O próximo tycoon da mídia brasileira
João Camargo amplia poder e riqueza depois de deixar CNN
Conheci João Carlos Camargo num salão do Hotel Renaissance, em São Paulo. Rolava uma palestra do então ministro da Fazenda, Guido Mantega. Concorridíssima. Era a ocasião em que ele costumava fazer anúncios importantes que davam manchete no “Jornal Nacional”. Altos patrocínios pagavam o luxo. O maior, o da JBS.
Não sei se exatamente nesse dia ensolarado, ou em outro evento semelhante, o dono da JBS, Joesley Batista encantou-se com a apresentadora, pediu seu telefone e ela veio a ser sua atual esposa.
Bem, mas o João, que eu conhecia por sua biografia política - foi secretário de Governo do prefeito Jânio Quadros em 1985, aos 23 anos e seu pai foi um deputado federal muito bem humorado, chamado José Camargo - era o organizador da palestra, em sociedade com a revista “Brasileiros”.
Nossas conversas foram sempre muito rápidas. Como vai? Tudo bem? E por aí afora.
Não tive mais contato com ele até saber que ele virou concorrente de João Dória. Fundou, em 2012, o Esfera Brasil, contra o Lide do outro. Passaram a disputar a foice e faca patrocínios, empresários e políticos. Foi a primeira vez em que me dei conta de que ele gostava de briga de cachorro grande.
Vai daí que um bilionário mineiro, Rubens Menin (fortuna avaliada em R$6 bilhões), inscreve sua empresa - a construtora MRV - no Esfera Brasil. Os dois passam a trocar figurinhas. Viram amigos, e de conversa em conversa, Menin, recém separado de seu primeiro sócio na CNN brasileira, convida João para o lugar, vende para ele 30% das ações, e lhe dá amplos poderes para mandar e desmandar no dia a dia da emissora, como determina o código de ética de amigos bilionários - a fortuna de João não é conhecida, mas é óbvio que bilionário não chama para sócio outro cara que também não seja. Especialistas estimam seu patrimônio na casa dos bilhões de reais, impulsionado pelo crescimento da Esfera durante a transição de governos (Bolsonaro para Lula) e pela expansão midiática. Mas não há números oficiais.
O “casamento” João Camargo - Rubens Menin, assinado em 2022, tinha tudo para dar certo. Corriam nas veias de João tanto sangue político quanto radiofônico, seu pai fundou o Grupo Camargo, que abrange rádios como Alpha FM, 89 FM A Rádio Rock, Nativa FM e Disney Rádio. E deu mesmo. No início. Mas com o passar do tempo os conflitos começaram.
Sempre ligado em 220 volts, João queria expansão agressiva e integração de negócios, enquanto Menin priorizava estabilidade financeira e controle total. A relação azedou gradualmente a partir de fins de 2024, mas piorou nos meses seguintes.
Entre fevereiro e maio deste ano, Camargo e seus irmãos compraram a Rede Transamérica. Sem consultar Menin, ele avançou em uma negociação para integrar a CNN ao rádio, compartilhando verbas publicitárias e estúdios (inclusive em Belo Horizonte, com a Rádio Itatiaia de Menin). Mexeu no bolso do sócio. Bilionário não gosta de perder nem centavos. Menin viu nisso conflito de interesses e risco à rentabilidade da TV, que já era deficitária em investimentos altos. A velocidade do processo o irritou, ele se sentiu como o marido traído.
O bilionário do “Minha Casa, Minha Vida” também ficou com ciúme do Esfera, cujos eventos competiam por patrocínios com a CNN, e com o fato de que Camargo usava sua posição para promover a empresa familiar na emissora, gerando acusações de desvio de foco e imagem negativa no mercado.
Houve uma briga acalorada entre os dois, ouvida nos corredores da Avenida Paulista, devido a um comentário jocoso de um político. Ele disse a Rubens Menin que a CNN era conhecida como "a empresa do João Camargo" e ele foi tirar satisfações com o sócio minoritário. Bilionário não gosta de ser passado para trás. Sobretudo se o outro é menos bilionário que ele. (Era mais ou menos o que os filhos de Roberto Marinho alegavam para afastar Boni da Globo.)
Superado o atrito, Camargo foi em frente. Defendia mais contratações e projetos como CNN Sports e sede no Rio (financiados pessoalmente), mas Menin, satisfeito com o superávit de 2024 após cortes de Camargo, freou expansões para evitar riscos. Camargo acusou Menin de "se contentar com lucro modesto" em entrevistas posteriores.
