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Marconi Moura de Lima Burum

Mestrando em Direitos Humanos e Cidadania pela UnB, pós-graduado em Direito Público e graduado em Letras. Foi Secretário de Educação e Cultura em Cidade Ocidental. Trabalha na UEG. No Brasil 247, imprime questões para o debate de uma nova estética civilizatória

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Ministro Fachin: não olhe para cima - nessa eleição!

Com todo o rigor do protocolo jurisdicional, o que o Presidente do TSE fez – com seu discurso ao Prerrogativas – foi dizer à Nação: “Olhem para cima”

(Foto: ABR | Alice Vergueiro)
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Em primeira correnteza, é fundamental dizermos que a urna eletrônica é o Direito Achado na Rua dos analfabetos. E para isso é fundamental explicarmos, mesmo que em rápidas linhas, o que vem a ser o Direito Achado na Rua (DANR). 

Trata-se de um ramo de estudos (da ciência) e mobilização (da política) do Direito. Em linhas mais congruentes: é uma categoria da teoria crítica do Direito que se viu fundada na Universidade de Brasília pela inspiração dos postulados do jurista Roberto Lyra Filho e coordenado nestes mais de 30 anos de existência em devir pelo ex-Reitor da UnB, professor José Geraldo de Sousa Junior.

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 O DANR é[1], grosso modo, a percepção do Direito como “a legítima organização social da liberdade”. Ora, não basta ler isso. Há uma carga enorme de sentidos que está justaposta em cada palavra as quais montam a sentença. Entender o DANR é compreender a gramática destas coisas que dizem muito acerca do Direito que sonhamos de fato para nossa gente.
Pois bem! Para o DANR, a lei é importante. Contudo, a norma não diz necessariamente o Direito, que somente se efetiva como garantia se é capaz de produzir “legitimidade” (autenticidade democrática; ampliação de horizontes); se habita o lugar dos mais pobres, espoliados ou vulnerabilizados, isto é, sujeitos que se “organizam socialmente” (ou estão implícitos nestas organizações); e se se consolida no espelho franco da emancipação dos sujeitos. Portanto, o Direito, sendo lei ou não, tem como fim a liberdade de todos nós – e liberdade é um todo que produz outra carga enorme de sentidos.

Bom! Hora de entendermos o contexto do ministro Edson Fachin neste desenrolar que proponho reflexão. Senão, vejamos. No último dia 26 de julho, o grupo Prerrogativas se reuniu com sua excelência, o Presidente do Tribunal Superior Eleitoral e outras várias autoridades do TSE[2]. Como sempre, as lutas do grupo Prerrogativas têm sido fundamentais para se construir (ou reerguer das ruínas) o Estado Democrático de Direito no Brasil. No entanto, sobre suas manifestações na reunião não irei tecer comentários aqui. Somente agradecer ao Prerrogativas. Ademais, recomendo que o e a generosa leitura aqui possam assistir a gravação deste encontro no TSE (link ao final do texto).

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Fachin fez questão, em sua fala derradeira no evento, de ler um texto. Não falou por improviso ou espontaneidade. Creio que seja a preocupação que é própria dos magistrados – que tem exigido ainda mais prudências nestes tempos em que o fascismo teima desvirtuar as palavras dos democratas de verdade. Ou talvez não. Fachin constrói uma contra-narrativa estratégica (recados dados e endereçados) com muita sutileza – destarte, necessária.
Isto posto, foram várias as frases de efeito (um nocaute discursivo que deve ter levado à lona alguns atores da República). Quero, portanto, elucidar algumas que nos geram prazer (a quem luta e gosta do fronte em coragem) e esperança (a quem anda tão cansado das pós-verdades, mentiras e terrorismos que brotam exatamente de onde deveria brotar a paz: o Palácio do Planalto). Vejamos:

1) Comecemos pelo contexto que gerou a epígrafe deste texto, a meu ver, a essência de uma verdadeira lógica republicana, isto é, o que justifica se de fato somos um Estado, ou um aglomerado de bárbaros (em sentido pejorativo) desvairados que fingem viver em sociedade. Fachin (e me emociono com isso) disse que (em outras palavras), desde a criação da Justiça Eleitoral, há uma evolução na semântica do exercício da democracia em seus eventos ao sufrágio popular que interessa aos pobres. Ademais, é com a criação da urna eletrônica que um grande passo da cidadania rompeu abruptamente os paradigmas de exclusão e exploração cruéis do povo analfabeto do Brasil. Como assim?

