Joesley e Esteves: negociadores informais
Empresários retornam ao centro do poder ao atuar como pontes informais entre o Brasil, os Estados Unidos e a América do Sul
A história recente do capitalismo brasileiro pode ser contada por meio de dois sobrenomes: Batista e Esteves. Joesley Batista, controlador da J&F, e André Esteves, fundador do BTG Pactual, protagonizaram quedas espetaculares na década passada — em episódios associados à Lava Jato — e, menos de dez anos depois, voltaram ao centro do tabuleiro no governo Lula 3.
Joesley reassumiu o controle estratégico de um grupo que nunca deixou de gerar caixa. A JBS, seu principal ativo, atravessou crises e acordos de leniência preservando escala global e acesso a capital. Em 2017, Joesley firmou um acordo de delação premiada com o Ministério Público no âmbito da investigação da Lava Jato. As delações não desmantelaram o império; apenas formalizaram sua reorganização. Hoje, Joesley segue publicamente ativo e exerce influência direta sobre as decisões estratégicas centrais da J&F. André Esteves seguiu um caminho distinto, com destino semelhante. Após ser afastado do mercado financeiro em 2015, retornou gradualmente ao centro do BTG Pactual, que se consolidou como um dos principais hubs de estruturação financeira e de infraestrutura do país. O banco saiu maior e mais visível em governança, sem alterar seu perfil de risco calculado e sua capacidade de articulação.
Nas últimas semanas, ambos passaram a ocupar um espaço que extrapola os negócios: o da diplomacia informal. Não a exercida por instituições como o Itamaraty, mas uma diplomacia personalista, baseada em redes de relacionamento e interesses econômicos — comum, ainda que pouco explicitada, em democracias maduras. A diplomacia exercida por empresários não é novidade no Brasil — desde o Visconde de Mauá, capital e Estado frequentemente dividiram o mesmo balcão. Joesley teria conversado com Donald Trump sobre o tarifaço imposto ao Brasil e viajado à Venezuela para tentar convencer Nicolás Maduro a deixar o poder, segundo a Bloomberg. Já André Esteves teria dialogado com o secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Scott Bessent, sobre as tarifas e sobre as sanções da Lei Magnitsky contra autoridades brasileiras, incluindo o presidente do STF, Alexandre de Moraes, segundo noticiou a Folha de S.Paulo. Dias depois dos encontros, tarifas e sanções foram suspensas pelo governo Trump.
Para o Brasil, esse tipo de atuação tem efeitos práticos. Em momentos de tensão política, choques externos ou ruído institucional, interlocutores capazes de dialogar com governos relevantes ajudam a reduzir assimetrias de informação, conter escaladas desnecessárias e proteger fluxos de comércio, crédito e investimento. Não substituem o Estado nem autorizam confundir interlocução com captura das estruturas de poder.
Esse tipo de interlocução não é uma anomalia brasileira nem um desvio institucional em si. Em sistemas institucionais estabelecidos, canais informais entre governos e lideranças empresariais costumam operar como complemento à diplomacia oficial, sobretudo em contextos de crise econômica, sanções ou disputas comerciais. O risco surge quando a mediação se confunde com privilégio. Quando atua para reduzir ruído, destravar diálogo e mitigar danos sistêmicos, a política — mesmo fora dos ritos formais — cumpre uma função que não pode ser automaticamente criminalizada.
O modelo, contudo, tem um custo ainda não revelado. Não se conhecem os termos, os limites nem as eventuais contrapartidas dessas conversas — se econômicas, políticas ou estratégicas. O mercado observa os efeitos; os detalhes permanecem nos bastidores típicos das negociações de alto nível. No ambiente internacional, não se exige santidade. Exige-se previsibilidade. Batista e Esteves sobreviveram porque continuam capazes de reduzir a volatilidade quando o risco ameaça transbordar para a economia real. Nem todos os métodos são conhecidos. O sistema, ao que tudo indica, considera até aqui o resultado suficiente.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.




