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Pedro Benedito Maciel Neto

Pedro Benedito Maciel Neto é advogado, autor de “Reflexões sobre o estudo do Direito”, Ed. Komedi, 2007.

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Da felicidade artificial à cultura do lixo

“Lixo é o principal e mais abundante produto da sociedade de consumo. Entre as indústrias desta, a de produção de lixo é mais sólida e imune a crises” (Bauman)

Clube da Luta - David Fincher (1999) (Foto: Reprodução)
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Aqui em casa a regra é debater todos os assuntos e jamais nos rendemos durante um debate (ou embate?); opiniões divergentes são bem-vindas, por isso o “papo” é sempre “quente”; meus filhos, são bem formados no aspecto acadêmico, são cultos e sustentam substantivamente suas opiniões.

O nosso entusiasmo pelo debate pode ter assustado, ao longo dos anos, algumas das pretendentes deles, mas hoje Gabriela, Ana Julia e Claudia, “as meninas”, nossas noras, não se assustam mais conosco.

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Sobre a ‘temperatura’ das nossas discussões eu lembro que uma vez a Ana Julia, então namorada do Mateus, advertiu uma ‘candidata a namorada’ que almoçava conosco pela primeira vez; ela disse: “Não se assuste, eles brigam, brigam e brigam, mas depois que a Celinha serve a sobremesa e eles sobem ver um jogo ou um filme e tudo fica bem”.Há três assuntos nos almoços de domingo: Futebol, nosso indelével amor pela Ponte Preta; Política e opiniões sobre  filmes.

O único consenso é a PONTE, a nossa grande paixão; na quadra da Política há diferenças - às vezes inconciliáveis -, estamos todos à esquerda, mas alguns de nós estão mais à esquerda que outros.

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Vou compartilhar com o leitor nossas conclusões sobre O CLUBE DA LUTA, pois, acreditamos que o filme não é apenas entretenimento ou expressão cultural, ele suscita reflexões e indagações. 

O filme se desenvolve num cenário da “sociedade pós-moderna”, onde vivem pessoas descrentes em metanarrativas teleológicas, o mal-estar é imanente; as pessoas procuram amenizar a dor fazendo compras, desenvolvendo músculos, para tornarem-se esteticamente aceitos pelo seu grupo social.

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O filme faz uma crítica ácida à sociedade de consumo. E para compreender a crítica ao consumo no contexto do filme, devemos levar em consideração a insatisfação e o mal-estar do personagem de Edward Norton.

O consumo como aliviador de suas tensões - instrumento de combate contra seu vazio existencial – não dá mais conta da dor do personagem, que se sente asfixiado e prisioneiro de um emprego que também não dá sentido à sua vida. Nem os variados grupos de autoajuda que ele frequentava aliviam o mal-estar.

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E o personagem, sempre alucinado, em razão da insônia, acaba encontrando sentido para o devir por meio de um plano ambicioso de destruição da sociedade de consumo, que para ele é a culpada pelo seu mal-estar. Ele - e sua alucinação, Tyler Durden (Brad Pitt) -, criam uma organização de caráter fascista, desprovida de ideais humanistas, responsável por lhe propiciar um sentimento de pertencimento a uma comunidade.

O projeto de destruição possibilita à comunidade do Clube da Luta a constituição de uma visão comum de mundo e uma leitura compartilhada do passado e do futuro. 

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Cada vez que assistimos o filme uma nova perspectiva surge, mas sempre nos remete ao pensamento de Bauman, pensador extremamente perspicaz na análise de problemas sociais da nossa experiência cotidiana.

Em seu livro “Vida para consumo”, Bauman parte da tese de que deixamos de viver numa sociedade de produtores e passamos a uma organização social baseada puramente no consumo, na qual as pessoas se tornaram elas próprias mercadorias descartáveis que precisam se remodelar continuamente para não ficarem obsoletas. Nas suas palavras: “Numa sociedade marcada pela agitação, pela ansiedade e acima de tudo pela incapacidade de obter uma experiência profunda de felicidade e bem-estar, a disposição consumista desponta como uma forma compensatória do indivíduo vir a obter um razoável nível de prazer em sua vida cotidiana”.

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O fato é que o nosso caráter, nossos valores e personalidade foram colonizados pela lógica de mercado, e todos nós, se não ficarmos atentos, vamos criando imagens de nós mesmos como produto a ser consumido. 

Bauman afirma que “...nessa era da liquidez, as pessoas estabelecem laços passageiros que facilmente podem ser desfeitos, o que torna conveniente a melhoria constante de sua imagem como produto. Segue-se a lógica do “quanto menos profundidade, melhor”.  Na era da liquidez, o consumo serve primeiro para fixarmos nosso lugar na sociedade e nos distinguirmos das outras pessoas; para darmos uma ilusão de ordem às coisas e nos sentirmos cidadãos. Múltiplos estereótipos derivam daí, uma vez que “somos aquilo que consumimos”. Vivemos em constante fantasia de que nossas vidas têm que ser uma obra de arte, por isso, há sempre a comparação com a vida dos outros e a busca incessante para alcançar aquilo que não se tem.

Como fugir disso? Bem, o caminho certamente não é criar uma organização de caráter fascista, nem participar dela em busca de algum pertencimento, o bom caminho é a interação social, presencial e afetiva, além de rompermos com a obsessão pela “fama” das redes sociais.

Precisamos nos libertar da ideia de que a felicidade está em consumir, trocar interesses emocionais através de mercadorias é mortal para a alma e para a vida, pois, não suprem a necessidade humana pelas relações emocionais genuínas, e a consequência disso é uma sociedade com altíssimos índices de depressão e transtornos psicológicos dos mais variados e exóticos possíveis. 

Vivemos hoje a cultura do lixo, uma sociedade de consumidores que sufocam produtores, a lógica consumista afirma que: quem não consome é excluído; quem consome livra-se da exclusão; e o que é consumido transforma-se em lixo. 

Essas são as reflexões.

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