"Tenho preço"
Movimento do clã está corretíssimo sob a ótica deles. Lançar - e manter - Flávio é a forma mais eficiente de seguir no jogo de 2026 em posição menos vulnerável
Qualificar como apenas “desastrosa” a declaração do senador Flávio Bolsonaro - aquela em que ele afirma que a manutenção de sua candidatura à Presidência tem um preço - é um gesto de generosidade olímpica. Em tempos de cortes, trata-se de um luxo retórico que ninguém deveria se permitir. Dentro do contexto, já é uma sinalização péssima. Fora dele, beira a automutilação política. Em qualquer das circunstâncias é digna de fazer a cotação do cacau disparar nas bolsas de valores de Londres e Nova Iorque.
Mas, justiça seja feita: embora a sinapse não seja exatamente o ponto forte do cariótipo familiar, o movimento do clã está corretíssimo sob a ótica deles. Lançar - e manter - a candidatura de Flávio é a forma mais eficiente de seguir no jogo de 2026 em posição menos vulnerável do que estariam caso apoiassem outro nome da direita. A jogada, vista do planalto emocional do bolsonarismo, preserva o rebanho “intra-cercas”, impede dispersão precoce e mantém a marca Bolsonaro viva e competitiva para 2030.
E há um dado irrefutável: o eleitorado disposto a seguir qualquer coisa que venha acompanhada do sobrenome Bolsonaro não baixa de dois dígitos. Por que, então, arriscar transferir prestígio a um adversário potencial de 2030 numa eleição em que Lula aparece como adversário difícil de ser batido? Do ponto de vista deles, apostar em outro nome da direita é alimentar um rival em formação - e, pior, entregar-lhe musculatura para enfrentá-los quando o ambiente estiver mais favorável e os desgastes do golpismo, das “rachadinhas” e de outros crimes já tiverem decantado.
O quebra-cabeça que se apresenta à direita e extrema-direita, portanto, se converte em um enorme abacaxi para o Centrão descascar. A aritmética não fecha com naturalidade. Apoiar Flávio Bolsonaro agora significa aceitar que qualquer plano de ter um “puro-sangue” do próprio campo comandando a direita ficará adiado por longos anos. Não o apoiar, lançando outro nome na corrida, significa facilitar ainda mais a vida de Lula rumo à reeleição.
A pergunta inevitável é: mas a reeleição de Lula já não estaria praticamente encaminhada? Talvez seja justamente essa a conta que estrategistas do Centrão deveriam fazer. Se 2026 parece uma partida praticamente jogada, por que não antecipar 2030? Nesse raciocínio, lançar uma candidatura com fôlego para crescer, mesmo que não vença agora, pode ser o movimento mais inteligente. E, nesse caso, figuras como Caiado e Zema talvez estivessem fora do páreo - por falta de timing, densidade ou conveniência.
Mas, ao fim e ao cabo, mover as peças nesse tabuleiro é problema da direita e da extrema-direita. Sem qualquer relação com obrigações parentais, a verdade é uma só: quem pariu, que embale. E o Centrão sabe muito bem o que trouxe ao mundo.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.




