Luis Inácio falou, Luis Inácio avisou
A canção “Luis Inácio”, de 1995 continua, para tristeza geral da nação, extremamente atual, trinta anos depois
Revisitando a discografia da banda Os Paralamas do Sucesso já vou dizendo que Selvagem? é meu disco preferido. Das canções de Selvagem? (1986), além de “Alagados”, gosto muito da canção “Selvagem” (agora sem o ponto de interrogação), quando diz, por exemplo: “A polícia apresenta suas armas/Escudos transparentes, cassetetes/Capacetes reluzentes e a determinação/De manter tudo em seu lugar...”. Uma pausa no Selvagem? E eis que chegamos ao trabalho Vamo batê lata (ao vivo), de 1995. E lá vamos nós ouvir as dezoito músicas que compõem os dois CDs. Sim, eu sou uma daquelas criaturas em extinção que ainda escutam CD. Não é necessário dizer, é claro, que o referido disco dos Paralamas do Sucesso é um trabalho maravilhoso, e que não existe um só brasileiro que não conheça pelo menos uma daquelas canções.
O disco 1 começa com “A Novidade”, terminando com “Medley: Não me estrague o dia”. O disco 2, por sua vez, traz quatro canções: a primeira é “Uma brasileira”, com participação de Djavan e a última é “Esta tarde”. A terceira canção do CD 2 intitulada “Luis Inácio” (300 picaretas), foi ouvida por mim ainda no ano em que foi lançada. Na época chamou bastante atenção, uma vez que a letra desnuda e expõe muitas das artimanhas, falcatruas e conchavos políticos que se dão na calada da noite, longe dos olhos do cidadão brasileiro. No Brasil, todas aquelas pessoas que conseguem somar 2+2 já perceberam que a cada ano surge, no mínimo, um escândalo (leia-se: roubalheira) que, de tão grande, sempre soterra o anterior. Na maioria das vezes, os envolvidos são aqueles que foram eleitos para defender e proteger o povo, bem como o erário. Mas o que se vê na realidade, são raposas tomando conta dos galinheiros, cantando e andando para aqueles a quem deveriam representar e prestar contas.
Em entrevista à mídia no dia 15 de setembro de 2025, o ex-ministro José Dirceu (PT) defendeu a necessidade de se “mudar o Congresso Nacional”. Em outras palavras, o político quis dizer que não adianta eleger um presidente comprometido em melhorar a vida do povo se não elegermos parlamentares que tenham a mesma preocupação. Se isso não ocorre, o Presidente terá sempre as mãos atadas. E a quem interessa que um presidente progressista, com políticas de inclusão social não governe, mas que seja apenas uma figura decorativa na política nacional? Não é preciso ir muito longe para compreender a dificuldade de se governar um país, quando se depende da boa vontade do pior Congresso da história. Não é decente que, por exemplo, por não ter sido afagado pelo governo com mimos, tapinhas nas costas e otras cositas más (por otras cositas más entendam usar os bancos públicos como cabides de emprego e indicar amigos ao STF, usurpando prerrogativa que é do Presidente da República), um líder de uma casa legislativa saque da gaveta e ponha em votação as chamadas “pautas bombas”, com o claro objetivo de travar o governo.
É por essa e outras razões que a canção “Luis Inácio”, de 1995 continua, para tristeza geral da nação, extremamente atual, trinta anos depois. E o que é mesmo que é mesmo que a faz assim? Veja alguns versos, caro leitor/leitora e tire suas próprias conclusões. A letras diz: “Luis Inácio falou, Luis Inácio avisou/ São 300 picaretas com anel de doutor.../Eles ficaram ofendidos com a afirmação/Que reflete na verdade o sentimento da nação/É lobby, é conchavo, é propina, é jeton/Variações do mesmo tema sem sair do tom.../Parabéns, coronéis, vocês venceram outra vez/O Congresso continua a serviço de vocês”.
A PEC da bandidagem, o PL que objetivava impedir a Polícia Federal de investigar o crime organizado, a blindagem dos parlamentares golpistas e, mais recentemente, a aprovação do PL da devastação dizem muito sobre aqueles e aquelas que comandam os destinos do país. Mesmo assim, apenas os incautos estão surpresos, pois Luis Inácio falou, Luis Inácio avisou. 2026 já bate à porta. E não há nada ruim que não possa piorar, pois como bem nos ensina Shakespeare: “O inferno está vazio e todos os demônios estão aqui”.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

