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Bispos encerram 2025 com mensagem de esperança e alertas ao Brasil

Presidência da CNBB destaca avanços sociais e econômicos, mas manifesta preocupação com retrocessos éticos, democráticos e o aumento das desigualdades

Bispos encerram 2025 com mensagem de esperança e alertas ao Brasil (Foto: Reuters/Jason Cohn)

247 - A poucos dias do encerramento de 2025, a Presidência da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) divulgou uma mensagem ao povo brasileiro marcada pela reafirmação da esperança cristã e por uma leitura crítica da realidade nacional. Inspirados na passagem bíblica “a esperança não decepciona” (Rm 5,5), os bispos recordam o Natal como sinal de que nenhuma situação de escuridão é definitiva e apontam a esperança como força capaz de transformar a história.

A mensagem foi publicada originalmente no site oficial da CNBB, em nota assinada pela Presidência da entidade na segunda-feira (29). No texto, os bispos reconhecem que o ano foi marcado por avanços relevantes em diferentes áreas da vida nacional, ao mesmo tempo em que expressam profunda inquietação diante de desafios persistentes e de sinais de retrocesso no campo ético, social e democrático.

Entre os pontos positivos destacados, a CNBB menciona o fortalecimento do Sistema Único de Saúde, a melhora de indicadores econômicos, como a queda do desemprego, a estabilidade da inflação e o crescimento do Produto Interno Bruto. A mensagem também ressalta iniciativas ligadas à sustentabilidade, como a realização da COP30 no Brasil, o protagonismo do país no campo das energias renováveis e o aumento de investimentos em práticas ambientais, sociais e de governança. Experiências de participação popular e de cooperativismo são apontadas como sinais encorajadores de organização social e compromisso comunitário.

Ao mesmo tempo, o documento manifesta preocupação com uma série de problemas que seguem afetando o país. Entre eles, os bispos citam o elevado custo da dívida pública, o enfraquecimento da ética na vida pública, o crescimento da corrupção e a fragilização das instituições democráticas. Também são mencionadas a flexibilização de marcos legais, o desrespeito aos povos originários, as ameaças à proteção ambiental e a permanência de profundas desigualdades sociais.

A Presidência da CNBB chama atenção ainda para o aumento da violência, com destaque para os casos de feminicídio, e para a disseminação de discursos de ódio e de radicalismos, considerados fatores que dificultam o diálogo e aprofundam divisões na sociedade brasileira.

No campo dos valores, a mensagem reafirma a defesa da vida humana “da concepção ao fim natural”, posicionando-se contra qualquer iniciativa de legalização do aborto. Ao mesmo tempo, os bispos sublinham que a defesa da vida não pode ser dissociada do enfrentamento da fome, da miséria e da desigualdade social, entendidas como violações concretas da dignidade humana.

A democracia é apresentada como um patrimônio do povo brasileiro que exige cuidado permanente, diálogo e compromisso com o bem comum. Nesse sentido, a CNBB destaca que a preservação da vida democrática depende da participação responsável da sociedade e do fortalecimento das instituições.

Ao concluir a mensagem, a Presidência da CNBB convoca a população a assumir o compromisso de ser construtora da paz, promotora da justiça e da responsabilidade social, reafirmando a esperança como caminho possível para a pacificação e a reconstrução do país diante dos desafios do tempo presente.

Confira a mensagem na íntegra:

MENSAGEM DE ANO NOVO

“A esperança não decepciona, porque o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo” (Rm 5,5).

Há poucos dias, celebramos o Natal de nosso Senhor Jesus Cristo. Naquela noite santa, o anjo já o disse aos pastores, e hoje repete a nós: “Não temais! Eu vos anuncio uma grande alegria, que será também a de todo o povo” (Lc 2,10). Por ocasião do encerramento do Ano Jubilar, em nossas dioceses, e praticamente do ano civil, dirigimo-nos ao povo brasileiro com uma mensagem de esperança, mas, ao mesmo tempo, de grave preocupação. Como pastores, exultamos com as vitórias e conquistas e nos inquietamos – e até nos indignamos! – com alguns retrocessos no campo da ética e do cuidado com os pobres.

Neste ano, são várias as notícias que nos fazem felizes e renovam nossas esperanças. No âmbito da saúde, ficamos felizes com o aumento da taxa média de médicos pelo número de habitantes e agradecemos a Deus pelo Sistema Único de Saúde. No campo econômico, alegramo-nos com a retirada de algumas tarifas norte-americanas sobre vários produtos brasileiros, a estabilidade da inflação, a taxa de desemprego em queda, o relativo crescimento do PIB, o significativo aumento do cooperativismo e a abertura de novos mercados internacionais.

