República constrangida por ministro e banco
Se Alexandre de Moraes falou com Galípolo em defesa ligada a Vorcaro, o STF deve esclarecer fatos, datas, conteúdos e fundamentos, sem reservas
A democracia brasileira não pode ser defendida com uma mão e corroída com a outra. Esse é o ponto sensível — e explosivo — que emerge quando se cruzam três elementos: o colapso fraudulento do Banco Master, a atuação institucional do Alexandre de Moraes e as relações financeiras que orbitavam o núcleo familiar do ministro.
Reportagens recentes trouxeram à tona que a esposa de Moraes manteve contrato profissional com o Banco Master, em valores que, segundo as informações divulgadas, chegariam a R$ 3,6 milhões mensais. Trata-se de um dado que, por si só, já exige explicações públicas robustas, transparência documental e apuração independente. Não se fala aqui de vínculo lateral ou irrelevante, mas de cifras absolutamente fora do padrão médio do mercado jurídico brasileiro.
Esse dado ganha densidade institucional quando inserido no contexto do colapso do banco. O Master foi liquidado após a revelação de operações sem lastro, práticas de gestão temerária e indícios de fraude sistêmica que ultrapassam R$ 12 bilhões, com envolvimento direto de seu controlador, Daniel Vorcaro. O dano não foi abstrato: atingiu o sistema financeiro, investidores, o BRB – Banco de Brasília e, por extensão, o interesse público.
É nesse cenário que surgem informações sobre quatro contatos que teriam sido feitos pelo ministro Alexandre de Moraes com Gabriel Galípolo, presidente do Banco Central do Brasil, em meio à crise do Master. Se confirmada a finalidade desses contatos — interceder institucionalmente em favor de Vorcaro ou do banco — o debate deixa imediatamente o campo da controvérsia política e entra no núcleo duro do tráfico de influência.
Aqui não há espaço para relativismo
Ministros do Supremo Tribunal Federal não são atores neutros quando falam com presidentes de autarquias reguladoras. A assimetria de poder é absoluta. A palavra de um ministro não é “opinião”; é pressão institucional implícita. E quando essa pressão ocorre num ambiente onde há interesse econômico direto envolvendo membro da família, o princípio da impessoalidade é ferido de forma frontal.
Não se trata de condenação prévia — trata-se de exigência republicana. Se os contatos ocorreram, se tinham finalidade de defesa privada, se coincidem temporalmente com contratos milionários familiares, então não estamos diante de ruído, mas de potencial captura institucional. Democracias morrem assim: não com tanques, mas com conversas reservadas, favores cruzados e silêncio cúmplice.
Alexandre de Moraes teve papel central na contenção de ataques à democracia. Isso é fato histórico. Mas ninguém acumula crédito moral para usar contra a lei. A mesma República que foi defendida exige agora escrutínio total, investigação profunda e resposta pública.
Se confirmada a interferência, não haverá paradoxo: haverá traição ao próprio Estado de Direito que se diz proteger. E isso, em qualquer democracia séria, não se relativiza — se pune.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.




