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Marcelo Gruman

Doutor em Antropologia Social (MN/UFRJ); especialista em Gestão de Políticas Públicas de Cultura (UnB); atualmente é administrador cultural da Funarte/MinC

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Os judeus e a degustação de orelhas

Costuma-se comer um doce típico conhecido popularmente como “orelha de Haman”, triangular, recheado de uva preta, geleia, doce de frutas ou sementes de papoula entre judeus. A mitologia dá conta de que o nome do doce vem do antigo costume de cortar a orelha de quem seria enforcado, daí, as tradicionais, deliciosas e canibalescas “orelhas de Haman”

Os judeus e a degustação de orelhas
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Conta a História que há muitos e muitos anos um sujeito chamado Assuero subiu ao trono da Pérsia, cujo império se estendia das Índias até a Etiópia, dominando, nada mais, nada menos, do que cento e vinte e sete províncias. Ele governava com mão de ferro e não hesitava em perseguir suspeitos de traição. Cruel, mandou matar sua mulher, Vashti, por desobediência. Após este feminicídio, talvez um dos primeiros de que se tenha notícia, mensageiros reais foram enviados a todo o reino em busca de uma substituta mais “adequada”, de preferência, bela, recatada e do lar. Dentre elas, uma órfã judia chamada Ester, que foi coroada a nova rainha.

A rainha Ester tinha um pai adotivo, seu primo, chamado Mordecai, que foi nomeado conselheiro do rei. Mordecai se recusava a prostrar-se diante de Haman, o malvado Primeiro-Ministro do Reino, que ostentava no peito a imagem do deus pagão que adorava. Indignado com o que considerava petulância, insolência e humilhação, Haman passou a conspirar contra os judeus, imaginando a melhor forma de exterminá-los. Não perdeu tempo em elaborar uma longa lista de falsas acusações e difamações, afirmando que eram um povo isolado, que vivia, comia e bebia entre si, que se recusava a integrar-se ao resto da população, eram preguiçosos e subdesenvolvidos, constantemente observando “dias de descanso”, versão bíblica do nosso Macunaíma. O Rei Assuero caiu no “conto do vigário” e deu carta branca a Haman para fazer o que bem entendesse com os traidores da nacionalidade persa.
 
Haman convocou os escribas reais, ordenando-lhes o envio de dois decretos a todas as províncias. O primeiro ordenava a todos os governadores que fornecessem armas ao povo para que, num determinado dia, massacrasse certo grupo que em nada contribuía para o engrandecimento da nação. O segundo indicava o nome do nefasto grupo, mas os governadores só tinham permissão de abrir o envelope lacrado no dia mesmo da matança. A ordem indicava, de forma clara e inequívoca, que os verdadeiros persas, de sangue, deviam atacar e matar todos os judeus possíveis e imagináveis, jovens e velhos, homens, mulheres e crianças.
 
Por sorte dos judeus, o profeta Eliahu apareceu nos sonhos de Mordecai, revelando-lhe a má-sorte que estava por vir. Então, o conselheiro real pediu à sua filha adotiva, a rainha, que intercedesse junto ao rei, revelando-lhe, finalmente, sua identidade judaica. Ester assim o fez e Assuero, perplexo com a revelação do “inimigo interno”, ordenou imediatamente que Haman fosse morto na forca que, ironicamente, o Primeiro-Ministro havia mandado construir para Mordecai, o insolente. “Que Haman seja enforcado!”, ordenou Vossa Majestade.
 
Mas e os decretos reais, dando aval para o extermínio dos judeus em todo o reino persa? Não havia possibilidade legal de anulação de ordens já promulgadas, mas finalmente uma solução foi encontrada. Um novo decreto foi publicado, avisando que Haman havia abusado da confiança do rei, ordenando a morte de cidadãos leais, “cidadãos de bem”, em termos contemporâneos, permitindo que os judeus, no dia marcado para o massacre, se defendessem da forma como fosse possível. Então, na data fatídica, os “filhos de Abrão” reuniram-se nas praças públicas de cada cidade e vilarejo e condenaram à morte, reza a lenda, setenta e cinco mil inimigos.
 
As boas novas foram transmitidas a Ester pela boca do próprio marido, mas ela, sedenta de sangue e vingança, ainda não estava satisfeita:
 
“Existe ainda, em Shushan, numerosos e temíveis inimigos que não cessaram suas atividades e que devem ser exterminados se o país quiser vivem em paz. Se o rei achar correto, o dia de amanhã será dedicado a julgar, em Shushan, os últimos inimigos dos judeus, pois eles são, ao mesmo tempo, os inimigos da humanidade. E é preciso igualmente pendurar os corpos sem vida dos filhos de Haman”.
 
E assim foi feito.
 
Hoje, celebra-se a festa de Purim, em homenagem à rainha Ester. O relato da saga dos judeus persas é lido e, toda vez que o nome de Haman é pronunciado, os convivas devem fazer barulho. O nome “Purim” vem da palavra hebraica “Pur”, que significa sorteio, método usado por Haman na escolha da data para colocar em prática seu plano maquiavélico. Costuma-se comer um doce típico conhecido popularmente como “orelha de Haman”, triangular, recheado de uva preta, geleia, doce de frutas ou sementes de papoula. A mitologia dá conta de que o nome do doce vem do antigo costume de cortar a orelha de quem seria enforcado, daí, as tradicionais, deliciosas e canibalescas “orelhas de Haman”.
 
Que Evander Holyfield não nos ouça, mas uma orelhinha, de vez em quando, é uma delícia...

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