CONTINUA APÓS O ANÚNCIO
Carlos Fraga avatar

Carlos Fraga

Jornalista e mestre em Educação

7 artigos

blog

O fator Moro

Moro não está sozinho e suas companhias não são nada amadoras

Sergio Moro em evento de filiação ao Podemos, em Brasília (Foto: eprodução/YouTube)
CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no canal do Brasil 247 e na comunidade 247 no WhatsApp.

Em artigo publicado no Brasil 247 em 16 de agosto, avaliei que se Bolsonaro fosse tirado da disputa ou chegasse às eleições em frangalhos, Moro passaria “a ser o candidato dos setores mais reacionários, golpistas, entreguistas e violentos da sociedade brasileira, tendo ao seu lado a direita liberal a dar-lhe o verniz dos ‘bons modos’ burgueses. ”

Ainda nesse artigo, afirmei que, a partir daquele momento, a direita liberal viveria o dilema entre fazer Bolsonaro sangrar até sua completa desidratação eleitoral e retirá-lo já da disputa pela presidência da República. A senha para a opção, até aqui, pelo sangramento foi dada pela carta do presidente, escrita por Temer, após a bravata de 7 de setembro, pedindo desculpas à direita liberal por ameaçar tomar em definitivo as rédeas do golpe iniciado por ela em 2014, com a inauguração da operação Lava Jato, continuado em 2016, com a deposição de Dilma sem crime de responsabilidade, e aprofundado em 2018, com a prisão política de Lula e a eleição da face fascista dessa mesma direita liberal. 

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Desde então, o núcleo duro do golpe, que mirava colocar o tucanato no poder, mas acabou precisando se aliar ao fascismo para impedir o retorno de um projeto popular, vem retomando o controle político do projeto golpista. A direção econômica desse projeto, apesar de algumas turbulências, sempre esteve nas mãos da direita liberal.

A retomada do controle político do golpe por seus patrocinadores originais expressa-se, até este momento, em três aspectos: no restabelecimento das regras da democracia burguesa que vinham sendo ameaçadas pelo ex-capitão por meio da campanha contra a urna eletrônica; nos preparativos da privatização completa da Petrobras, uma das principais razões para a retomada golpista do Poder Executivo pela burguesia nacional em aliança com as forças imperialistas, lideradas pelos EUA; e na definição da candidatura do representante mais fiel e com maior potencial eleitoral deste projeto: Sérgio Moro.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

O ex-juiz que corrompeu o sistema de Justiça brasileiro para entregar o País aos interesses das oligarquias nacionais e estrangeiras, representadas primeiro pela múmia fisiológica que atende pelo nome de Michel Temer e, depois, pelo neofascista envolvido com milicianos, terá muitas dificuldades para conquistar o eleitorado brasileiro.  Ele exala elitismo, antipatia, mentira, oportunismo, golpismo e traição, sem, no entanto, possuir um milímetro de carisma. Não consegue articular uma frase sem tropeçar nas palavras e na própria voz. É um vazio completo de forma e conteúdo.  A única arma que lhe resta é a farsa monumental do combate à corrupção que, sem a parceria da Globo, não convenceria nem o leitor da Veja.

Moro é visto por parte significativa da população como perseguidor de Lula, alguém que usou sua função pública para tirar da eleição a maior liderança popular do País e o mais provável vencedor do pleito. Ato contínuo, integrou o superministério da Justiça e Segurança Pública do governo fascista, eleito com a sua decisiva intervenção.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Dito isso, é preciso reconhecer, por outro lado, que as dificuldades desse golpista pernóstico não são intransponíveis. As pesquisas de intenção de voto registram, de maneira muito coerente com a realidade, a liderança isolada de Lula, a queda paulatina, mas consistente de Bolsonaro e um patamar muito baixo para os outros candidatos.  Contudo, a distância para o pleito recomenda não apenas cautela, mas muita capacidade de organização, mobilização e comunicação, sustentada por um discurso preciso e antenado com as movimentações das oligarquias golpistas.

Os índices de Moro nas pesquisas mais recentes mostram a sua baixa aceitação entre o eleitorado até aqui, mas está longe de ser um desempenho pífio. Bolsonaro é candidato desde que assumiu o governo, em janeiro de 2019. Lula, apesar de ainda não ter se lançado oficialmente, é candidato desde que recuperou seus direitos políticos. A consolidação dos índices do primeiro e segundo colocados deve-se, entre outros fatores, ao tempo de exposição de ambos como candidatos ou pré-candidatos.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Moro sempre esteve entre os balões de ensaio da direita liberal, mas decidiu se colocar como candidato assumido muito recentemente. As últimas pesquisas com seu nome foram realizadas praticamente na mesma semana em que se filiou ao Podemos. Ainda que se possa ponderar ter havido uma repercussão desmedida, sobretudo pelo cabo eleitoral oficial do ex-juiz golpista, a igualmente golpista TV Globo, esses fatos costumam levar algum tempo para se sedimentar na cabeça do eleitor. Observe-se ainda que o índice de largada de Moro nas pesquisas não é irrelevante, apresentando empate técnico com o longevo candidato Ciro Gomes.

