"Genocídio não é sinônimo de Holocausto": Michel Gherman explica porque considerou desastrada a fala de Lula
Apesar de discordar de Lula, o historiador vê possibilidades de o presidente brasileiro sair mais fortalecido do episódio e projeta queda de Netanyahu 'antes do esperado'. Assista
247 - O professor Michel Gherman, um dos principais estudiosos da questão judaica no Brasil, classificou como "desastrada" a declaração do presidente Lula em que o chefe de Estado brasileiro comparou o genocídio promovido por Israel na Faixa de Gaza ao Holocausto.
Em entrevista ao programa Boa Noite 247 nesta segunda-feira (19), o historiador afirmou que ambos os casos se tratam de genocídios, mas que, ao analisar cada caso tecnicamente, eles possuem diferenças estruturais. "Eu acho que a palavra genocídio não é um sinônimo de Holocausto. [...] Eu acho ruim qualquer palavra que denomine um genocídio específico, porque os genocídios são produzidos por seus algozes, e não por suas vítimas. O genocídio nazista, o genocídio de Ruanda, o genocídio dos sérvios... eu acho que isso é importante para perdermos a noção de vincular o genocídio a suas vítimas [como no caso do Holocausto]", disse.
"Gaza produz a noção de um genocídio típico dos genocídios do pós-guerra. É muito parecido com Ruanda, por exemplo, porque tem uma suposta lógica de 'resposta', de utilização da ideia de que as vítimas são responsáveis pelo ataque, de limpeza étnica... já o genocídio dos nazistas na década de 30 e 40 não tem nada a ver com isso, é outra coisa. Não estou dizendo que é melhor ou pior, mas é outra coisa. O nazismo foi um genocídio ideologicamente construído. Ele começou na década de 30 quando Hitler começou a matar pessoas com deficiência, é outra história [em relação ao visto atualmente no Oriente Médio]. O uso político do Holocausto ou de Hitler para falar sobre Gaza enfraquece a narrativa do presidente Lula e fortalece a extrema direita", afirmou o professor.
LULA PODE SAIR FORTALECIDO - Apesar de discordar da fala de Lula, Gherman ainda vê possibilidades de o presidente brasileiro sair mais fortalecido após o episódio - que considerou uma armadilha. "O presidente Lula tem um potencial de produzir uma categoria que é pouco reconhecida, mas que o Lula faz isso de maneira sublime, que é a categoria 'paz'. Lula fala sobre paz e passa a fazer sentido. Então, quando ele condena o atentado terrorista do Hamas, ele faz isso porque não quer que as crianças israelenses sejam mortas, da mesma maneira que não quer que as crianças palestinas sejam mortas. E é por isso mesmo que uma fala como a dele prejudica não o Brasil ou os judeus brasileiros, é uma fala que tira o Lula desse lugar [de promover a paz], é uma fala que prejudica ele", avaliou o historiador.
"Mas, ao mesmo tempo, tem uma possibilidade concreta de que o Lula saia maior do que entrou. Porque ele pode sair de um lugar e ir para outro, ele pode dizer que a comparação e o uso da palavra [Hitler] foram um equívoco e pedir desculpas. E aí ele pode voltar para esse local de absoluto privilégio em termos de possibilidade de mobilização de lideranças. Esse governo [Netanyahu] já vai cair, e vai cair mais cedo do que a gente imagina. E quem vai subir no lugar vai esquecer de qualquer coisa que Netanyahu tenha produzido em relação ao Lula", concluiu o professor. Assista à entrevista completa no vídeo abaixo:
