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Paulo Henrique Arantes

Jornalista há quase quatro décadas, é autor do livro "Retratos da Destruição: Flashes dos Anos em que Jair Bolsonaro Tentou Acabar com o Brasil". Editor da newsletter "Noticiário Comentado" (paulohenriquearantes.substack.com)

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Soltura de Vorcaro é garantismo penal, mas também injustiça social

A soltura de Daniel Vorcaro ilustra à perfeição a máxima de que a injustiça social faz-se presente, em altíssimo grau, no Judiciário

Daniel Vorcaro (Foto: Reprodução/YouTube/CNN Brasil Money)

Todos os argumentos garantistas já foram usados para justificar a revogação da prisão preventiva de Daniel Vorcaro pela desembargadora Solange Salgado da Silva, do Tribunal Federal da 1ª Região, em 28 de novembro. Os evoluídos entendemos que o processo penal não se deve calcar na detenção pura e simples e que existem outros meios de limitar e monitorar os movimentos de um investigado cujo comportamento sinalize intenção de fugir e poder de prejudicar a investigação. Ocorre que a Justiça brasileira adota dois pesos e duas medidas quando se trata de prisão preventiva.

Em 17 de novembro, a Polícia Federal prendeu Vorcaro no Aeroporto de Guarulhos quando ele se preparava para embarcar a bordo de um jatinho particular com destino a Dubai. A prisão foi decretada no âmbito da Operação Compliance Zero, que investiga as evidentes fraudes – as mesmas que a imprensa cheia de dedos prefere chamar de “supostas” – por ele operadas à testa do Banco Master. A PF também prendeu outros executivos do banco. A justificativa para a prisão incluía, segundo a acusação, risco à ordem econômica e possibilidade de obstrução das investigações, diante da gravidade dos indícios.

A decisão da desembargadora Solange baseia-se no argumento de que os crimes não envolvem violência ou grave ameaça à pessoa, e que não há “periculosidade acentuada ou risco atual à ordem pública” que justificasse a manutenção da prisão. Ora soltos, os executivos do Master, Vorcaro incluído, deverão usar tornozeleira eletrônica e cumprir medidas cautelares como não exercer atividades de gestão ou financeiras, não manter contato entre si e outras.

À luz do garantismo que deve reger o Direito, a revogação das prisões é correta. À luz da justiça que deveria abraçar os cidadãos de um país, é um escárnio. A soltura de Daniel Vorcaro ilustra à perfeição a máxima de que a injustiça social faz-se presente, em altíssimo grau, no Judiciário. Tanto como nas escolas, nos hospitais ou nas ruas.

Daniel Vorcado é bilionário e “bem relacionado”, contrata advogados capazes e bem situados estrategicamente, por isso e só por isso a desembargadora Solange livrou-o da preventiva. A decisão mostra a face seletiva e desigual da justiça criminal brasileira. O banqueiro é presumidamente inocente, mas nas mesmas condições cidadãos também presumidamente inocentes, em casos infinitamente menos graves, ficam presos preventivamente ad aeternum. Furtos de objetos de pequeno valor, crimes relacionados a uma vida miserável não recebem qualquer gesto sensível.

O Conselho Nacional de Justiça informa, em seu levantamento mais recente, haver no país 221.054 presos provisórios de um total de 654.372 detentos — cerca de 33,7% da população prisional. Paralelamente, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública indica que em 2023 havia 208.882 pessoas aguardando julgamento no sistema prisional — um em cada quatro presos. Por que Daniel Vorcaro não está entre eles?

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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