Sara York avatar

Sara York

Sara Wagner York (também conhecida como Sara Wagner Pimenta Gonçalves Júnior) é bacharel em Jornalismo, doutora em Educação, licenciada em Letras – Inglês, Pedagogia e Letras Vernáculas. É especialista em Educação, Gênero e Sexualidade, autora do primeiro trabalho acadêmico sobre cotas para pessoas trans no Brasil, desenvolvido em seu mestrado. Pai e avó, é reconhecida como a primeira mulher trans a ancorar no jornalismo brasileiro, pela TV 247

164 artigos

HOME > blog

Escola Psicanalítica da Escuta Periphérica: uma nova era para a clínica periférica

A iniciativa propõe uma clínica que rompe com os paradigmas tradicionais e se compromete politicamente com os contextos sociais

Escola Psicanalítica da Escuta Periphérica: uma nova era para a clínica periférica (Foto: Reprodução)

No dia do nascimento de Abdias do Nascimento, um dos maiores intelectuais negros do Brasil, foi lançado pelo Coletivo de Pesquisa Ativista em Psicanálise, Educação e Cultura uma nova escola. O evento contou com a presença de figuras como Jairo Carioca, Ronald Lopes e Hudson A. R. Bonomo, que apresentaram a proposta do coletivo e reafirmaram a necessidade de transformar a psicanálise a partir das realidades periféricas e racializadas.

Durante o lançamento, o psicanalista e filósofo, professor Érico Andrade, da UFPE, ressaltou a importância de repensar os conceitos psicanalíticos a partir dos corpos historicamente marginalizados. "Os corpos submissos são também aqueles que trazem questões para a psicanálise", afirmou, citando autores como Paul B. Preciado, Nelsa Santos Souza entre outras pessoas marginalizadas ao longo, que racializam e subvertem os conceitos tradicionais da psicanálise. Andrade destacou ainda que a proposta do coletivo se insere nessa transformação ao construir uma escola psicanalítica com base na horizontalidade e na decisão coletiva.

A criação da escola emerge de uma necessidade urgente: reinventar a psicanálise fora dos moldes eurocentrados e hierárquicos que historicamente pautaram a formação e a prática analítica. "Posso falar de macumba aqui?", questiona uma analisante na primeira sessão. Essa pergunta, tão simples e potente, ecoa a urgência de uma psicanálise que dialogue com a periferia e suas realidades. O Coletivo, através de sua nova escola não busca reproduzir Freud ou Lacan como dogmas, mas sim ressignificar conceitos para acolher desejos e subjetividades que escapam à lógica colonial e capitalista.

A iniciativa propõe uma clínica que rompe com os paradigmas tradicionais e se compromete politicamente com os contextos sociais. Sem democracia, não há psicanálise, afirmam os coordenadores, defendendo que o ato clínico é também um ato de resistência contra o fascismo, o racismo e o capitalismo. Nesse espaço, o cuidado é voltado a corpos marginalizados: travestis, mães solo negras, profissionais do sexo e outros sujeitos que, historicamente, estiveram à margem da prática psicanalítica.

Jairo Carioca e Ronald Lopes, coordenadores do coletivo, reforçam a ideia de circularidade como elemento essencial da proposta. "Entrar na roda, circular, é quebrar as hierarquias", afirmam. O coletivo se propõe a funcionar com base em decisões colegiadas, reconhecendo as diferenças sem transformá-las em estruturas de poder excludentes. A psicanálise periférica se coloca, assim, como um dispositivo de emancipação e resistência, co-construído por analisantes e analistas.

A criação dessa Escola Psicanalítica da Escuta Periphérica, a primeira do Brasil com mais de 50% de pessoas negras e indígenas, pelo coletivo marca um momento histórico na psicanálise brasileira, rompendo com uma tradição que, por muito tempo, ignorou os sujeitos periféricos e racializados. Como destacou Erico Andrade, a psicanálise precisa se comprometer com uma revolução material, política e epistêmica. O Coletivo de Pesquisa Ativista em Psicanálise, Educação e Cultura realiza um passo fundamental nessa direção, e agora se compromete ainda mais ao lançar sua escola. 

O lançamento foi on-line e foi finalizado com a fala das professoras Maria Tereza Ferreira e Vitailma Conceição que reforçaram a urgência do trabalho ecoado pelos e dos espaços periféricos.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

Artigos Relacionados