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Citando o texto do jurista pernambucano, Marcus André Melo[3], Fachin lembra que a Constituição Federal prescreveu o voto aos analfabetos (portanto, a Lei), mas foi a urna eletrônica que permitiu de fato o exercício deste voto; que o sujeito analfabeto passou a “conseguir” vivenciar seu poder de cidadão na festa da democracia (portanto, o Direito – analogamente, o Direito Achado na Urna).

2) Mas Fachin ousou além. Num claro recado ao Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, afirmou que o TSE está preparado para realizar uma eleição geral plena, segura e legítima. E que não haverá espaço para o “negacionismo eleitoral”; que “contra posturas anti-democráticas: doses maciças de vacina de democracia” ocorrem(rão).

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Ora, se de um lado, o Chefe da Nação oferece Cloroquina (remédio sem eficácia) para combater a pior pandemia da história: a COVID-19, e que – por inação de enfrentamento – levou à morte quase 700 mil vidas neste País; e este mesmo Chefe do Estado brasileiro oferece agora uma nova “Cloroquina”, a Eleitoral, o tal voto impresso, fingindo ser o condicionamento para se ter (ou não) eleição, o Chefe da Justiça Eleitoral nos convida à lucidez, ao mundo real, a retornarmos para um Brasil sem bravatas, sem flertes autoritários, doravante, um Brasil novamente democrático.

3) Embora outras tantas frases de impacto – para a reflexão institucional e para a resistência social – tenham saído da boca de Fachin nesta reunião, elucido apenas mais uma – a fim de não cansar a e o leitor. Quando ele diz que não devemos nos seguir pelo “canto da sereia”[4]. Por conseguinte, o estérico Presidente do Brasil, com suas falácias e fake news em seu “cercadinho tunado”[5], tenta engravidar nossos ouvidos com suas besteiras sem fim. Aliás, desde o primeiro dia de mandato, lá em 1º de janeiro de 2019, não fez outra coisa senão gritar, ou mentir, ou debochar (dos pobres). Ou pior ainda: reivindicar aos seus asseclas a tortura e a morte de seus adversários (antigos: os “comunistas” e os duendes; os novos: os neoliberais “moderados” arrependidos; e até os ex-aliados do seu fascismo líquido que, fugazmente, desenharam um mito que “desmitou” repentinamente quando descobriram o verdadeiro caráter do seu Jair – veja o caso do Gustavo Bebianno, do Major Olimpio, do Alexandre Frota, do Kim Kataguiri e tantos mais).

