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Carlos Carvalho

Doutor em Linguística Aplicada e professor na Universidade Estadual do Ceará - UECE.

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Um minuto de aplauso à estupidez humana

A incursão da polícia nas referidas comunidades consistiu em uma ação da política (na verdade, necropolítica) de extermínio e não de segurança

Chacina no Rio de Janeiro - 29/10/2025 (Foto: Eusébio Gomes/TV Brasil)

É consenso entre aqueles que acompanham a política brasileira, que nosso atual Congresso é o pior da história da República. É nítido que passam ao largo dos nossos nobres parlamentares preocupações como a elaboração de leis que tenham o objetivo de melhorar as condições de vida do povo e contribuir para que o país continue dando certo. Tem-se a impressão que os parlamentares brasileiros ignoram a razão pela qual estão ali e acabam por confirmar o descrédito da população com aqueles e aquelas colocados lá para decidir em seu nome. O despreparo e o descaso para com o povo brasileiro se tornaram não exceção, mas regra. A normalização da incompetência e da irresponsabilidade política não podem, no entanto, ser a constante de um Parlamento em uma nação democrática.

A chacina perpetrada pelas forças de segurança do Rio de Janeiro nas comunidades do Alemão e Penha, sob comando do governador, mostrou ao mundo o caos reinante naquela administração e a incapacidade do Estado em lidar com um problema que já dura anos. Ao tentar demonstrar força e controle sobre o crime organizado, mais uma vez o governo do Rio de Janeiro meteu os pés pelas mãos e causou o maior massacre da história deste país. Como coincidências não existem, não caiamos na armadilha de que o massacre em questão foi apenas o resultado desastrado de uma ação policial. O buraco é mais embaixo, caro leitor, e a incursão da polícia nas referidas comunidades consistiu em uma ação da política (na verdade, necropolítica) de extermínio e não de segurança que, vez ou outra, desaba com todo seu peso sobre os pretos, pobres e favelados.

Em matéria publicada em https://www.bbc.com/portuguese/articles/cyv8nrlll0yo, o fotógrafo Bruno Itan, que acompanhou por 24 horas a fatídica Operação, disse o que viu: “[corpo] estava sem cabeça, corpos totalmente desfigurados mesmo, [ ] sem rosto, sem a metade do rosto, sem braços, corpos sem pernas. E o que me chamou muita atenção são muitos corpos com facadas, tem muitas fotos que dá pra ver que foi arma, efeito da arma branca, entende?” A se confirmar o relato de Itan, o governador do Rio de Janeiro terá muito o que explicar. Enquanto isso, protejam Bruno Itan!

O sangue dos mortos, todos eles, ainda nem esfriara quando as notícias falsas já dominavam a Internet, culpando o Presidente Lula pelo acontecido e chamando-o de “Presidente dos traficantes”. Perceba, caro leitor, que não apenas a ação policial já estava planejada nos moldes em que se deu, assim como os resultados que se esperava. Também já estava planejada a divulgação sincronizada de fake News com claros objetivos de atingir Lula, que lidera todas as intenções de voto como candidato à presidência em 2026. Na sequencia dos acontecimentos, não demoraram as comemorações vindas da extrema direita, da mesma extrema direita que acha que “bandido bom é bandido morto”, mas que esperneia e dá chilique quando escuta que “bandido bom é bandido preso”, mesmo que preso em uma mansão.

Comemorar o assassinato de pessoas, independentemente de quem sejam, diz mais sobre quem comemora do que sobre quem foi morto. Um incauto cidadão comum pode até fazê-lo, mas quando isso vem de um parlamentar é de se lamentar profundamente a falência ético-moral que domina a política brasileira. Por exemplo, um deputado federal celebrou a matança no Rio de janeiro, classificando-a como a “maior faxina da história”, defendendo que se mate outros 120. Em sessão na Câmara, outro deputado pediu um minuto de aplausos em louvor à Operação que resultou na morte de 120 pessoas, desejando ele que esse número chegue a 200, 300. Quando aquele conhecido deputado homenageou o torturador Brilhante Ustra no Congresso e não saiu de lá algemado, abriu as portas do inferno para que outras criaturas nefastas saíssem das trevas e assombrassem a democracia brasileira. Os aplausos solicitados pelo nobre deputado não foram apenas em louvor à trágica Operação do senhor Castro, mas também à barbárie, à ignorância política e à estupidez humana.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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