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Reimont Otoni

Deputado federal (PT-RJ), presidente da Comissão de Direitos Humanos, Minorias e Igualdade Racial da Câmara

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Governo Bolsonaro foi o marco zero das fraudes no INSS

Endividamento de crianças e vulneráveis é a face mais cruel da bandalheira

Prédio do INSS (Foto: José Cruz/Agência Brasil)

A herança maldita de Jair Bolsonaro atingiu todas as áreas e setores. Os seus efeitos devastadores ainda se fazem presentes e exigem esforços e recursos invariavelmente de grande porte para serem sanados.

De todos os danos que ele causou, um dos mais cruéis foi a permissão de que crianças órfãs ou extremamente vulneráveis - portadoras de doenças crônicas graves e de autismo, síndrome de Down, paralisia, esquizofrenia, entre outras –, beneficiárias do BPC (um salário-mínimo) ou pensão por morte, tivessem empréstimos contraídos em seus nomes, sem permissão judicial. Uma crueldade quase na mesma dimensão de desprezo humano que demonstrou na pandemia e gerou 400 mil mortes evitáveis.

Os levantamentos iniciais indicam mais de R$12 bilhões em empréstimos para crianças de até 14 anos, que carregam dívidas impagáveis e que reduzem os valores de um benefício já pequeno para as imensas necessidades básicas que enfrentam. 

A sangria começou em março de 2022, com a Medida Provisória 1106, permitindo que beneficiários do BPC e pensão por morte usassem até 45% do valor recebido do INSS para quitar financiamentos e outros produtos financeiros. A MP virou lei em agosto daquele ano.

Quase ao mesmo tempo, uma Instrução Normativa do INSS (a de número 136, de agosto de 2022), abriu as portas para a farra bilionária e cruel, autorizando os tutores e responsáveis a contraírem empréstimos em nome do beneficiário legal, diretamente, e eliminando a necessidade de autorização judicial.

Tudo encadeado e encaixado.

Um levantamento recente do INSS revela que mais de 395 mil acordos foram averbados só naquele 2022, com instituições financeiras, via BPC ou pensão por morte. A maior concentração se deu na faixa etária dos 11 aos 13 anos (136 mil acordos). Quinze desses casos envolviam menores de um ano! Em um deles, a criança nasceu em maio e, em dezembro, já tinha uma dívida de R$ 15.593 em seu nome, a ser paga em 84 parcelas. 

Além do empréstimo consignado, outros dois produtos foram vendidos a menores, a partir de 2022 - a RMC (Reserva de Margem Consignável) e a RCC (Reserva do Cartão Consignado), que funcionam como cartões de crédito e têm juros de até 2,46% ao mês (ou 33,86% ao ano!). Tudo com desconto em folha.

Essas normas começaram a ser revistas e anuladas a partir das investigações da Controladoria-Geral da União e da Polícia Federal, no governo Lula. Desde maio de 2025, quando assumiu o atual presidente do INSS, Gilberto Waller Júnior, a instituição passou a revisar todos os acordos com bancos e já reduziu de 74 para 59 a lista de instituições parceiras, por conta de irregularidades. Mudaram as regras do consignado e há um pente-fino em relação aos descontos em folha.

Mas é preciso ir além. Torna-se urgente fazer uma força-tarefa para uma revisão de todas as normas e todos os atos do INSS no governo Bolsonaro, já identificado como Marco Zero das fraudes nos benefícios, com a revogação das decisões prejudiciais aos beneficiários. É preciso uma investigação ampla dos contratos assinados no período e do envolvimento das instituições financeiras.

No caso das crianças e dos mais vulneráveis endividados, é preciso construir um projeto que inclua desde o rastreamento dos empréstimos, especialmente os de maior porte, uso do dinheiro, envolvimento de tutores, responsáveis e, eventualmente, de terceiros, até o ressarcimento às vítimas. Buscar soluções jurídicas para a suspensão imediata dos pagamentos e para a devolução do já descontado, prevendo, inclusive, a participação monetária das 47 instituições financeiras que emprestaram dinheiro a menores, assumindo o risco de operações no mínimo controversas, uma vez que o Código Penal proíbe que menores assinem contratos dessa natureza. É inconcebível que essas pessoas já tão frágeis continuem a carregar este peso.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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