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Caso Benício: polícia pede prisão de médica e técnica investigadas pela morte de criança

Investigação aponta erro grave na aplicação de adrenalina e uso indevido de carimbo de pediatria

A morte de Benício Xavier de Freitas, de 6 anos, desencadeou uma série de questionamentos sobre condutas médicas e protocolos de segurança em um hospital particular de Manaus (Foto: Reprodução/Arquivo pessoal)

247 - A Polícia Civil do Amazonas solicitou à Justiça a prisão preventiva da médica Juliana Brasil Santos e da técnica de enfermagem Raiza Bentes Paiva, investigadas pela morte de Benício Xavier, de 6 anos, ocorrida após a aplicação incorreta de adrenalina em um hospital particular de Manaus. As informações foram divulgadas inicialmente pelo g1.

O pedido de prisão foi apresentado após o Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM) revogar o habeas corpus preventivo concedido anteriormente à médica. A decisão judicial ocorreu poucos dias depois de a Justiça também negar o mesmo benefício à técnica de enfermagem, que já respondia ao inquérito em liberdade.

Segundo a Polícia Civil, as investigações avançaram de forma significativa nas últimas semanas e reforçaram a suspeita de falhas graves no atendimento prestado à criança. Benício morreu na madrugada de 23 de novembro, poucas horas após receber adrenalina por via intravenosa, aplicada pela técnica Raiza Bentes e prescrita pela médica Juliana Brasil.

Durante a apuração conduzida pelo 24º Distrito Integrado de Polícia (DIP), a médica reconheceu o erro em um documento encaminhado às autoridades e em mensagens trocadas com o médico Enryko Queiroz, nas quais pediu orientação após a piora do quadro da criança. A defesa de Juliana, no entanto, sustenta que a admissão ocorreu “no calor do momento” e não configuraria confissão formal.Até a publicação desta reportagem, as defesas de Juliana Brasil Santos e Raiza Bentes Paiva não haviam se manifestado sobre o pedido de prisão preventiva.

Uso indevido de carimbo de pediatria
Além da investigação por homicídio doloso por dolo eventual, a médica também pode responder pelos crimes de falsidade ideológica e uso de documento falso. De acordo com o delegado Marcelo Martins, a Polícia Civil identificou que Juliana Brasil utilizava carimbo e assinaturas com referência à especialidade de pediatria, apesar de não possuir o título oficialmente reconhecido.

“Nós realizamos um estudo a respeito da questão dela ter assinado a especialização pediatria no carimbo e ter assinado o nome dela com a expressão pediatria. Todas as regulamentações do Conselho Federal de Medicina indicam que o médico que não possui uma especialização não pode se identificar de nenhuma forma, com nenhuma referência a uma especialidade que ele não possui, e ela fez isso”, afirmou o delegado.

Segundo ele, a conduta pode configurar dois crimes distintos. “Então, isso configura o crime de falsidade ideológica e o uso de documento falso. A investigação prossegue agora também com relação a esses dois crimes, além do homicídio doloso por dolo eventual”, completou.

A defesa da médica informou à Rede Amazônica que, embora Juliana Brasil não possua o título de especialista em pediatria, ela é formada desde 2019, atuava legalmente na área e acumulava experiência prática. Os advogados afirmaram ainda que a médica pretendia realizar a Prova de Título de Especialista em Pediatria (TEP) neste mês de dezembro, certificação que pode ser obtida mesmo sem residência médica, segundo regras da Sociedade Brasileira de Pediatria.Relato do pai e sequência de falhas

De acordo com o pai de Benício, Bruno Freitas, o menino foi levado ao hospital com tosse seca e suspeita de laringite. Ele relatou que a médica prescreveu lavagem nasal, soro, xarope e três doses de adrenalina intravenosa, de 3 ml a cada 30 minutos.A família afirmou que chegou a questionar a técnica de enfermagem ao tomar conhecimento da prescrição. “Meu filho nunca tinha tomado adrenalina pela veia, só por nebulização. Nós perguntamos, e a técnica disse que também nunca tinha aplicado por via intravenosa. Falou que estava na prescrição e que ela ia fazer”, disse o pai.

Após a primeira aplicação, o estado de Benício se agravou rapidamente. A criança foi levada para a sala vermelha, onde apresentou queda acentuada da oxigenação, que chegou a cerca de 75%. Uma segunda médica foi acionada, e, diante da gravidade do quadro, foi solicitado um leito de UTI.Já na unidade de terapia intensiva, o menino precisou ser intubado por volta das 23h. Durante o procedimento, sofreu as primeiras paradas cardíacas. Segundo o pai, houve sangramento porque a criança vomitou durante a intubação. Apesar das tentativas de reanimação, o quadro permaneceu instável, com novas paradas, e Benício morreu às 2h55 de domingo.

“Queremos justiça pelo Benício e que nenhuma outra família passe pelo que estamos vivendo. O que a gente quer é que isso nunca mais aconteça. Não desejamos essa dor para ninguém”, afirmou Bruno Freitas.

Em nota, o Hospital Santa Júlia informou que a médica e a técnica de enfermagem foram afastadas de suas funções e que uma investigação interna foi aberta por meio da Comissão de Óbito e Segurança do Paciente. A Polícia Civil segue colhendo depoimentos e analisando documentos para esclarecer todas as circunstâncias do caso e definir as responsabilidades criminais.

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