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André Del Negri

Constitucionalista, professor da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS).

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Ruído da charge

De pronto, a charge de Aroeira ficou sujeita a moralismos e reclames de grupos conservadores. Agem, desta forma, como um tribunal particular e inapelável. Fato é que a charge é apenas uma liberdade artística, uma das dimensões da liberdade de expressão, que é um dos atributos da democracia

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O ministro da Justiça, André Mendonça, pediu abertura de inquérito para investigar a charge de Renato Aroeira. O problema da charge, para o ministro da Justiça, é que ela associa o presidente Bolsonaro ao nazismo. Por essa razão, o pedido de investigação, em tese, baseia-se na lei dos crimes contra a segurança nacional, a ordem política e social.

Há situações em que as coisas precisam ser esclarecidas. Notem: na ilustração feita por Renato Aroeira, o presidente aparece com uma lata de tinta e um pincel acrescentando traços às extremidades da cruz vermelha, que simboliza hospitais, transformando-a, assim, em uma suástica (aqui). 

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A charge provoca reações. Essa é a capacidade de uma charge: transgredir. Mas, por evidente, uma charge não nasce por via simples. Há vários elementos incitadores. Artistas sabem de coisas. Vamos ver.

Olhem para a charge novamente e vocês verão uma incrível habilidade de Aroeira registrar teor crítico. Vê-se na imagem as expressões “crime continuado” e “bora invadir outro?”, esta última frase ligada ao fato de o presidente estimular população a invadir hospitais para filmar oferta de leitos (ver aqui). Se há indecência na história a culpa não é do Aroeira. 

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Outro “gatilho” que fez disparar a charge, remete ao passado. Em 6 de abril de 2011, Jair Bolsonaro, então deputado federal, foi retratado como nazista, ou seja: num cartaz exibido por manifestantes durante protesto na Câmara, uma foto do deputado expunha um bigode de Hitler. Em resposta, Bolsonaro declarou ao portal G1 que não ficou ofendido: “Ficaria bravo se tivesse brinquinho, batom na boca e eles usassem isso em uma passeata gay” (ver aqui). 

A palavra “charge”, de origem francesa, significa “carga”, ou seja: traços carregados de alguém ou de algo a fim de torná-lo jocoso, caricato, burlesco. E tal se terá nos chargistas uma intensa “carga” crítica, por meio de traços exuberantes. E dessa forma as charges trazem à tona algumas intranquilidades. Como tal, os chargistas seguem “inventado” suas histórias, mas, na verdade, recriam a História, falas ou entrevistas de personalidades.

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Afinal de contas, a charge é um gênero jornalístico, em que o artista se utiliza da imagem para expressar à coletividade algo sobre política, futebol, corrupção, crise dos hospitais ou até a inépcia de governantes para gerenciar a pandemia. 

De pronto, a charge de Aroeira ficou sujeita a moralismos e reclames de grupos conservadores. Agem, desta forma, como um tribunal particular e inapelável. Fato é que a charge é apenas uma liberdade artística, uma das dimensões da liberdade de expressão (art. 5º, IX, CF/88), que é um dos atributos da democracia.

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A função da charge, que fique claro, não é agradar o senso estético e moral de todos – o que é humanamente impossível –, mas sim causar uma reação (uma reflexão!) nas pessoas. Talvez agora conseguimos entender melhor o que disse o velho Ernest Hemingway, com o seu “write hard and clear about what hurts” [escreva duro e claro sobre o que dói].

Cuidamos para que o governo não saia por aí interpelando qualquer coisa esculpida, pintada ou escrita, cantada ou interpretada. 

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As charges podem oferecer debates, sim. Censura, não. 

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