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Pedro Simonard

Antropólogo, documentarista, professor universitário e pesquisador

92 artigos

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Nunca fui petista nem lulista, mas...

Nunca fui petista nem lulista, mas sempre fui anticapitalista e revolucionário. Diferentemente do PSOL, do PDT e do PSB, sempre denunciei e Lava Jato e os processos contra o Lula e o PT e lutei contra ambos

(Foto: Ricardo Stuckert)
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Nunca fui petista nem lulista. Meu pai era visceralmente contra a ditadura. Lia o Correio da Manhã e o JB, depois que a ditadura destruiu o primeiro. Era um liberal cristão. Me ensinou os valores democráticos e a importância de se lutar ao lado do povo.

Em minha primeira eleição, em 1982, votei em Leonel Brizola para governador do Estado do Rio de Janeiro e na chapa toda do PDT. Quando Brizola compôs com o chaguismo me decepcionei. 

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Mantive minhas convicções esquerdistas e militei no Movimento Anarquista. Eu e mais três camaradas criamos o GAJO, Grupo Anarquista José Oiticica, célula anarquista que muitos militantes chamavam de Gato por confundirem seu nome com seu símbolo, um gato arrepiado dentro de um círculo com o “A” anarquista sobre ele.

Em 1986, continuei militando entre os anarquistas, mas votei na chapa PV/PT para governador. O cabeça de chapa era Fernando Gabeira, na época um cara de esquerda. Achava que a ação política tinha que entranhar-se em todas as áreas e à prática anarquista associei a luta eleitoral.

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Em 1989, votei em Brizola por achá-lo mais coerente e com mais chances de derrotar Fernando Collor.

Nas eleições seguintes votei nos candidatos mais à esquerda para governador e nas chapas encabeçadas por Lula e Brizola para presidente.

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Em 2002, votei em Lula para presidente por achá-lo o candidato mais à esquerda. 

Em 2006 votei em Heloísa Helena porque o PSOL, naquele momento, ainda não tinha tornado-se esta esquerda identitária que abandonou a luta de classes, como é sua posição atual. Achava-o mais à esquerda do que o PT.

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Em 2010 votei em Dilma Rousseff, a contragosto, contra o vendilhão do José Serra.

Em 2014 votei nela contra o Aécio Neves por falta de opção, mesmo motivo pelo qual votei no liberal Fernando Haddad contra o nazifascismo em 2018.

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Ainda hoje não acredito em partidos políticos como estruturas revolucionárias. Acho que a prática nos sindicatos deve conduzir a luta revolucionária. A estrutura partidária é mais rígida e, institucionalmente, um partido está mais sujeito a ordem unida hierárquica do que um sindicato,

Nunca fui petista nem lulista, mas sempre fui anticapitalista e revolucionário. Procuro manter-me coerente com as pautas de esquerda e me incomoda muito o jogo político de morde e assopra que os partidos de esquerda desenvolvem junto com os partidos burgueses. Uma hora combatem-se e outra hora unem-se para defender a democracia e os direitos que a própria burguesia, ao errar a mão na dose da dominação, colocou sob ameaça, criando condições para o povo organizar-se e combatê-la. Nessas horas em que a ameaça de uma revolta popular se torna possível, os partidos de esquerda, sempre de maneira servil, unem-se em uma frente ampla com os setores “democráticos” da burguesia para restabelecer o controle desta sobre o povo. Foi assim na Itália e na Alemanha em 1919, foi assim em 1968 na Europa e tendo sido assim ao longo da história.

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Nunca fui petista nem lulista, muito embora quem não me conhece me acuse de sê-lo porque tenho defendido ferozmente o PT e os petistas, sobretudo Lula, atingidos pelo lawfare que caiu como um raio sobre o Brasil depois de 2013. 

Diferentemente do PSOL, do PDT e do PSB, sempre denunciei e Lava Jato e os processos contra o Lula e o PT e lutei contra ambos. Roteirizei e dirigi um documentário sobre isto (Resistir, 2019). Denunciei e lutei não devido a um amor incondicional para com o Lula, longe disso. O fiz porque acredito que não pode haver democracia em um país onde o lawfare tornou-se o novo normal da justiça.

Muito bem, onde este cara quer chegar, perguntarão os pouco leitores desta coluna.

O que me motivou a escrever esta “confissão de fé” foi um texto publicado no Facebook de um deputado federal do PCdoB de Pernambuco. Antes de comentá-lo achei necessário esclarecer o meu “lugar de fala”. 

