Segurança pública: Fundação Perseu Abramo propõe 'Guarda Nacional Civil'
Fundação Perseu Abramo constata fracasso da guerra às drogas e propõe reforma estrutural na segurança pública
247 - A Fundação Perseu Abramo divulgou um conjunto de análises e propostas estruturais para orientar um novo paradigma de segurança pública no país, conforme detalhado no caderno Brasil Seguro, Família Protegida. No documento, a instituição afirma que o modelo brasileiro está esgotado e defende uma reconfiguração profunda das políticas, com foco na integração federativa, prevenção da violência, fortalecimento do controle interno e enfrentamento qualificado das organizações criminosas.
Segundo a publicação da Fundação Perseu Abramo, o atual sistema de segurança pública mantém práticas ultrapassadas, altas taxas de letalidade policial, baixa padronização nacional e fragmentação entre União, estados e municípios. A entidade sustenta que a consolidação do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), em moldes semelhantes ao SUS, é essencial para superar o quadro e permitir ações coordenadas de prevenção, investigação e repressão.
Nos seis eixos temáticos apresentados, a instituição sintetiza as principais constatações do diagnóstico e aponta caminhos para a reconstrução das políticas públicas de segurança no Brasil.
Reformas estruturais e fortalecimento do SUSP
A Fundação defende alterações constitucionais para reorganizar competências, padronizar protocolos e ampliar a atuação coordenada entre os entes federativos. Entre os pontos centrais estão:
- constitucionalização das diretrizes nacionais de segurança pública;
- criação de uma Guarda Nacional de caráter civil;
- implantação do ciclo completo de polícia;
- inclusão das Guardas Civis Municipais no rol das instituições de segurança;
- revisão da vinculação das Polícias Militares ao Exército.
A proposta estabelece que a coordenação do sistema deve caber à União, responsável por articular políticas, integrar dados e induzir padrões de atuação baseados em evidências.
Uso da força, controle interno e redução da letalidade
Outro eixo central da proposta é a construção de uma doutrina nacional de uso da força, baseada em protocolos internacionais. A Fundação destaca a necessidade de:
- padronização de procedimentos de atuação policial;
- redução da letalidade e da vitimização de agentes;
- formação permanente com foco em antirracismo e direitos humanos;
- fortalecimento das corregedorias e criação de ouvidorias independentes;
- implantação de câmeras corporais e instrumentos de transparência.
A instituição propõe ainda a criação de um Observatório Nacional para avaliar o desempenho policial, produzir indicadores, difundir boas práticas e aprimorar a accountability.
Prevenção como eixo estruturante da política pública
O documento critica a centralidade histórica da lógica repressiva e defende a ampliação de programas de prevenção social e situacional. Entre as prioridades estão:
- expansão do policiamento de proximidade;
- programas de redução de homicídios com recorte territorial, racial e de gênero;
- força-tarefa permanente contra a receptação de celulares;
- políticas de enfrentamento do racismo estrutural;
- ações específicas para a população LGBTQIA+, crianças, jovens e mulheres em situação de violência;
- retomada de programas de mediação de conflitos e justiça restaurativa.
A Fundação afirma que prevenir é mais eficaz e menos custoso do que combater consequências da violência instalada.
Nova política de drogas com foco em saúde pública e direitos
A entidade reforça o fracasso da “guerra às drogas” e propõe revisão da Lei de Drogas para diferenciar usuário e traficante. Defende:
- expansão da Rede de Atenção Psicossocial;
- programas de redução de danos, moradia, educação e renda;
- articulação intersetorial para assistência a populações vulneráveis;
- repressão concentrada nas rotas internacionais e estruturas financeiras do tráfico, não no pequeno comércio varejista.
Para a Fundação, o enfoque atual reforça seletividade penal, racismo e violência.
Enfrentamento às organizações criminosas e integração da inteligência
O caderno aponta que milícias e facções atuam como economias articuladas, explorando brechas institucionais e territoriais. Para enfrentar esse cenário, propõe:
- integração nacional dos sistemas de inteligência e das bases de dados;
- modernização da Rede Infoseg;
- criação de unidades especializadas em crimes cibernéticos;
- parcerias entre PF, PRF, Receita, COAF, MP, Judiciário e polícias estaduais;
- fortalecimento da investigação e do combate à lavagem de dinheiro;
- padronização nacional para operações complexas.
A Fundação defende que o combate seja “econômico e estratégico”, focado na desarticulação das cadeias financeiras do crime.
Reorganização do sistema penitenciário
O diagnóstico aponta que o sistema prisional brasileiro “fabrica violência”, fortalece facções e não reduz reincidência. Como resposta, propõe:
- racionalização do encarceramento e fortalecimento de alternativas penais;
- ampliação do Sistema Penitenciário Federal;
- diretrizes nacionais de gestão prisional;
- fortalecimento das políticas de educação, saúde e trabalho para pessoas privadas de liberdade;
- combate à influência das facções dentro das unidades;
- expansão dos programas de atenção a egressos.
A Fundação defende também veto à privatização de presídios e transparência na aplicação dos fundos penitenciários.
PEC da Segurança e PL Antifacção: modernização institucional
O documento destaca ainda as diretrizes da PEC da Segurança Pública apresentada pelo presidente Lula, que prevê:
- integração federativa do SUSP;
- autonomia de corregedorias e ouvidorias;
- blindagem orçamentária dos fundos de segurança e penitenciário;
- redefinição das competências das polícias da União;
- inclusão constitucional das Guardas Municipais.
Já o PL Antifacção cria o conceito de organização criminosa qualificada, endurece penas para líderes de facções, amplia instrumentos de investigação, permite intervenção em empresas ligadas ao crime e fortalece o confisco de bens.
A Fundação Perseu Abramo aponta que a reconstrução da segurança pública exige integração nacional, controle democrático, combate estratégico às facções e expansão de políticas de prevenção e direitos. Para a instituição, um novo modelo só terá sucesso se priorizar a vida, o antirracismo e a participação social, articulando União, estados e municípios em um sistema coordenado e transparente.



