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Pedro Benedito Maciel Neto

Pedro Benedito Maciel Neto é advogado, autor de “Reflexões sobre o estudo do Direito”, Ed. Komedi, 2007.

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As guerras e as guerras eternas

O mundo testemunha muitas guerras, há muitas pessoas morrendo hoje

Palestinos, que foram deslocados para o sul por ordem de Israel durante a guerra, retornam para suas casas no norte de Gaza, em meio a um cessar-fogo entre Israel e o Hamas, no centro da Faixa de Gaza, 27 de janeiro de 2025 (Foto: REUTERS/Ramadan Abed)

Em 2025, ou seja, vencido um quarto do primeiro século do terceiro milênio, a humanidade, que já foi à Lua, ainda não consegue resolver conflitos de forma pacífica, através do diálogo, dos acordos e das concessões.

O mundo testemunha muitas guerras, há muitas pessoas morrendo hoje. 

As guerras tradicionais incluem o conflito na Ucrânia, a guerra entre Israel e o Hamas na Faixa de Gaza (com o Hezbollah também envolvido), a guerra civil no Sudão entre as Forças Armadas e as Forças de Apoio Rápido, e conflitos prolongados em Mianmar, Burkina Faso, Somália e Nigéria. 

Outros conflitos ativos incluem a tensão fronteiriça entre Paquistão e Afeganistão, o conflito na Etiópia e a situação instável no Sudão do Sul. Há também relatos de um conflito armado entre Irã e Israel entre junho e julho de 2025. 

Ou seja, há guerras no Oriente Médio e Norte da África.

No continente Africano há guerras em Burkina Faso, onde o governo e grupos extremistas do ISIS-Sahel continuam lutando pelo controle do território; na Somália, onde governo nacional enfrenta a insurgência do grupo islâmico Al Shabab; na Nigéria, cuja guerra contra o grupo extremista Boko Haram continua ativa; na Etiópia o governo enfrenta um conflito em andamento com o grupo extremista Fano; no Sudão do Sul a guerra civil persiste desde 2013, apesar de acordos de paz.

Na Ásia a guerra em Mianmar, o governo e a oposição militar lutam contra a crescente resistência, com rebeldes assumindo o controle de muitas áreas; há ainda os conflitos que envolvem o Paquistão e o Afeganistão, um conflito fronteiriço entre os dois países que continua tristemente ativo; além na realidade interna no Afeganistão o Talibã retomou o controle do país em 2021, mas a instabilidade e os conflitos persistem. 

Esses conflitos são cruéis, o número de pessoas que morreram por causa da guerra civil no Sudão ultrapassa 150 mil pessoas, sendo que mais de 61.000 pessoas morreram no estado de Cartum, onde os conflitos começaram, de acordo com um relatório do Grupo de Pesquisa do Sudão da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres.

Como dizem “a humanidade é desumana”.

Mas há outros tipos de guerras, guerras com objetivos geopolíticos, que usam métodos sorrateiros, tratam-se das “guerras híbridas” e das “guerras eternas”.

"Guerra híbrida" refere-se a uma estratégia que combina métodos de guerra convencionais (militares) com não convencionais (ciberataques, desinformação, propaganda, influência política e econômica) para desestabilizar um adversário. 

"Guerra eterna", que não é um conceito militar padrão, pode ser interpretado como um conflito sem fim aparente, caracterizado por constantes e diversas formas de confronto.

Historicamente os EUA usam a chamada guerra híbrida para derrubar governos e instalar governos subordinados aos seus interesses, usam estratégias que combinam táticas militares e não militares simultaneamente para alcançar objetivos geopolíticos. 

As “guerras híbridas” incluem a mistura de guerra convencional, guerra irregular, ciberataques, propaganda, desinformação, lawfare, interferência eleitoral e pressão econômica.

O que Trump fez recentemente com o Brasil, ao taxar produtos brasileiros e aplicar sanções a ministros do STF e a autoridades da república é, conceitualmente, uma guerra híbrida.

O objetivo é sempre desestabilizar aquele escolhido como adversário, explorando as fraquezas em múltiplos domínios (político, econômico, social e militar), no caso de Trump ele tentou constranger política e economicamente o governo brasileiro.

E os EUA fazem pior com Cuba e Venezuela.

O conceito “guerra híbrida” ganhou popularidade a partir dos anos 2000, com autores como Frank Hoffman, definindo-a como um confronto que combina diferentes formas de guerra. 

Já as “guerras eternas”, que autores insistem não ser um termo técnico, mas uma forma descritiva de conflito contínuo, que pode ser vista como uma evolução da guerra híbrida, onde a luta não se limita ao campo de batalha tradicional e as razões são “abertas” ou indeterminadas, como a “guerra ao terror”, a “guerra contra as drogas”, etc.

Ou seja, um país poderoso como os EUA, desejosos do controle do petróleo da Venezuela, decidem caracterizar o governo ditatorial de Maduro como um “narcoestado”, mesmo sabendo que a Venezuela não o é.

Os mesmos EUA decidiram que Cuba é um Estado terrorista e impõe um embargo que já dura sessenta e dois anos.

Noutras palavras, as “guerras eternas”, evolução das “guerras híbridas” são caracterizadas pela incerteza, assimetria e uso contínuo de diversas táticas não convencionais. É um estado de guerra permanente, que opera nas fronteiras da paz e da guerra. 

Se os EUA decidirem que o Comando Vermelho e o Primeiro Comando da Capital são organizações terroristas, eles se darão ao direito de realizar operações em solo nacional, sem respeito à soberania e sem consultar o nosso governo. 

Curiosamente os congressistas de extrema-direita e alguns governadores parecem querer que isso aconteça, vide as declarações do Senador Flávio Bolsonaro, do seu irmão o deputado Eduardo Bolsonaro, do governador do Rio de Janeiro e de outros vis que sobrevivem há décadas de dinheiro público e não tem qualquer apreço pelo projeto de nação esculpido na nossa Constituição.

Ou seja, na América Latina não se vê, não tem, nem fomenta conflitos entre os seus Estados nacionais, contudo, interesses geopolíticos podem trazer ao nosso continente problemas grandes, especialmente porque as guerras híbridas e as guerras eternas semeiam instabilidade e a mantém por longo prazo, dificultando a recuperação do adversário. 

Por essas e outras acredito no poder de negociação de Lula, não apenas para resolver as questões comerciais, mas, principalmente, para proteger o país do risco das guerras híbridas e das guerras eternas.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.