O julgamento histórico: Pelo fim da impunidade e a reafirmação da democracia
A história nos dá uma lição amarga que não podemos ignorar
A fala do ministro Barroso, presidente do STF, na véspera do julgamento de Jair Bolsonaro, não é uma mera opinião. É um diagnóstico preciso do momento histórico que vivemos. Ele aponta para a possibilidade real de enterrarmos um ciclo nefasto de extremismo e violência política. Como parlamentar de esquerda, eleito pelo povo do Distrito Federal – palco físico de tantos desses crimes, vejo este julgamento como um imperativo categórico para a saúde da nossa jovem e ainda frágil democracia. Não se trata de vingança, mas de justiça e, acima de tudo, de prevenção.
A trama golpista que será analisada pela Primeira Turma do STF não foi um evento isolado ou espontâneo. Ela foi meticulosamente arquitetada, como um filme de terror que assistimos em câmera lenta. As cenas são de partir o coração: tanques do Exército posicionados de forma intimidatória na Esplanada, supostamente para um "treinamento", mas na realidade, enviando uma mensagem clara de força e insubordinação ao Estado Democrático de Direito. A fumaça que liberaram não era apenas poluição; era o cheiro do autoritarismo tentando sufocar nossas instituições.
O ataque à democracia, porém, escalou rapidamente para a barbárie. O dia 12 de dezembro foi um ensaio do caos, com terroristas antidemocráticos incendiando Brasília, aterrorizando a população e tentando impedir a diplomação do presidente legitimamente eleito. Mas o ápice da insanidade criminosa veio no Natal de 2022. A descoberta de um caminhão-bomba com 66 mil litros de combustível próximo ao Aeroporto de Brasília não foi um acidente; foi uma tentativa de assassinato em massa. A explosão daquele artefato, articulada com ataques à rede elétrica, teria causado uma catástrofe de proporções inimagináveis, matando centenas, talvez milhares, de famílias brasilienses que se preparavam para celebrar a vida.
O episódio do 8 de janeiro foi a materialização final desse projeto de ruptura. O Palácio do Planalto, o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal, símbolos máximos do poder executivo, legislativo e judiciário, foram violados, depredados e profanados por hordas incentivadas e financiadas pelo próprio chefe da nação na época. Bolsonaro não era um espectador distante; as evidências apontam para um arquiteto da desordem, que tramou a partir do Palácio da Alvorada a subversão da vontade popular.
Aqui, a história nos dá uma lição amarga que não podemos ignorar. A leniência com os golpistas do passado, como na anistia concedida após a frustrada Revolta de Jacareacanga (1956) e a Revolta de Aragarças (1959), apenas alimentou a sanha autoritária que culminou no Golpe de 1964. A impunidade é o combustível do autoritarismo. Os fantasmas de Wladimir Herzog, Rubens Paiva, e dos desaparecidos como Honestino Guimarães, torturados e mortos por um estado terrorista comandado por carrascos como o coronel Ustra, clamam por justiça da história. Não podemos, por ação ou omissão, permitir que novos golpistas se sintam encorajados a repetir esse caminho.
Portanto, o julgamento que se inicia não é sobre um homem apenas; é sobre um projeto político que busca corroer as bases da convivência democrática. A condenação de Bolsonaro e de todos os seus principais comandados militares e civis não é uma opção, mas uma necessidade vital. A punição exemplar é o único antídoto contra a repetição de crimes tão graves. É a mensagem clara de que no Brasil, quem tenta destruir a democracia e tramar assassinatos em massa responderá perante a lei.
Por fim, este momento transcende as fronteiras nacionais. O mundo observa como o Brasil, uma das maiores democracias do planeta, lidará com essa tentativa brutal de golpe. Uma justiça forte e imparcial, que responsabilize os poderosos, servirá de farol para outras nações que também enfrentam a ameaça do extremismo de direita. É nossa obrigação histórica empurrar o extremismo para a margem da história, como bem disse Barroso, e reafirmar, com força e convicção, que o lugar do povo brasileiro é sempre no lado da liberdade, da democracia e da justiça social. O futuro agradecerá.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.