No referido texto, o deputado chama o segundo turno das eleições em Recife de a Batalha de Recife. O texto começa afirmando que esta “batalha ocorre entre dois candidatos do mesmo campo. Poderia ser um debate rico em ideias e projetos, fortalecendo a democracia, não foi”. Eu já começo discordando. Conforme já escrevi em outra coluna, pelo posicionamento recente de PDT, PSB e Rede em questões cruciais para os trabalhadores brasileiros, considero-os linha auxiliar do neoliberalismo no Brasil. Desta forma, Marília Arraes estaria posicionada no campo da esquerda e João Campos, com muito boa vontade, estaria posicionado no campo do centro. Neste segundo turno não ocorreu um “debate rico em ideias e projetos” porque a coligação que apoiou João Campos utilizou-se de todo o jogo sujo criado pela direita para ganhar as eleições: oportunismo religioso, uso da máquina pública e fakenews. Com a vitória de João Campos não há o que esquerda comemorar. 

O texto do deputado continua assumindo um discurso tipicamente da direita, o discurso da competência: “João Campos é o candidato mais preparado, mais competente e representa a unidade de vários setores e partidos, PSB, PCdoB, PDT, MDB, PP, Rede, PV, PROS, AVANTE, Republicanos, PSD”. Esta frente é composta por diversos partidos que participaram ativamente do assassinato da democracia no Brasil. O deputado acusa Marília Arraes de não ter preparo para exercer função pública. Ela possui a mesma experiência e preparo que João Campos. A crítica feita pelo deputado apresenta-se como um discurso misógino. 

Prossegue o “isento” deputado afirmando que “setores ligados à ‘direita orgânica’ em PE apoiam nossa adversária. Não querem a vitória dela, e sim, a nossa derrota. Acreditam que ficaria melhor para seus interesses políticos. Significaria a desorganização de um campo Democrático, a Frente Popular, articulada em Pernambuco e referência para o Brasil”. Este trecho chega a ser quase uma obra-prima da comédia, digno de um Molière. Que setores da direita orgânica seriam estes? Na coligação do que ele chama de “campo Democrático, a Frente Popular” estão MDB, PP, Rede, PV, PROS, AVANTE. Me parece que a composição desta frente já abarcou boa parte da “direita orgânica”, fechada com João Campos, e pouco dela teria sobrado para apoiar Marília Arraes.

“Precisamos eleger prefeitos que compreendam a importância de juntar forças para defender a democracia, barrar o fascismo, e mudar o país”, prossegue o nosso narrador. Na hora de defender a democracia contra o golpe contra a presidenta legitimamente eleita, Dilma Rousseff, MDB, PP, Rede, PV, PROS, AVANTE, a maioria dos deputados do PDT e do PSB, inclusive os de Pernambuco, votaram a favor da quebra do regime democrático que agora, cinicamente, afirmam defender.

Todos os partidos que compõem esta frente, exceção feita ao PCdoB, partido do “nosso” deputado, se omitiram na defesa do Lula contra os processos de lawfare lavajatianos dos quais ele foi vítima. Ciro Gomes, o mandachuva do PDT, muito pelo contrário, buscando arrebanhar o voto da direita lavajatista bradou uma série de acusações contra o Lula - “o Lula está preso, babaca” – e continua bradando até hoje! O lawfare é uma das maiores ameaças às democracias modernas e não pode haver democracia onde ele é aplicado livremente.

Por fim, na hora de lutar contra o fascismo no segundo turno das eleições presidenciais de 2018, Ciro Gomes resolveu passear em Lisboa.

O deputado em questão esqueceu-se oportunamente que o Diretório Nacional do PT obrigou o Diretório Regional de Pernambuco a abrir mão da candidatura de Marília Arraes para o governo do estado em 2018 para apoiar o candidato do PSB. Em troca, o PT recebeu uma série de ataques do PSB e do PDT, linhas auxiliares do neoliberalismo.

Não sou contra uma Frente Ampla que inclua setores de centro, desde que feita sob a égide da defesa dos direitos dos trabalhadores, das riquezas nacionais e da soberania do Brasil. Sou contra a falsa afirmação de que PDT, PSB e Rede sejam partidos de centro-esquerda. 

Compor uma frente ampla com os partidos neoliberais, artífices do golpe de 2016, sem impor-lhes uma pauta popular é servilismo político.

No momento em que escrevo esta coluna a apuração está quase terminada. Ganhou a Frente Ampla e a esquerda foi fragorosamente derrotada.

Entre as quatro maiores cidades brasileiras, a única onde um candidato apoiado pelos dois maiores partidos de esquerda - PT e PSOL - venceu foi no Rio de Janeiro, onde eles apoiaram o candidato de um partido que participa da “frente amarela” proposta de Folha de S. Paulo. Ironia do destino.

Nunca fui petista nem lulista, mas concordo em gênero, número e grau com as posições que o PT e Lula assumiram na atual conjuntura.

 

P.S.: a menos que o leitor considere PDT e PSB como partidos de esquerda, o mito do Nordeste esquerdista durou, apenas, dois anos.

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