Telefonema de Lula para Trump mostra pragmatismo (e em tempos de avanço da extrema-direita na América Latina)
As atenções estão voltadas para as pressões bélicas contra a Venezuela e também para os rumos da Argentina, do Chile, da Colômbia, do Peru...
No continente americano, as atenções estão voltadas para as pressões dialéticas e bélicas de Donald Trump contra Nicolás Maduro. A Venezuela é um dos dez vizinhos do Brasil e possui uma das maiores reservas comprovadas de petróleo do planeta. E faz parte da região que voltou a estar no radar dos Estados Unidos desde o retorno de Trump à Casa Branca, em janeiro deste ano.
América do Sul: EUA e China
A América Latina e, especialmente a América do Sul, estão no foco por dois motivos estratégicos: suas riquezas naturais e a disputa dos EUA com a China. E ao mesmo tempo em que os imigrantes latino-americanos passaram a ser parte da agenda interna do governo norte-americano, com a prisão ou expulsão de muitos deles, elementos dos novos tempos, como o lítio, essencial para baterias e outros, são ainda mais cobiçados pelas duas maiores economias do mundo. O Chile, a Argentina e a Bolívia possuem as maiores reservas de lítio do mundo. E os três países estão na onda da direita.
Extrema-direita também no Chile?
No próximo dia 14 de dezembro, os chilenos irão às urnas para definir, no segundo turno da eleição presidencial, entre o candidato da extrema-direita José Antonio Kast, do Partido Republicano, e a candidata da esquerda ou centro-esquerda Jeannette Jara, do Partido Comunista. É a primeira vez em 25 anos que o PC do Chile tem candidato próprio ao Palácio presidencial La Moneda. Carismática, elogiada por seu trabalho como ministra do Trabalho do governo de Gabriel Boric, Jara tem tentado, porém, ser equilibrista para atrair os votos dos que não compartilham com as ideias de esquerda ou que rejeitam a administração de Boric.
“Arrumem suas coisas ou serão expulsos”, diz presidenciável chileno
Kast, por sua vez, radicalizou ainda mais seu discurso de extrema-direita nos últimos dias, dizendo, por exemplo, que os imigrantes ilegais “têm 103 dias para arrumar suas coisas ou serem expulsos do país”. A posse do novo presidente será em março do ano que vem, e, nesta segunda-feira (1), os governos do Chile e do Peru anunciaram que vão intensificar a patrulha contra imigrantes, numa rota que é usada principalmente por venezuelanos.
Quando estivemos em Santiago, para a cobertura do primeiro turno da eleição presidencial chilena, foi possível observar que a maioria dos motoristas de aplicativo, por exemplo, era da Venezuela e, nas conversas informais, alguns deles contaram à reportagem que são avessos aos governos de esquerda, mas que temiam pelo próprio destino caso Kast seja eleito.
Pesquisas e o pedido de “anulação” do voto
As últimas pesquisas de intenção de voto indicam que Kast seria eleito com vantagem de cerca de 20% dos votos em relação a sua opositora, Jara. No primeiro turno, os levantamentos acertaram, ao contrário do que ocorreu nas recentes eleições na Bolívia (para presidente) e na Argentina (legislativas). A esperança dos apoiadores de Jara são os indecisos e os que votaram, no primeiro turno, em Parisi, do Partido do Povo (Partido de la Gente, em espanhol), que ficou em terceiro lugar com quase 20% da votação. Ele, porém, pediu ao seu eleitorado que anule o voto no dia 14.
Boric
Se seu eleitorado for obediente, o Chile, com tradição de abstenção nas urnas (salvo desta vez pelo voto obrigatório, com inscrição automática no sistema eleitoral e multa de cerca de R$ 600 para os que não votarem) pode ter alto índice de voto nulo. No Chile o mandato presidencial é de quatro anos e sem reeleição consecutiva. Há especulações em Santiago de que Boric, de 39 anos de idade, por ser um político jovem, tentaria voltar ao La Moneda depois de 2029.
