Reinaldo, o craque da democracia
Reconhecido na semana passada como anistiado político, o craque do Galo demonstrou consciência política numa entrevista histórica concedida ao Movimento
Por Aloísio Morais – especial para o Brasil 247 – Em 1978, o centroavante do Atlético Mineiro José Reinaldo Lima, o Reinaldo – ou simplesmente “Rei” – despontava como o maior artilheiro do Campeonato Nacional, com 28 gols. Eu trabalhava como repórter da sucursal do jornal Movimento em Belo Horizonte quando o jornalista Teodomiro Braga, torcedor apaixonado do América Mineiro, sugeriu à redação em São Paulo que o semanário produzisse um perfil do jovem goleador. Quem era aquele garoto de 18 anos que aterrorizava goleiros de todo o país?
Fui escalado para a tarefa.
Numa manhã de sábado, o Atlético estava concentrado na Vila Olímpica, prestes a embarcar para Londrina, onde jogaria no domingo. Confesso que temi que Reinaldo tratasse com desdém um repórter do Movimento, um jornal perseguido pela censura. Mas pedi para falar com ele e logo fui atendido. Para minha surpresa, não só conhecia o jornal como era leitor assíduo.
Combinamos a entrevista para a manhã da segunda-feira seguinte, no apartamento que ele dividia com a mãe no bairro São Pedro, Zona Sul da capital.
Fui para lá ainda desconfiado de que a entrevista pudesse cair. Fui acompanhado do chefe da sucursal, Luiz Bernardes. Começamos devagar, conversando sobre amenidades, mas logo percebi que o capricorniano Reinaldo – que faz aniversário um dia depois de mim – tinha muito a dizer. Seguro, leve e bem-humorado, falava sem restrições sobre temas bem além das quatro linhas.
Aos poucos, avançamos para assuntos quentes: distribuição de renda, anistia, a Constituinte que a oposição reivindicava em plena ditadura. Reinaldo não se esquivava. Demonstrava ser um jovem informado, articulado e consciente do país em que vivia.
Saímos dali certos de que tínhamos material de capa. E foi exatamente o que ocorreu.
Na edição nº 140, de 6 de março de 1978, uma foto belíssima de Reinaldo, registrada por Auremar de Castro, estampou a primeira página do Movimento com o título: “Bom de bola e bom de cuca”.

A entrevista repercutiu muito – especialmente por ter sido publicada em um jornal censurado. Gerou polêmica. Um jornalista carioca, que assinava as “Dicas” no Pasquim, chegou a questionar publicamente a autenticidade das declarações do atacante.
Pouco depois, veio a convocação para a Seleção Brasileira. Já na apresentação na Gávea, sede do Flamengo, Reinaldo foi cercado pelos repórteres, que queriam saber sobre suas posições políticas. Mas ele não era ingênuo – tampouco estava ali para alimentar controvérsias. Respondeu de forma curta e estratégica:
“Tudo o que vocês querem saber está lá na entrevista ao Movimento.”
E encerrou o assunto.
Ali nascia o Reinaldo político – que, mais tarde, seria eleito vereador pelo PT em Belo Horizonte e deputado estadual pelo PDT. E que na semana passada foi finalmente reconhecido como um anistiado político.