Orgulhamo-nos da realização da COP-30, em Belém do Pará, e também nos enleva o fato de o Brasil consolidar sua liderança em energias renováveis. A Igreja se fez presente, não como protagonista político, mas desejosa de contribuir para a construção de caminhos comuns diante da crise climática e o cuidado com a “Casa Comum”. Aumentou significativamente o investimento privado em sustentabilidade, em práticas ambientais, sociais e de governança (ESG). Os movimentos populares se alegram, sobretudo, com a realização do Plebiscito Popular sobre a redução da jornada de trabalho e a taxação proporcional à riqueza.

Constatamos experiências positivas. Contudo, há também várias situações que nos entristecem e preocupam. No âmbito da convivência democrática, o ano de 2025 foi marcado por profundas tensões e retrocessos sociais, que deixaram feridas abertas no tecido social. Algumas experiências fragilizaram seriamente a confiança nas instituições e desafiaram as pessoas de boa vontade, que acreditam numa sociedade mais justa e fraterna. Entre essas, destacam-se: o pagamento exorbitante de juros e amortizações da dívida, que deixa o país sem capacidade de maior investimento em educação, saúde, moradia e segurança; o enfraquecimento da ética e o aumento da corrupção na vida pública; a fragilização dos mecanismos democráticos, por causa de interesses econômicos e disputas de poder; a flexibilização de marcos legais essenciais, como a Lei da Ficha Limpa; o desrespeito pelos povos originários e tradicionais, agravado pela aprovação do Marco Temporal no Congresso Nacional; as ameaças à proteção ambiental, intensificadas pelas mudanças na Lei Geral do Licenciamento; a desigualdade social, que continua marginalizando muitos; o aumento da violência, especialmente o feminicídio e outros crimes motivados pela intolerância; o uso de drogas e o crescimento de “economias ilícitas”; a perda de decoro e a falta de responsabilidade por parte de algumas autoridades, especialmente do nosso Congresso Nacional. Discursos de ódio, manipulação da verdade, violências, radicalismos ideológicos e interesses particulares não podem se sobrepor ao bem comum.

Tais realidades ferem a dignidade humana e obscurecem a vocação democrática do país. O poeta Thiago de Mello traduz esse valor numa bela imagem: “Faz escuro, mas eu canto, porque a manhã vai chegar”. A presença do Deus que se faz criança, simples e próxima, renova nossa convicção de que nenhuma escuridão é definitiva e que a esperança é força transformadora para quem caminha em busca do bem comum. Por isso, reafirmamos que nenhum projeto político pode se sobrepor à vida, ao respeito à pessoa humana, à justiça social e ao cuidado com a casa comum.

Reiteramos a sacralidade da vida humana, desde a concepção até seu fim natural. Ela é o primeiro dos direitos, dom gratuito de Deus, e não pode ser relativizada ou negociada. Por isso, manifestamo-nos firmemente contra qualquer iniciativa de legalização do aborto no Brasil. Defender a vida, contudo, implica também lutar contra a fome, a miséria e a desigualdade. Defender a vida significa criar condições para que “todos tenham vida e vida em abundância” (Jo 10,10).

A democracia, com sua exigência de diálogo, suas instituições, seus freios e contrapesos, é patrimônio do povo brasileiro e precisa de cuidado e promoção. Embora imperfeita, ela é terreno fértil onde a justiça e a verdade podem se abraçar (cf. Sl 85,10) e florescer. Como discípulos e discípulas de Jesus Cristo, somos chamados a ser testemunhas credíveis e exemplares, artesãos da paz, construtores de pontes, promotores da caridade política e da responsabilidade social. A nação precisa reencontrar o caminho da pacificação, do diálogo e do respeito mútuo!

Desejamos e trabalhamos pela paz desarmada e desarmante, humilde e perseverante, por um mundo e por um ser humano pacificados e reconciliados no amor (cf. Ef 2,14), a fim de concretizar o sonho de Jesus Cristo, expresso de modo tão belo por Dom Helder Câmara: “Sem esperança, temos as mãos e os pés amarrados. Somos escravos sem perspectiva de libertação”. Não caminhamos na escuridão; somos peregrinos de esperança!

Que a luz do Menino Deus ilumine nossas famílias, comunidades e nação. Que o Natal acenda em nossos corações a coragem de recomeçar, e que o ano de 2026 nos encontre firmes no testemunho cristão, com o desejo de mudar o mundo, empenhados na oração, nutridos pela Palavra e pela Eucaristia. Que a Mãe Aparecida, Rainha e Padroeira do Brasil, nos acompanhe nesta travessia.

Brasília – DF, 29 de dezembro de 2025

Dom Jaime Cardeal Spengler
Arcebispo da Arquidiocese de Porto Alegre – RS
Presidente da CNBB

Dom João Justino de Medeiros Silva
Arcebispo da Arquidiocese de Goiânia – GO
1º Vice-Presidente da CNBB

Dom Paulo Jackson Nóbrega de Sousa
Arcebispo da Arquidiocese de Olinda e Recife – PE
2º Vice-Presidente da CNBB

Dom Ricardo Hoepers
Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Brasília – DF
Secretário-Geral da CNBB

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