A partir de agora, a direita liberal dará início a uma nova etapa na retomada do controle do processo golpista. Utilizando-se de seu mais poderoso instrumento de campanha, os veículos das organizações Globo e outros órgãos da mídia do grande capital que, em geral, aderem ao comando da família Marinho e dos farialimers, os direitistas disfarçados de democratas tentarão desesperadamente pautar mais uma vez o debate público em torno da corrupção para alavancar Moro. 

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

O que as pesquisas captam, neste momento, é que este tema perdeu espaço para questões mais prementes como desemprego, fome e inflação.  Os prognósticos para 2022 tendem a reafirmar a economia como área de maior preocupação dos brasileiros. Mas não podemos subestimar a capacidade de as Organizações Globo e da mídia golpista em geral pautarem o debate público. 

Vimos isso acontecer em quase todas as eleições após a redemocratização. Em 1989, os inimigos eram os marajás e, para combatê-los, a direita sacou um caçador. Em 1994 e 1998, o alvo era a inflação e a direita apresentou o estabilizador da moeda. Em 2006, com um governo progressista, o alvo foi a corrupção, embalada pela Ação Penal 470. A já alta popularidade de Lula, conquistada com uma ação contundente de combate à fome e ao desemprego, impediu que a receita moralista funcionasse. Em 2010, a direita ficou sem discurso diante da imensa popularidade de Lula, que deixou o Palácio do Planalto com quase 90% de aprovação.  Em 2018, apesar da já aguda crise econômica, a corrupção volta ao centro do debate eleitoral, embalada pela grande farsa jurídico-midiática da operação Lava-Jato.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Há quem acredite que a pauta da corrupção não terá chance de prosperar em 2022 por causa da grande crise econômica em que Bolsonaro e Paulo Guedes mergulharam o País. Será mesmo mais difícil emplacar a corrupção como tema principal nas eleições, diante dos mais de 14 milhões de desempregados e cerca de cinco milhões de desalentados. Isso sem falar de contingentes ainda maiores de trabalhadores que enfrentem o subemprego e a informalidade de alta precariedade e da miséria que escala patamares tristes e revoltantes.

É preciso notar, contudo, que no censo comum, criado com a ajuda da mídia do grande capital, a corrupção é vista como um problema restrito aos políticos institucionais. Não é usual a percepção de que essa é apenas a corrupção periférica. A maioria das pessoas não enxerga que essa corrupção é feita com as migalhas da grande corrupção praticada pelo grande capital privado, sobretudo o financeiro parasitário, que assalta o dinheiro público em quantias inimagináveis por meio de diversos mecanismos, entre eles, alguns que até foram tornados legais. 

Outra percepção que habita o senso comum é a de que a corrupção dos políticos é a causa da maior parte dos problemas sociais. Na visão de muitos brasileiros, a falta de hospitais públicos de qualidade, de escolas públicas com infraestrutura adequada, de saneamento básico e urbanização em inúmeras comunidades periféricas Brasil afora é fruto do desvio do dinheiro público praticado por políticos corruptos. 

Essa percepção, via de regra, não está totalmente equivocada. Mas a mídia burguesa aproveita-se da superficialidade ao tratar do tema para estabelecer um limite no alcance e na origem da corrupção. Ao fazer o recorte de que os principais atores da corrupção são os políticos, ela manipula com certa facilidade seus alvos para influir decisivamente no jogo de poder, segundo os interesses das classes dominantes, onde essa mídia se insere. 

Não à toa as falsas campanhas midiáticas de combate à corrupção só são intensificadas em governos comprometidos em alguma medida com os interesses populares, como foram os casos do segundo governo de Getúlio Vargas e dos governos de João Goulart, Lula e Dilma Rousseff. 

As Organizações Globo já começaram a reintroduzir o tema da corrupção em seus telejornais, sites e jornal impresso. Basta uma breve olhada no Jornal Nacional, na Globo News e no Jornal O Globo para constatar essa postura. Trata-se de uma estratégia que visa à preparação da opinião pública para o período de maior intensidade da campanha eleitoral. 

Paralelamente, o grupo midiático tratará de reciclar a figura de Moro como o único capaz de resolver o problema da corrupção, obviamente, sonegando do público as provas de que o ex-juiz é uma das figuras mais corruptas da República, pois corrompeu um dos pilares da democracia, que é o sistema de Justiça, cumprindo uma agenda ditada a partir dos EUA para atender a interesses econômicos e políticos das oligarquias locais e da potência imperialista. E, claro, para atender aos seus próprios interesses financeiros e de poder.

Não demora muito, tanto a Globo quanto o ex-juiz farão a ligação entre a corrupção e a crise econômica, aproveitando-se do senso comum de que a causa principal do desemprego, da fome e da inflação é a tal da corrupção dos políticos. 