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Dito tudo isto, preciso resumir o que busquei neste singelo texto:
i) o emocionar(-me) – e trazer isso a você – ao quão lindo foi saber que um direito pode se tornar direito de fato quando as condições sinceras brotam do Estado por suas normas, culturas e ações (instrumentos concretos de realização), portanto, mobilizam os sujeitos para a liberdade (caso da urna eletrônica/voto dos analfabetos). Boa parte de meus parentes que vieram do Ceará para Brasília eram ou são analfabetos. Faz ideia do quanto sofreram – e sofrem?; e
ii) o esperançar que Paulo Freire nos ensina, sabe? Não é a esperança passiva, que aguarda as notas oficiais das instituições para salvar a democracia, contudo, a esperança ativa, que prima por consertar o erro destas mesmas instituições que, ao chancelarem um Golpe (em 2016), na deposição injusta da Presidente Dilma Rousseff; ao não ouvirem a Organização das Nações Unidas (ONU), quando fora dito que Lula tinha direito de participar das eleições de 2018 e, ao contrário disso, naquele momento deram tanto poder a um único (perdão pelo pleonasmo) homem – o Sergio Moro – que não apenas mandou prender (sem materialização de crime) o líder das pesquisas eleitorais, mas abriu o espaço concreto para que o fascismo reinasse no Brasil; ao colocarem suas vendas rasgadas nos olhos e fingirem que não viram as fake news e as tantas sujeiras no jogo eleitoral de 2018 – permitiram a ambiência para todo esse conjunto de desgraças por que passa o País. Estas instituições acordaram. O TSE é a prova disso. As falas dos últimos dias do ministro Edson Fachin são provas disso; de que resolveram sair da zona de conforto de seus ares condicionados (nem sei se escreve assim o plural) e agir pelo Brasil.

Por falar nos dizeres de Fachin: lembram-se do filme “Não olhe para cima”[6], com o ator Leonardo DiCaprio? Aquele que ironizou sobremaneira os tempos patéticos em que déspotas tardios lideram seus países rumo ao terraplanismo, ao negacionismo e a toda ordem de bobagem que nos emburrece enquanto humanidade. Pois é! Com todo o rigor do protocolo jurisdicional, o que o Presidente do TSE fez – com seu discurso ao Prerrogativas – foi dizer à Nação: “Olhem para cima”!

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… E olharemos, ministro, pode crer! Ninguém aguenta mais esse País (de cabeça) para baixo…

…………………………..

[1] Conheçam melhor os trabalhos do Direito Achado na Rua, acessando o blog do coletivo: 

http://odireitoachadonarua.blogspot.com/.

[2] Caso queiram ir direto para a reunião do Grupo Prerrogativas com a equipe do TSE, adiantem o vídeo para 1 hora e 27 minutos. Antes eles falam de outro tema também importante ao Brasil, mas não tem relação com o texto acima. 

Link para o vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=10U5w_4Rvg0.

[3] Professor da Universidade Federal de Pernambuco, em seu texto para o jornal Folha de S. Paulo, afirma, entre outras coisas necessárias, que “a EC-25/85, que garantiu o voto dos analfabetos foi simbólica; a urna foi um instrumento que emancipou ‘de facto’ o eleitorado pobre.”

Acessem em: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/marcus-melo/2022/07/estao-falsificando-a-acta.shtml.

[4] Fachin sobre a sociedade e as instituições: "qual Ulisses, de Homero, não se fascina pelo canto da sereia do autoritarismo, nem se abala à intimidações".

[5] O termo é um adjetivo que vem do verbo “tunar”, aportuguesado de “tuning”, que em inglês quer dizer: “afinação” ou “personalização”.

No Brasil passamos a usar essa linguagem entre os jovens, especialmente, que, no prazer em ver seus carros “Velozes e Furiosos”, colocam todo tipo de adereços, acessórios, som estridente, luzes internas de neon (estas que mais parecem de motel), e outras customizações a fim de se chegar a uma estética hiper-visual.

De certa forma, é uma artificialização do veículo que se “transforma” em um objeto de exibição e serve para “destacar” seu proprietário entre os amigos (e “concorrentes”), e, na cabeça de alguns, pode ainda ser usado como artefado de “sedução” a homens e ou mulheres que se desejem enamorar.

Enfim, o “cercadinho” do Bolsonaro (ali na frente do Palácio da Alvorada) é esse “veículo” tunado, (só) que lhe serve de gradiente aos seus devaneios políticos e seus flertes totalitários.

[6] Para quem tiver a curiosidade de saber mais sobre este filme maravilhoso, indico este artigo: https://www.brasildefato.com.br/2021/12/28/artigo-em-nao-olhe-para-cima-a-crise-vem-do-nada.

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