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Chico Junior

Jornalista, escritor e comunicador

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Estrogonofe, da Rússia para o mundo

No conceituado Larousse Gastronomique o verbete nem é strogonoff e sim stroganov, “prato tradicional da cozinha russa clássica e conhecido na Europa a partir do século XVIII e com diversas interpretações”. O prato foi se transformando tanto que não podemos nos esquecer do estrogonofe de frango, de camarão e, pasmem, de língua e coração de galinha

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No início da década de 1970, com 22, 23 anos, eu estava descobrindo novos caminhos culinários. Eu e uns amigos e amigas formávamos um grupo em que alguns de nós éramos chegados a uma cozinha. Assim, nos reuníamos aos domingos na casa de um ou de outro para almoços. O sucesso, durante algum tempo, foi o estrogonofe, ou pelo menos o que nós chamávamos de. Na realidade, mais um picadinho metido a besta, uma receita em que entravam creme de leite (em lata) e catchup, a mistura responsável pelo tom rosado do prato. Então, era assim: filé, manteiga, cebola picadinha, conhaque (ou qualquer bebida alcoólica que estivesse à mão), creme de leite e catchup. E fazia sempre o maior sucesso. 

Tanto que, quando fui morar na Itália, no final de 1971, levei na bagagem a tal receita de estrogonofe (ou o que eu chamava de) e a apresentei a uns amigos milaneses e brasileiros. Em Milão, pelo menos entre as pessoas com as quais eu convivia, não se conhecia muito o estrogonofe. Ou não se consumia, sei lá. Só sei que também fazia o maior sucesso e, vez ou outra, eu era convocado a fazer o tal do estrogonofe na casa de alguém, principalmente de italianos.

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Bem, depois fui descobrindo que o estrogonofe poderia ser feito de maneira bem mais gostosa e que o ideal mesmo (ou o certo, eu diria) seria usar creme de leite fresco. Mas ao mesmo tempo fui descobrindo variações em torno do tema e que o estrogonofe, que nasceu na Rússia, popularizou-se tanto que foram sendo criadas receitas as mais diversas, usando molho de tomate ou não, catchup ou não, páprica ou não, creme de leite em lata ou não. Há cozinheiros radicais que dizem enfáticos e raivosos: “creme de leite em lata, jamais”. É certo que vamos ter muito mais sabor se usarmos o creme de leite fresco ou, de acordo com algumas receitas, o creme de leite azedo. 

Mas quem quiser usar o enlatado, que use. O importante é gostar, saborear um prato feito por nós, independentemente de firulas gastronômicas e radicalismos.

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Mas qual é mesmo a origem do estrogonofe e qual a sua receita verdadeira (ou original)? Aí já começa a confusão. No livro francês L’Encyclopedie de la Cuisine (A Enciclopédia da Cozinha), ao apresentar a receita de Boeuf Strogonoff, seus autores dizem que o “Strogonoff ou Stroganov é um clássico da cozinha russa, adaptado pela cozinha francesa”, e que a origem do nome tem duas explicações: (1) o prato leva o nome de uma rica família de comerciantes russos, os Stroganov, que tinham um cozinheiro francês, responsável pela criação do prato; (2) o nome vem simplesmente do verbo russo “strogat”, que significa cortar em pedaços (no caso, a carne).

Já no conceituado Larousse Gastronomique o verbete nem é strogonoff e sim stroganov, “prato tradicional da cozinha russa clássica e conhecido na Europa a partir do século XVIII e com diversas interpretações”. 

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A extinta revista brasileira Gula, em reportagem sobre o “verdadeiro strogonoff” diz que o nome homenageia uma antiga família da cidade de Novgorod, perto de São Petersburgo, e que uma descendente desta família, Sophie Stroganoff (com a) morou em São Paulo.  Segundo a revista, os Stroganoff, rica família de negociantes, participavam de um clube em que os chefs das cozinhas das famílias apresentavam suas criações culinárias. Numa dessas reuniões foi apresentado o Boeuf Stroganoff, receita simples à base de carne e creme de leite fresco

E a história não para por aí. De acordo com Eda Romio, em seu livro 500 anos de Sabor, “os soldados russos, no século XVI, levavam como ração para os campos de batalha barris com carne cortada em pedaços, coberta com sal grosso e aguardente, para que não apodrecesse. Quando iam comê-la, acrescentavam um pouco de gordura e creme azedo. No final do século XIX, o chef francês Thierry Costet, trabalhando para nobres em Novogorod, acrescentou à mistura ingredientes europeus, como cogumelos, mostarda e páprica. Com a revolução de 1917, que terminou com a era dos czares no país, muitos russos foram para a Europa, onde o stroganoff ganhou os detalhes finais que resultaram no sabor que conhecemos hoje em dia”.

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Dos estrogonofes servidos em restaurantes que eu conheço, talvez o mais famoso seja o do Dona Irene, que fica na cidade fluminense de Teresópolis. O estrogonofe do Dona Irene é um caso à parte. Na verdade, o Dona Irene é um caso à parte. É, simplesmente, o melhor restaurante de culinária russa do Brasil. 

Bem estávamos falando até agora do estrogonofe de filé, mas o prato foi se transformando tanto que não podemos nos esquecer do estrogonofe de frango, de camarão e, pasmem, de língua e coração de galinha. Pois é, um dia fui convidado para um almoço na casa de uma amiga e qual não foi a minha surpresa ao descobrir que o prato principal era um estrogonofe de coração de galinha. Simplesmente delicioso. E o de língua? Havia um restaurante no Rio, chamado Alpino (antes ficava no Leme, depois foi para o Jardim de Alah e depois fechou) que servia um ótimo estrogonofe de língua. Aliás, eu só ia ao Alpino para comer estrogonofe de língua, vê se pode. 

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Segue a receita do estrogonofe do Dona Irene:

Antes de tudo, o filé mignon, cortado em tiras, é marinado no conhaque durante quatro horas, na geladeira. Então, vamos ao fogão. Numa frigideira funda, refoga-se cebola picadinha com pouco óleo. Acrescenta-se um buquê de ervas, para perfumar. Em seguida, acrescenta-se a carne, dá uma refogada e flamba com conhaque. Em seguida, vá mexendo a frigideira. Agora é a vez dos champignons (previamente cozidos no vapor e curtidos no vinho branco). Acrescenta-se o creme de leite azedo. Em seguida, salpicar salsinha ou cebolinhas picadinhas. 

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(D. Maria Emilia, a proprietária e cozinheira, informa que compra a carne fresca, congela por 24 horas, descongela e aí sim, está pronta para usar).

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