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Marconi Moura de Lima Burum

Mestrando em Direitos Humanos e Cidadania pela UnB, pós-graduado em Direito Público e graduado em Letras. Foi Secretário de Educação e Cultura em Cidade Ocidental. Trabalha na UEG. No Brasil 247, imprime questões para o debate de uma nova estética civilizatória

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Eu não sou obrigado a torcer pelo Neymar, nem Pelé!

O que sinto por Neymar, Ronaldo e Pelé é uma profunda admiração pelo brilhantismo e talento que a Natureza lhes concedeu em seus pés. Nenhum sentimento a mais

Pelé (à esq.) e Neymar (Foto: Reuters)
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Uma coisa que a era de petulâncias do bolsonarismo ensinou é a peneirarmos melhor o conceito do “politicamente correto”. Evidentemente, ao contrário. No caso bolsonarista, é “mimimi”, outras vezes é “vitimismo” (ou seja: frescura, drama, conversinha)  quando reclamamos da sua postura desrespeitosa diante das agressões às pessoas com deficiência, ou seus discursos racistas e homofóbicos, ou quaisquer outras posturas antiéticas do cotidiano. Há no bolsonarismo uma antipatia à dor humana e o ignorar completo do sujeito outro que não seja alguém seu e bem próximo a seu pensar e agir. O bolsonarista, quando não mata, deseja o pior a quem pensa ou é diferente dele.

Neste texto quero abordar minha antipatia aos jogadores de futebol (ídolos do povo brasileiro), Neymar, Ronaldo Fenômeno e Pelé. E com isso, quem sabe, tentar uma experiência de imersão, de resignação ou de resiliência para, se errado eu estiver, pensar diferente e agir diferentemente quanto ao outro que me é alheio em tudo. 

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Retomemos a reflexão na tentativa de fazer coesão entre os dois parágrafos iniciais e a conexão lógica do pensamento. 

Os bons modos e a etiqueta são protocolos fundamentais para a rotina dos convívios e do agir social. Por outro lado, o essencial neste trabalho aqui é nos aproximar das dimensões conceituais e vivenciais da alteridade e da empatia. Aliás, mais que os conceitos: o melhor é o nosso viver e agir diferente. 

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Pois bem! A alteridade é, grosso modo, o reconhecer a existência do outro, aceitar o diferente, o que nos distingue das demais pessoas. A empatia, em síntese, é se colocar no lugar do outro e sentir no outro a paisagem, a cognição, a sensação que é sua. De intersecção entre as pontas de uma e outra dimensão, falamos do bom conviver entre todos, com liberdade e respeito mútuo. 

Agora se não sentimos nada em relação a certas dores de alguém; se o sofrimento alheio não nos interessa; se não somos capazes de aceitar a diversidade, isso nos torna inumanos ou até desumanos? É questionável sim, mesmo que possamos dar a melhor das razões e, num alpinismo moral ou civilizatório, buscamos as semânticas mais inóspitas para justificar nosso desprezo, ainda que temporário.

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Aí há necessidade de sairmos dessa armadilha – para não sermos e, nem de longe, parecermo-nos com qualquer bolsonarista repulsivo. Se não podemos nos “vingar” dos maus humanos, ou de comportamentos insensíveis e reiterados de certos humanos, sendo como eles, resta-nos apenas o argumento da indignação, com plausibilidade analítica, para pontuar num texto um agir e pensar diferentes. E é este, portanto, o propósito de minha (auto)reflexão.

Pelé está em tratamento criterioso de doença. Rezemos por sua saúde e recuperação plenas. Contudo, não, não posso dizer que Pelé seja a pessoa que gostaria de me espelhar na vida. Nem mesmo nutro qualquer desejo de apertar sua mão num encontro casual. 

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Pelé, para além do formidável craque e herói do esporte brasileiro, foi uma espécie de “capitão do mato” moderno. Viu os seus (negros como ele) serem escravizados por um sistema neoliberal capitalista e sempre esteve ao lado do opressor, do dominador. Nunca ladeou a causa dos espoliados e vulnerabilizados deste País. De fato, Pelé merece o título de “rei”. Sim, ele faz parte de uma nobreza, de uma casta e, nesta elite, os reis são os déspotas que, quando não maltratam, ignoram seus súditos e suas necessidades existenciais. [1]

Ronaldo é um ser estranho. Alheio à uma ideia de Brasil. Vive seu mundo paralelo, sua riqueza, potencializando seus ganhos e suas empresas. Para não dizer que é um ser humano “invisível” (claro, além da percepção irrefutável de seu encantador futebol), o Fenômeno surge de tempos em tempos envolvido em alguma polêmica. É um astro, no sentido clássico, pronto a causar. E em vários momentos foi um péssimo exemplo para seus fãs, inclusive jovens e crianças que nele se espelhavam. 

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Por coincidência (e para não faltar de si), Ronaldo estes dias no Qatar levou alguns jogadores brasileiros para jantar. No cardápio, um tal “bife de ouro”; carne banhada literalmente do metal precioso e no valor médio de R$ 9.000,00 o corte. Mas por aqui, no Brasil, Ronaldo também escolhe o lado político das elites. E simplesmente ignora que centenas de brasileiros catam, literalmente, na lata do lixo restos de ossos para sobreviverem. [2]

Ah, sobre o caso do jantar de ostentação dos jogadores concentrados para a Copa do Mundo, Ronaldo foi perguntado sobre o que achava. Sua resposta: “tem coisas que é melhor a gente ignorar”. Lembrei-me das quase 700 mil pessoas que morreram por COVID-19 no Brasil, ou dos fãs deste “herói” lá em Manaus que morriam amingua sem oxigênio e foram ignoradas pelo Fenômeno que sequer uma palavra de solidariedade emitiu, o que dirá oferecer apoio. Ronaldo, isso também é para “a gente ignorar”?