Kast, Milei e a rede da direita na região
Assim que saíram os resultados do primeiro turno da eleição no Chile, o argentino Javier Milei ligou para Kast para parabenizá-lo. Os dois se admiram mutuamente e têm em comum, além da admiração por Trump, a foto que tiraram, em ocasiões diferentes, com Bolsonaro no Brasil – muito antes de o ex-presidente começar a cumprir a sentença de 27 anos de prisão.
América do Sul à direita e a influência de Trump
Além de Milei, que pretende ser o elo de Trump na região, o tabuleiro da América do Sul está marcado, atualmente, por presidentes de direita e simpatizantes do presidente dos Estados Unidos. O paraguaio Santiago Peña, um dos poucos com quem Milei dialoga na região, e não quis perder a posse de Trump, o novo presidente da Bolívia, Rodrigo Paz, que realizou sua primeira viagem internacional aos EUA, após tomar posse, o equatoriano Daniel Noboa, que convocou e perdeu um plebiscito para permitir a instalação de bases militares estrangeiras (EUA) no país....
Ano novo será de eleições
Antes das eleições presidenciais no Brasil, nossos vizinhos, Peru e Colômbia, realizarão seus pleitos para eleger presidentes. Os peruanos votam em abril e os colombianos em maio (primeiro turno). Hoje, a Colômbia é governada por Gustavo Petro, primeiro presidente de esquerda do país, e que, quase todos os dias, condena os ataques bélicos do governo Trump no Caribe e no Pacífico, nas proximidades da Venezuela e da Colômbia e que já deixaram mais de 80 mortos, de acordo com a imprensa internacional. O Peru, por sua vez, tem mantido sua tradição de frequentes crises políticas com quedas sucessivas de presidentes. E assim chegará às urnas.
Venezuela, Rússia e China e BRICS
A Venezuela tem relações internacionais com a Rússia e a China, dois integrantes do BRICS. Nos últimos dias, os Estados Unidos passaram a contar com apoio de Trinidad Tobago e da República Dominicana (além de Porto Rico) em seu cerco bélico e geográfico contra Maduro. Os dois países, Trinidad Tobago e Dominicana, ofereceram suas águas e aeroportos para que as tropas dos EUA possam se deslocar mais perto ainda da Venezuela. Preocupante.
São tempos turbulentos na nossa região.
Lula e Scheinbaum
O Brasil é o maior país da América Latina, em termos econômicos, populacionais e territoriais. No atual mapa político e ideológico latino-americano, o Brasil, governado pelo presidente Lula, e o México, vizinho dos EUA, e a segunda maior economia da região, com Claudia Scheinbaum, são o diferencial à onda da extrema-direita regional. Scheinbaum, como Lula, é pragmática e, como uma equilibrista e apesar dos ‘protestos’ recentes que foram questionados diretamente por ela, como armação da direita que não a quer na Presidência, a líder mexicana mantém apoio popular e suas medidas de inclusão social. Ela mesma já teve seus embates públicos com Trump, mas acabou sendo também elogiada por ele.
O telefonema de Lula para Trump e...Bukele
Como observou um assessor de um organismo internacional em Washington, Trump “não pode estar de mal” com toda a América Latina e sabe a importância e peso do Brasil no cenário mundial. E, Lula, por sua vez, com seu pragmatismo, busca o equilíbrio para não prejudicar a economia e a nação brasileiras. Por isso, nesta terça-feira, já repercute nos bastidores da diplomacia estrangeira o telefonema de Lula para Trump para falar sobre as tarifas que ainda restam aos produtos brasileiros - impostas por Trump. E, segundo informação oficial, um dos assuntos que mobiliza e preocupa o continente é o combate ao crime organizado internacional. Porém, com viés que varia e muito segundo a linha ideológica dos que estão (ou pretendem estar) na Presidência de cada país da América Latina. A equipe de Kast, do Chile, por exemplo, já se reuniu com os responsáveis pela área de segurança de El Salvador, governado por Bukele....
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.




