"Zé, cadê o Geraldo?"
A história que vou contar aconteceu no verão de 2010 em Itapira, não me lembro a data, mas sei que foi em janeiro.
Eu acabara de chegar ao escritório, não havia sequer degustado o meu cafezinho preparado pela Dona Amélia, quando recebi um telefonema do Luiz Lauro Filho, não foi uma surpresa, pois, gostávamos muito do Luizinho e nos dávamos muito bem com toda sua família.
Essa benquerença tem uma razão bem bacana.
O pai do Luizinho, o ex-deputado estadual Luiz Lauro, contou que tinha muito carinho pelo meu sogro; ele nos contou isso em 1992, quando concorremos ao Palácio dos Jequitibás, numa eleição vencida pelo tucano Magalhães Teixeira.
Meu sogro, Pedro Carmona, foi um prospero comerciante em Campinas e, segundo o próprio Luiz Lauro, nunca o deixou na mão, pois, “fazia sempre propaganda na rádio, até quando não precisava, só para ajudar”; esse carinho pelo meu sogro, tornou Luiz Lauro, Iara e filhos, pessoas queridas para todos nós lá em casa, especialmente para a Celinha.
Nossas famílias não são íntimas, mas o carinho e a relação fraterna são genuínos.
Bem, voltemos ao telefonema.
O Luizinho me ligou em nome do Gustavo Reis, prefeito de Jaguariúna, e me convidou para ir a Itapira com eles, haveria um evento especial: o presidente Lula, no auge da sua popularidade, estaria nossa região para inaugurar a Fábrica do Laboratório Cristália em Itapira.
O jovem Luiz Lauro havia dado início à sua breve e exitosa carreira política, era suplente de vereador em Campinas, estava empolgado; passou no escritório e fomos a Jaguariúna buscar o Gustavo; de lá seguimos para lá.
Chegando à Cristália, uma empresa enorme, o prefeito de Itapira, Toninho Bellini, nos recebeu e encaminhou para a fila de autoridades (Luizinho e eu nos entreolhamos, rimos, afinal, o que fazíamos na “fila de autoridades”?)
Tinha muita gente importante lá.
Além de Lula, a “estrela da companhia”, estavam lá o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, o governador José Serra, o senador Eduardo Suplicy, o secretário estadual de Saúde, Luiz Roberto Barradas Barata, prefeitos da região e autoridades políticas de segmentos diversos; dentre as autoridades estava Geraldo Alckimin, então Secretário estadual de Desenvolvimento do estado; Alckmin perdera as eleições presidenciais de 2006 e à prefeitura da capital em 2008. Ambientes com “gente importante” pastoreando “gente mais importante ainda”, podem ser perigosos e tóxicos, por essa razão lancei mão do meu “superpoder de invisibilidade”, me afastei e me posicionei atrás dos fotógrafos, longe do Lula e do Serra e passei a ter uma visão privilegiada do pastoreio.
Passados alguns instantes olhei do meu lado e lá estava Geraldo Alckmin. Discreto, silencioso e, igualmente, desejando a invisibilidade; me apresentei e conversamos um pouco; falamos sobre Campinas e sobre os meus amigos tucanos campineiros: um deputado e Biléo Soares - na época o deputado ainda era meu amigo, não é mais. Alckmin elogiou a bondade e lealdade de Biléo, mas silenciou sobre o deputado neobolsonarista.
Após o constrangedor pastoreio, as autoridades dirigiram-se ao palanque e começaram os discursos.
O prefeito Toninho Bellini destacou o empreendedorismo e pioneirismo do Laboratório Cristália, ressaltou o investimento feito pela empresa e lembrou ainda que a visita de Lula à cidade foi primeira de um presidente da república.
Serra, sempre asséptico, também discursou, mas o show ficou com Lula que registrou seu respeito ao capitão da Copa de 1958, Hideraldo Luiz Bellini, tio do prefeito, e lembrou que já havia visitado Itapira, em 1982, candidato a governador e em 1986, então candidato a deputado federal constituinte.
Lula discursava entusiasmado sobre a importância dos investimentos em ciência e tecnologia, e, de repente ele parou de falar, olhou para as autoridades que estavam no palanque, parecia procurar alguém; e perguntou em tom de severidade: “Zé, cadê o Geraldo?”.
Enquanto Serra fazia uma cara de desajeitado, Lula avistou Alckmin que estava comigo e com Luizinho, o “convocou” ao palanque, acomodou o ex-governador ao seu lado e fez elogios rasgados ao então secretário estadual e ralhou com José Serra e com os organizadores pela indelicadeza.
Será que Lula, além de tudo, tem algum dom especial, por inspiração divina, de predizer o futuro?
Fato é que, passados doze anos desse fato, Lula e Alckmin lideraram a chapa que afastou do Planalto a incivilidade tóxica e lideram um processo de transição que haverá de levar o país a um novo pacto político.
Essa é a história de hoje.
e.t. após os discursos a diretoria da empresa ofereceu um almoço às autoridades presentes, Luizinho e eu, duas “não-autoridades”, participavam do almoço quando um militar veio até mim e, a pedido do Lula, me convidou para fazer a refeição ao seu lado. Lula sempre é generoso comigo, com certeza em razão da minha relação com Jacó Bittar.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