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Neymar é o ídolo 4.0 de uma geração 4.0, mas como ser humano é bastante contraditório. Mesmo em campo, demonstra uma certa frieza e até rudeza quando as coisas não acontecem a seu modo. Tipo garoto mimado. Não aceita um “não” como resposta. Todavia, isso é, de longe o pior nele. Foi acusado de estupro. Inocentado, mas com um ar obscuro diante de seus comportamentos sexuais e sua forma de tratar as mulheres de uma maneira geral [3]. Aliás, em matéria de mulheres, estes três jogadores não são o melhor exemplo de dignidade.

Neymar ostenta como poucos. Aviões, roupas de valores tão altos que não consigo escrever neste parágrafo a quantidade de “zeros” nos milhares de dólares. Porém, isso pouco importa. A sua luxúria e o seu luxo deve interessar somente a ele. Mesmo que isso represente uma banalidade material – para alguns povos e pessoas –, o dinheiro é dele; gaste-o como desejar. Somente devo pedir uma coisa: pague seus impostos. Sim, Neymar é um sonegador inveterado do dinheiro que deveria sair de suas obrigações e servir à sociedade. São milhões e milhões de brasileiros passando fome (ao menos 33 milhões nas últimas pesquisas), a maioria destas pessoas apaixonadas por Neymar. E ele simplesmente as ignora como se lixo fossem. Se quer comprar iates e carros de luxo, faça-o com seu dinheiro e não com o que pertence ao Sistema Único de Saúde (SUS) e a educação (FUNDEB) dos sujeitos pobres deste Brasil. [4]

No entanto, é fundamental deixar claro: não acho que eles devam ser “heróis da Marvel” e salvar o mundo (ou o Brasil) das mazelas. Apenas usarem melhor seus eventos mitológicos e darem exemplo de justiça, equidade, direitos humanos e emancipação às pessoas. Até porque vieram de favelas, ou de uma vida mais simples. Portanto, seria oportuno (não obrigatório) que pudessem olhar para trás e vê a dor dos seus que por lá ficaram (estão). Ou nada fazerem, mas também não estimularem – como o fazem – a reiteração dos sistemas de opressão.

E para provar que não exigimos tanto assim, é somente olharmos para a dignidade de outro fenômeno contemporâneo, o jogador que brilha no Qatar, Richarlison. Entre as boas práticas e atitudes que (aparentemente simples, mas que vindas, autenticamente, de alguém tão famoso) fazem tamanha diferença na vida das pessoas e no conteúdo societário, Richarlison assumiu publicamente um combate rigoroso ao racismo e a ajuda no enfrentamento da COVID-19. Além de sua defesa ao Meio Ambiente e outros trabalhos. [5]

Por derradeiro, é fundamental considerar o evento da redenção. Todos nós, humanos, erramos. Todos temos o direito humano de errar. Evidentemente, que é inoportuno para a boa ética que continuemos a errar e errar, e jamais aprendermos com os equívocos a mudar nosso agir e evoluir como sujeitos. Entretanto, o Neymar, o Ronaldo, o Pelé, eu e você desejamos o perdão da Natureza sobre nossos atos torpes a alcançarmos o êxito sagrado. 

Ademais, como eu disse no começo do texto: não sou obrigado torcer, aliás, nem a gostar deles. O que sinto por Neymar, Ronaldo e Pelé é uma profunda admiração pelo brilhantismo e talento que a Natureza lhes concedeu em seus pés. Nenhum sentimento a mais.

Sigo torcendo pelo hexa... e para ser uma pessoa melhor!

.......................

[1] Nem vou entrar no caso polêmico de sua filha que morreu abandonada do pai, ignorada por completo pelo Pelé. 

Quem desejar pesquisar, fica aqui uma opção de link: https://www.diariodocentrodomundo.com.br/a-tragedia-de-sandra-a-filha-que-pele-rejeitou-e-que-morreu-de-cancer-chamando-pelo-pai/

Resumo: Sandra, sua filha com uma empregada doméstica, foi completamente ignorada pelo “Rei”. Sequer em seu velório, Pelé teve a hombridade de ir; enviou flores em nome de sua empresa. A filha do maior jogador de futebol do mundo morreu com pouco mais de 40 anos, vítima de câncer. E morreu uns anos antes para o próprio Arantes do Nascimento. 

[2] Digite na internet: “polêmicas envolvendo Ronaldo” que terão um “bom” cardápio para debate.

[3] Basta digitar “polêmicas envolvendo Neymar” na internet e verão que não é implicância. (Talvez um pouco!)

[4] “De acordo com a Receita Federal, Neymar é acusado de sonegar impostos durante os anos de 2011 e 2013, principalmente em relação aos pagamentos feitos pelo Barcelona em sua transferência do Santos. Em 2015, a Receita apontou que houve sonegação de R$ 63,6 milhões por parte do jogador. Na ocasião, foi listado omissão de rendimentos de fontes do exterior com publicidade e ‘omissão de rendimentos oriundos de vínculo empregatício pagos pelo Barcelona’”. Veja mais em: https://www.uol.com.br/esporte/colunas/lei-em-campo/2022/07/29/especialistas-analisam-decisao-sobre-suposta-sonegacao-fiscal-de-neymar.htm?cmpid=copiaecola

[5] Um pouco sobre a luta de Richarlison (também) fora de campo:

https://www.correiobraziliense.com.br/esportes/2022/11/5054333-richarlison-as-5-causas-sociais-em-que-o-camisa-9-faz-apoia-fora-dos-campos.html

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