Augusto Heleno descuidou da própria biografia. Restou o passivo para Tomás Paiva
Comandante do Exército, Tomás Paiva, tem feito um esforço para livrá-lo da condição de preso em regime fechado
O general Augusto Heleno não parecia se preocupar com a sua biografia. Talvez, confiando na trajetória de ter sido sempre o primeiro aluno, por onde quer que tenha passado na carreira militar. No Exército dá-se a isso o nome tríplice coroa, por ter recebido medalha de primeiro aluno nas três escolas de formação por onde passou. Ao longo da carreira, era do tipo que costumava atravessar a rua para se abraçar com uma polêmica. Foi assim, quando serviu no gabinete do general Sylvio Frota, e o apoiou quando esteve pronto para dar um golpe no general Geisel, quando este iniciou o processo de abertura (lentíssima e gradual), no final da ditadura.
Também a sua saída do Haiti, onde coordenou os brasileiros nas Forças de Paz, da ONU, (MINUSTAH) não foi o que poderíamos chamar de “tranquila”. Deixou atrás de si um processo que corre sob sigilo, e diz respeito ao episódio conhecido como “o massacre de Cité Soleil (fala-se em dezenas de civis mortos em operação em uma comunidade).
Foi o general Heleno quem comandou a “Operação Punho de Ferro” (do inglês: Operation Iron Fist). A ação dos capacetes azuis da MINUSTAH liderada pelo general brasileiro, ocorreu em 6 de julho de 2005 em Bois Neuf, partição da Cité Soleil, a maior favela do Haiti. Pelo desastre, ele foi chamado de volta pelo governo brasileiro. Seu substituto, o também general Urano Teixeira da Matta Bacellar chegou animado, falando em satisfação pela honra do novo cargo, e uma semana depois apareceu morto, no hotel onde estava hospedado. Suicídio.
No governo anterior, desempenhou o cargo do chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, pelo qual ficava sob sua responsabilidade supervisionar os aviões que serviam à presidência. Em uma das viagens, o piloto de um deles acabou preso e condenado por tráfico de drogas. Uma inspeção no aeroporto da Espanha encontrou 39 quilos de cocaína no avião de apoio ao que servia o presidente. Heleno nunca explicou o “incidente”.
Por fim, acabou condenado a uma pena de 21 anos por conspirar e tentar impedir a posse do governo vitorioso nas urnas na eleição de 2022, ou seja: golpe de estado.
Fica claro, diante desse “currículo”, o seu total desapreço pela própria biografia. Agiu como se não houvesse amanhã, ou como se a farda fosse uma armadura inquebrantável que o protegesse contra tudo e contra todos. Até mesmo das sanções previstas na Constituição que como oficial do Exército Brasileiro, jurou servir.
Toda essa reconstituição da longa jornada de Augusto Heleno, hoje com 78 anos, é por conta do esforço que o comandante do Exército, Tomás Paiva, tem feito, para livrá-lo da condição de preso em regime fechado, no Comando Militar do Planalto.
Além de visitá-lo na prisão, para verificar as condições em que ele e o general e ex-comandante, Paulo Sérgio Oliveira estão apenados, Paiva reuniu-se com o ministro Alexandre de Moraes dias antes da efetivação da prisão dos generais, a fim de pedir a não espetacularização da prisão. Solicitou também que não fossem algemados e que a condução fosse feita como manda os preceitos militares – por um oficial de igual patente ou acima, o que no caso deles foi feita por dois generais – e sem acompanhamento da mídia. Na semana passada, voltou a se avistar com o ministro, dessa vez para solicitar um novo exame de saúde em Heleno, a fim de se avaliar a transferência para uma prisão domiciliar.
Toda a recente valentia do general, que deu soco na mesa e esbravejou que precisavam agir logo, antes que Lula fosse eleito e aí não haveria “VAR” que desse jeito, desapareceu. Aquele general que, perguntado se Lula subiria a rampa disse um NÃO em bold corpo 38, desmoronou e agora pede proteção e clemência. Esqueceu-se de que o tempo passa para todos, que o corpo cobra o preço do avançar dos anos e que o poder é efêmero. Principalmente para os que dele abusam.
Resta-nos agora ler manchetes como a publicada pela CNN: “Comandante do Exército entra em cena, conversa com Moraes e prisão domiciliar de Augusto Heleno se aproxima”. Desnecessário repetir aqui a frase de para-choque de caminhão: “eles também envelhecem”.
Na matéria abaixo da manchete lê-se: “O Comandante do Exército, General Tomás Miguel Miné Ribeiro Paiva, se reuniu pessoalmente com o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes e mostrou preocupação com as condições de saúde do general da reserva Augusto Heleno, condenado a 21 anos de prisão por tentativa de golpe de Estado”. Gesto nobre o do comandante, que antes mesmo da condenação, pelo que se sabe, tentou livrar o “três coroas” da prisão. Debalde. O general Augusto Heleno não cuidou da própria biografia, como disse acima. Restou o passivo para Tomás Paiva, hoje às voltas com a tentativa de uma domiciliar. O tempo é mesmo o senhor da razão.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.




