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Marconi Moura de Lima Burum

Mestrando em Direitos Humanos e Cidadania pela UnB, pós-graduado em Direito Público e graduado em Letras. Foi Secretário de Educação e Cultura em Cidade Ocidental. Trabalha na UEG. No Brasil 247, imprime questões para o debate de uma nova estética civilizatória

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O PT (não) confia mesmo no Sistema de Justiça brasileiro(?)

"Se o PT não pôde confiar no sistema de justiça nos momentos mais embaraçosos da história, porque não aproveita a oportunidade para incluir um quadro técnico?"

Lula e José Eduardo Cardozo
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Confesso que nunca entendi por que o PT Nacional não quis impetrar uma ação a fim de represar um pouco a “correnteza” do Golpe de 16. As coisas aconteciam tão rapidamente e a violência com que usurparam, tanto o poder, quanto a legitimidade (e legalidade) dos processos naquela época, por óbvio, exigia um conjunto de medidas na Justiça. Uma destas ações que imaginava ser oportuna, apresento-a abaixo. Muito embora eu suponha uma resposta para o silêncio do partido: creio que o PT não confiava[1] nos próprios ministros e ministras que indicou para a Corte; de que estes iriam fazer a (verdadeira) justiça. Vamos ao fato que ilustra bem a questão.

Em 2016, quando a presidenta Dilma Rousseff foi afastada por força do rito da Lei do Impeachment por 180 para seu julgamento junto ao Senado Federal, esta instituição feita corte jurisdicional atípica, o vice, Michel Temer, deveria ter assumido apenas em caráter temporário o cargo de presidente da República, no entanto, demitiu todos os ministros da Dilma e nomeou os homens de sua confiança e – mais grave – começou a implementar o tal “plano de governo” do PMDB, denominado Ponte Para o Futuro.
Eu, como um “estagiário” de rábula, um tentador da filosofia jurídica, comecei a estudar o caso e escrevi as linhas gerais de um mandado de segurança a ser apresentado na Suprema Corte para tentar impedir que essas medidas de Temer, em caráter finalístico, tivessem êxito, ao menos até que acontecesse o trânsito em julgado no Senado Federal do processo de impedimento. Como não poderia assinar o documento a ser encaminhado ao STF, convidei um brilhante advogado, o amigo Robson Medeiros, que, com seu domínio técnico, temperou e melhorou sobremaneira as arguições que eu havia apresentado.

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Realizado o trabalho de pesquisa e a fundamentação, agora era hora de convencer um partido político, como um dos legitimados (nos termos do Art. 103 da CF-88) para propor ação no STF. Por força da emergência do tempo, tivemos de recorrer a uma medida extrema: pedimos ao presidente do Partido dos Trabalhadores da nossa cidade (na época eu morava em Cidade Ocidental), para assinar conosco a peça. 

O documento [2], modéstia parte, muito bem fundamentado, foi protolizado e o sorteado para julgar foi o ministro Roberto Barroso que, em rápido despacho (leia na página do STF - MS nº 34.196) [3], não debateu o mérito da ação, e apenas negou a liminar compreendendo que mesmo o PT sendo legitimado para propor a ação, precisava ser o Diretório Nacional e não um diretório local (embora a população deste município também fosse objetivamente afetada com o transcurso da flagrante violação legal).

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Para não dizer que ficou apenas no procedimento burocrático, afirma Barroso que o Poder Judiciário não deve operar com o pé no ativismo jurídico, discurso que não convence, fato que vemos acontecer com enorme frequência no sistema de justiça esse tal ativismo jurídico, no entanto, ao transbordo da conveniência do magistrado de plantão. (A operação Lava Jato é um barril de armazenamento desse tipo de intervenção. Mas não a única.)

Certo que estava que a arguição guardava premissa constitucional para um debate coerente de impacto real na sociedade, insisti em dialogar com dezenas de dirigentes do PT Nacional e de outros partidos do campo progressista. Mesmo que fosse uma tese derrotada, havia algo relevante: chamar à responsabilidade todos os membros do STF para um golpe que estava acontecendo sob os nossos (seus) narizes. E deixar que eles assumissem a ação ou omissão diante do grotesco da história. Porém, não houve ressonância.

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Retorno ao pano de fundo do começo deste texto: o PT não tem certeza da segurança jurídica, a partir do como o peso dos princípios e o jogo da hermenêutica se dará diante das dualidades de tantas normas, ou da criatividade jurisprudencial. Logo, o partido que teve a chance de indicar uma Corte completa no STF, dada a correlação de forças na política, a pressão e o lobby da superestrutura de poder, o gradiente dos membros do sistema de justiça do Brasil, um espaço ainda preponderantemente loteado por mentalidades, ora coloniais, ora neoliberais, ora elitistas e ora vaidosas (um rol de pecados capitais que se impregnam nos mármores dos tribunais brasileiros e tantas vezes nas decisões de certas cortes), não sabe o que esperar do Poder Judiciário. Embora não poderíamos esperar nada, mas nada mesmo, além de justiça, de equidade e, como nos ensina Ronald Dworkin quanto às normas, da única resposta correta ao fático normativo.

Isto posto, encerro o presente texto visitando a conjuntura que se avizinha na formatação da história, a saber, a escolha do próximo ministro para ocupar a cadeira do melhor juiz que existe atualmente no STF: o Ricardo Lewandowski. Ora, se o PT não pôde confiar no sistema de justiça nos momentos mais embaraçosos da história, porque não aproveita a oportunidade para incluir um quadro fenomenalmente técnico, com notório saber jurídico e reputação ilibada, contudo, do próprio PT? Quantos professores do Direito o PT possui em suas fileiras? Gente que tem compromisso com a luta das trabalhadoras e trabalhadores do Brasil. Cito dois, dentre tantos: o José Eduardo Cardozo, ex-deputado ex-ministro da Justiça; o Luiz Eduardo Greenhalgh, que também foi deputado federal; e o Tarso Genro, um jurista que ocupou dezenas de cargos políticos [4]. 

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Embora o fato de terem sido políticos de mandato não deva ser um (anti)critério para impedimento de alguém chegar à Corte Suprema (vide o caso mais recente de dois gigantes ex-presidentes do Supremo que também foram senador e deputado federal, respectivamente, Maurício Corrêa e Nelson Jobim), não gostaria de encerrar este texto concentrando forças em nomes. Nos dois textos anteriores a este respeito, publiquei a ideia de que não devemos nos preocupar com personalidades, todavia, com o conceito. Seja o escolhido pelo Presidente Lula, um grande jurista do PT, ou apartidário, o que importará mesmo é saber se a história desta pessoa reúne algumas lutas em defesa de ao menos 4 dimensões fundamentais: i) os direitos humanos; ii) a cidadania; iii) a democracia; e iv) a emancipação dos sujeitos. Qualquer decisão de um ministro do STF, repito: qualquer voto de Sua Excelência que coloque na “balança” da Justiça estes quatro critérios, este ministro ou ministra fará a tão esperada revolução no sistema de justiça do Brasil.[5]

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[1] É fundamental deixar claro quatro coisas aqui: i) não estamos pedindo que Poder Judiciário sirva o partido “A”, ou o partido “B”. Não é ao PT que o STF deve servir; mas o inverso é real: também não faz sentido a Justiça brasileira perseguir tanto o PT; ii) o PT tem mostrado em tantos anos no Poder o quanto respeita a República, a Democracia, o Estado de Direito, logo, o Poder Judiciário; e iii) o PT é um partido com alinhamento às premissas do socialismo e o socialismo apela a um modelo de Justiça emancipatória e para os pobres, portanto, faz todo sentido que o PT deseje, ao menos deseje, indicar alguém com notório saber jurídico, mas com uma vivência no direito alternativo; e iv) por mais que só exista “uma resposta correta” para a validade da norma, quando se pensa num colegiado (como é o STF), se pensa em visão prismática para dialética das ideias e finalmente, a consolidação dos efeitos desta ambiência democrática, logo, um Pleno do STF precisa da visão liberal, tanto quanto precisa da visão crítico-emancipatória.

[2] O PDF completo da ação judicial que o PT de Cidade Ocidental propôs ao STF você encontra neste link: https://xapuri.info/quatro-anos-do-golpe-de-2016-um-documento-para-a-historia/.
[3] Para acessar mais detalhes do MS 34.196, clique em: https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4979801. E para o download da decisão do ministro Barroso, em:  https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=309477667&ext=.pdf.

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[4] Dois destes que citei (apenas para simular o debate) não podem mais ir para o STF, pois estão na órbita dos 75 anos de idade, um dos limitadores para esta indicação. Contudo, existem dezenas de “anônimos” juristas que são políticos “de rua”, ou seja, da luta histórica pelos direitos dos espoliados, e que merecem uma chance de cuidar (da justiça) dos que sofrem.

[5] Exige-se tanto ministros mais “garantistas”, ou “legalistas” no STF. Isso é relevante. Contudo, tão mais importante é termos ministros “decolonialistas” (peço licença para usar esse neologismo bem pouco simpático). Destarte, o que desejo mesmo é afirmar que a opção pela centralidade do respeito aos direitos humanos e outros eixos que vimos apresentando, busca convocar um sistema de justiça decolonial.

Ademais, sobre membros do STF mais Garantistas, ou mais Legalistas, veja em: https://www.conjur.com.br/2020-ago-11/mapa-tendencias-juridicas-ministros-supremo.

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