Em 22 de agosto deste ano, Camargo "pediu demissão", mas nos bastidores consta que foi Menin quem “pediu” para ele sair, como estabelece o “código de ética” de bilionários que de amigos viram desafetos. Menin reassumiu o controle, demitiu aliados de Camargo (como Acácio Rocha) e nomeou mineiros de confiança (João Vítor Xavier como presidente).
Em outubro, a CNN entrevistou Doria com "tapete vermelho" – um gesto visto como provocação. Camargo rebateu em entrevistas, criticou Menin por falta de visão e lançou a TMC (Transamérica reformulada) como concorrente.
O divórcio foi dramático, beirando ao escândalo. Menin proibiu Camargo na sede da CNN, recolheu pertences dele via segurança, e houve demissões em cascata. A briga transcende a CNN, agora rivalizam rádios (Itatiaia vs. Transamérica/TMC) por audiência, patrocínios e influência política em Minas e São Paulo.
Há indícios fortes de que o divórcio pode evoluir para um litígio judicial em breve. Até setembro de 2025, o rompimento era "civilizado" com elogios mútuos, mas escalou em outubro com a entrevista de Doria na CNN, vista como "declaração de guerra".
Reportagens indicam que Camargo estuda ações por quebra de contrato societário, difamação ou disputa por ativos (como os 30% de ações na CNN, que ele reteve ou negocia o resgate). Não há processos formais ajuizados até 19 de outubro de 2025, mas fontes próximas preveem judicialização nos próximos meses, especialmente por verbas publicitárias compartilhadas e cláusulas de saída. Menin, com mais recursos, pode contra-atacar por conflito de interesses.
Aquele João Camargo das palestras de Guido Mantega agora demonstra uma ambição clara para se consolidar como um dos grandes magnatas da mídia no Brasil, especialmente no rádio, mas com olhos para expansão multiplataforma, incluindo TV e digital.
Após a morte de Silvio Santos (em 2024) e a ausência de Roberto Marinho (falecido em 2003), o cenário midiático ficou mais fragmentado, com Johnny Saad (Grupo Bandeirantes/Band) e Edir Macedo (Record) como principais sobreviventes no oligopólio de TV aberta.
Camargo, com sua expertise em rádio e conexões políticas via Esfera Brasil, vê na Transamérica uma alavanca para criar um "império de comunicação" imparcial, focado em jornalismo, opinião e esportes, rivalizando com as grandes redes.
Reportagens do Poder 360 e Folha de S.Paulo indicam que ele continua pensando grande. Planeja triplicar o faturamento da Transamérica (estimado em R$ 60-80 milhões anuais) e expandir para 500 afiliadas, integrando rádio com TV e streaming.
O TMC, que estreou em 13 de outubro de 2025, já contratou nomes de peso como Daniela Lima (ex-GloboNews e ex-CNN), Jamil Chade (jornalista internacional) e Luiz Felipe Pondé (colunista conservador), sinalizando um equilíbrio ideológico para atrair anunciantes e audiência diversa. Mas também demitiu o brilhante jornalista Flávio Gomes quatro dias depois de contratá-lo, devido a seus “posicionamentos”, o que é uma afronta à liberdade de expressão, garantida pela constituição a todos os brasileiros. Mesmo aos que torcem pela Portuguesa, como ele.
No longo prazo, fontes próximas indicam planos para transformar a TMC em canal de TV, posicionando-o como "o novo articulador entre Estado e mercado na mídia", como o chamou o InvestNews em junho de 2025.
O valor exato da transação com a Transamérica não foi divulgado publicamente, pois é um negócio privado entre a família Camargo (irmãos João e Neneto) e as cinco herdeiras do banqueiro Aloysio Faria (falecido em 2022), que controlava a rede via Conglomerado Alfa. Estimativas de mercado, baseadas em faturamento anual da rede (R$ 60-80 milhões) e múltiplos típicos para ativos de rádio (5-8x o faturamento), apontam para um custo entre R$ 300 milhões e R$ 500 milhões, segundo o Brazil Journal e especialistas em radiodifusão. João Camargo descreveu a operação como "superavitária" em entrevistas, destacando que a Transamérica já era parceira da CNN Rádio (projeto dele na emissora). A aquisição inclui as seis emissoras próprias em capitais (SP, RJ, BH, Curitiba, Brasília e Recife), com presença em 370 cidades via afiliadas.
Em mais uma prova de que o caso com Menin ainda é um espinho na sua garganta, e que ele não pretende parecer menor que o ex-sócio, ele mudou a sede da nova Transamérica, que ocupava um modesto casarão na Lapa, para um conjunto de 1.500 metros quadrados na Avenida Paulista, a poucos metros da CNN.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.