Se a estratégia traçada pelo grupo Globo e grande parte das oligarquias nacionais e estrangeiras dará certo, ainda não é possível saber. Por via das dúvidas, eles mantêm Bolsonaro no páreo como plano B para derrotar Lula. Se Moro não decolar até maio, junho do ano que vem, jogarão suas fichas no atual mandatário, transformando o fascista em figura palatável e necessária para se combater “um mal maior”.

Se, no entanto, Moro demonstrar potencial para chegar ao 2º turno, com chances de representar e reacender o sentimento anti-Lula e anti-PT, não será surpresa que Bolsonaro seja retirado do caminho, seja com denúncias mais fortes de corrupção e envolvimento com as milícias seja com a colocação de sua candidatura na ilegalidade. 

A reedição da falsa campanha anticorrupção do sistema Globo tentará construir a ideia de que tanto Lula quanto Bolsonaro representam o que há de pior na política, são dois polos radicais que se encontram na corrupção. Venderá Moro como um outsider antissistema, reeditando o figurino que elegeu Collor e o próprio Bolsonaro.

Passado o imbróglio do PSDB, com a contenda Dória-Leite, e o Carnaval, a direita liberal se acomodará em torno daquele que tiver maior viabilidade eleitoral para derrotar Lula, o PT e a esquerda. O núcleo duro do golpe de 2016 trabalhará intensamente para que esse centro gravitacional do conservadorismo seja Moro.

As dificuldades de Moro como candidato e como ser humano, sinteticamente representadas em sua voz de marreco, cinismo, ausência completa de escrúpulos e total sem cerimônia com ilegalidades e acobertamento de crimes, serão embrulhadas em um lindo papel de presente semiótico e transformadas em virtudes de um cavaleiro solitário que luta contra um exército de mercenários.

Não é prudente para o staff do ex-presidente Lula acreditar que Moro está fadado ao fracasso eleitoral em razão de todas as ilegalidades que cometeu, de sua caracterização como juiz incompetente e parcial pelo STF, concentrando a campanha do ano que vem na desconstrução apenas de Bolsonaro.

Caso se aproxime dos índices de intenção de voto de Bolsonaro, Moro tentará passar a ideia de que possui mais condições de derrotar Lula e estimulará o voto útil já no primeiro turno para atrair bolsonaristas menos convictos, os eleitores indecisos e os inclinados ao voto nulo e em branco. O ex-juiz de exceção tem chances de catalisar os votos de ex-bolsonaristas e eternos antilulistas e antipetistas. E, ao ser vendido como o único capaz de derrotar Lula, pode atrair os votos até de bolsonaristas fiéis, caso a candidatura de seu “mito” regrida ao patamar de 15% a 17% das intenções de voto. 

É fundamental, desde já, uma estratégia de desconstrução tanto do ex-capitão quanto do ex-juiz. Para isso, não basta dizer que Moro foi considerado incompetente e parcial nos julgamentos que envolveram o ex-presidente Lula. Além de traduzir de forma simples e objetiva esses termos, é preciso lançar ofensivas como a recente iniciativa de deputados do PT para retomar a articulação pela instalação da CPI da Lava Jato e investigar suspeitas de desvios de recursos públicos por seus operadores. 

Uma CPI para apurar possíveis crimes cometidos pelo conluio lavajatista contribuirá para dar maior visibilidade aos diálogos infames e ilegais ocorridos entre Moro e Dallagnol no curso da operação que trouxe o Brasil à situação trágica de hoje. Não se trata de contribuir para pautar a corrupção e abrir mão da agenda econômica e social, mas de antever que esse tema poderá ganhar força no debate eleitoral, evitando uma posição defensiva quando isso acontecer.

Na linha já ensaiada por Gleisi Hoffmann, é fundamental desvelar Moro , enquanto chefe da organização Lava-Jato, como um conspirador delinquente e o maior culpado, ao lado de Bolsonaro, pela destruição de direitos dos trabalhadores, do patrimônio público e de cadeias produtivas; pela entrega do pré-sal e da própria Petrobrás; pelo estrago da alta da inflação, do aumento da conta de luz, do elevado preço dos combustíveis e do gás de cozinha; pelo nível insuportável de desemprego e desvalorização dos salários; pelo aumento indecente da pobreza e da miséria etc. 

A ofensiva das esquerdas e do campo progressista no ano eleitoral que se avizinha deve massificar o verdadeiro significado daquilo que Moro representa: uma organização que atuou fora da lei para conspirar contra os interesses nacionais e do povo brasileiro e que está na raiz dos principais problemas sociais e da deterioração da democracia no Brasil.

Moro não está sozinho e suas companhias não são nada amadoras. 

iBest: 247 é o melhor canal de política do Brasil no voto popular

Assine o 247,apoie por Pix,inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista:

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Cortes 247

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO
CONTINUA APÓS O ANÚNCIO