso”, “fajuto”, que “tentava ligar Bolsonaro aos assassinos” –e isso tudo depois de os jornais, durante a semana, mostrarem que a “perícia” foi feita pelo MP a toque de caixa e ignorou o livro de registros com a anotação “casa 58”.

A “carta ao leitor” da revista faria corar até o Alexandre Garcia em termos de puxa-saquismo explícito a Bolsonaro –e vai contra qualquer técnica de jornalismo investigativo existente. A revista assume, de forma açodada, seguindo o exemplo do novo engavetador-geral da República, que o nome do presidente foi incluído “equivocadamente” e que inserir Bolsonaro no caso é “leviano”. Diz ainda que a investigação é “incompetente” e “manipulada por alas distintas da polícia do Rio”, sem mostrar evidência alguma disso.

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Tanto a carta quanto a “reportagem” da revista não citam em nenhum momento a “central de mutretas”  que teria sido montada por um delegado da Polícia Federal, Hélio Khristian, para atrapalhar a investigação, segundo denúncia feita pela Procuradoria-Geral da República no apagar das luzes do mandato de Raquel Dodge, em setembro. E ignora olimpicamente o livro de registro com a anotação, se atendo aos depoimentos do porteiro. O depoimento foi desmentido pelas promotoras do MP –uma delas já afastada do caso por ter apoiado Bolsonaro na eleição–, mas o livro de registro, não.

Para não prejudicar seu discurso contra a Polícia Civil, Veja tampouco faz referência às reclamações dos peritos criminais de que não foram acionados para periciar a mídia apreendida no condomínio onde mora o presidente. O exame foi feito por técnicos do Ministério Púbico através de um CD apresentado pelo síndico do condomínio, ou seja, sem que tenha havido a apreensão dos equipamentos do sistema da portaria. “Lamentamos que um evento de grande importância criminal para o país, que envolveu até o presidente da República, venha a ser apresentado sem o devido processo de comprovação científica”, criticou o Sindicato dos Peritos Criminais, em nota.

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O próprio presidente tem mostrado sua insatisfação com a investigação feita pela Polícia do Rio por meio dos ataques que faz ao governador do Estado, Wilson Witzel. Na já famosa live onde se mostra totalmente descontrolado após a reportagem do Jornal Nacional, Bolsonaro acusa Witzel de ter vazado a informação para a Globo por ser seu adversário na disputa presidencial em 2022, e disse que queria “conversar com o delegado” responsável pelas apurações.

As associações de delegados da Polícia Civil divulgaram nota acusando o presidente de tentar intimidar a apuração da verdade sobre o crime. “Valendo-se do cargo de presidente da República e de instituições da União, claramente ataca e tenta intimidar o delegado de polícia do Rio de Janeiro, com o intuito de inibir a imparcial apuração da verdade”, diz o texto.

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No sábado, 2 de novembro, Bolsonaro acusou diretamente o governador do Rio de “manipular as informações” para implicá-lo no crime. “Minha convicção é de que ele agiu no processo para botar meu nome lá dentro”, afirmou. O presidente acusou o delegado da Polícia Civil responsável pelo caso Marielle, Daniel Rosa, de ser “amiguinho” do governador. Em setembro, a pedido do presidente, seu partido, o PSL, deixou a base de apoio a Witzel.

O governo agora atua para federalizar a investigação, tirando-a das mãos da Polícia Civil do Rio. Em evento em Curitiba na sexta-feira, 1° de novembro, o ministro Sergio Moro defendeu a federalização. “Considerando a demora de identificação dos mandantes e essas reiteradas tentativas de obstrução da Justiça, talvez seja o caso realmente de federalização”, disse. Os familiares de Marielle, porém, não querem que o caso vá parar nas mãos da Polícia Federal, e consequentemente de Moro, de jeito nenhum.

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“Acreditamos que Sergio Moro contribuirá muito mais se ele permanecer afastado das apurações”, disseram, em nota, Marinete Silva e Antonio Francisco da Silva, pais da vereadora, além de Anielle Franco (irmã), Monica Benício (viúva) e Marcelo Freixo (deputado federal pelo PSOL e amigo de Marielle). “Moro sempre demonstrou pouco interesse pelas investigações do crime. Somente após a menção ao presidente da República, Jair Bolsonaro, no inquérito, o ministro começou a se declarar publicamente a favor da federalização.”

Com sua “reportagem” chapa-branca, Veja apenas ajuda a pavimentar o caminho para que a investigação saia do Rio e vá para Brasília, sob os cuidados de Moro. É curioso lembrar que a postura da revista em relação a Bolsonaro tem mudado desde que a massa falida da editora Abril foi adquirida pelo advogado Fabio Carvalho, em dezembro de 2018, em parceria com o banco BTG Pactual, que tem entre seus fundadores ninguém menos que o ministro da Fazenda, Paulo Guedes.

Durante as eleições, o partido de Bolsonaro chegou a ir à Justiça para mandar tirar a revista de circulação, após Veja publicar uma matéria com informações sobre o processo envolvendo a separação dele e de sua segunda esposa, Ana Cristina Siqueira Valle, em 2008. Já na semana passada, o presidente aplaudiu a revista pela matéria com um suposto depoimento do publicitário Marcos Valério acusando Lula de ser o mandante do assassinato de Celso Daniel, em 2002, integralmente desmentida pelo delegado e pelos promotores que cuidam do caso, de acordo com reportagem do El Pais.

O que mudou na relação da Veja com o presidente para que, de contra-exemplo, a revista virasse exemplo? Teria a ver com a visita de cortesia feita pelo novo dono da Abril ao ministro Paulo Guedes, em agosto? E, mais importante: a quem interessa tirar as investigações sobre o caso Marielle das mãos da Polícia do Rio.

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