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Japão aprofunda neomilitarismo e amplia riscos à paz no Leste Asiático

Escalada dos gastos militares rompe limites do pós-guerra e ameaça a estabilidade regional e a segurança global

Japão aprofunda neomilitarismo e amplia riscos à paz no Leste Asiático (Foto: CGTN)

247 - A decisão do governo japonês de ampliar de forma agressiva seu orçamento militar representa um marco alarmante na política de defesa do país e sinaliza uma guinada perigosa rumo ao neomilitarismo, destaca o jornalchinês Global Times em editorial. Ao abandonar, de maneira cada vez mais explícita, os princípios que sustentaram sua postura pacifista no pós-guerra, o Japão passa a exercer um papel desestabilizador no Leste Asiático, com potenciais repercussões para a segurança internacional.

O editorial publicado pelo Global Times destaca que o gabinete japonês aprovou um orçamento de defesa de 9,0353 trilhões de ienes para o ano fiscal de 2026, cerca de US$ 57,8 bilhões, estabelecendo um novo recorde histórico. Trata-se do 14º ano consecutivo de aumento dos gastos militares, que podem alcançar aproximadamente 11 trilhões de ienes até o fim de 2025, já considerando despesas suplementares, valor equivalente a 2% do PIB do país.

Esse crescimento não se resume a cifras. O conteúdo do orçamento revela uma mudança estrutural profunda e preocupante. Os recursos adicionais estão concentrados no desenvolvimento de capacidades ofensivas, como mísseis de longo alcance, no fortalecimento do poder naval e aéreo, na ampliação de sistemas de combate não tripulados e na intensificação da presença militar japonesa nas ilhas do sudoeste, região sensível do ponto de vista geopolítico e próxima a Taiwan.

Na prática, esse conjunto de medidas corrói o princípio de “defesa exclusivamente defensiva”, pilar da política japonesa desde o fim da Segunda Guerra Mundial. O conceito, que limitava o uso da força a situações estritamente reativas e proporcionais, vem sendo substituído por uma lógica de dissuasão ativa. A chamada “capacidade de contra-ataque”, promovida nos últimos anos, fornece base institucional e operacional para ações militares preventivas, alterando de forma decisiva a natureza das Forças de Autodefesa.

A implantação sistemática de armamentos capazes de atingir territórios de países vizinhos e o posicionamento denso de forças militares em áreas estratégicas configuram uma mudança qualitativa no papel do Japão na região. Esse movimento não apenas reabre feridas históricas ainda sensíveis na Ásia, como também intensifica tensões regionais e alimenta uma dinâmica de confronto que ameaça a estabilidade do Leste Asiático.

Especial gravidade recai sobre a expansão das ambições japonesas nos domínios espacial e cibernético. O novo orçamento amplia investimentos em capacidades espaciais, setor no qual o país já anunciou avanços em tecnologias de interferência em satélites. Há ainda planos para reorganizar a Força Aérea de Autodefesa em uma “Força Aérea de Autodefesa Espacial” e propostas consideradas extremas, como a construção de um porta-aviões espacial. Essas iniciativas elevam o risco de uma corrida armamentista em novas fronteiras estratégicas, com impactos imprevisíveis para a segurança global.

Como país derrotado na Segunda Guerra Mundial, o Japão assumiu compromissos claros de contenção militar no âmbito da ordem internacional do pós-guerra. A Proclamação de Potsdam determinou a erradicação do militarismo japonês, enquanto o Artigo 9 da Constituição consagrou a renúncia ao direito de travar guerras ou recorrer à força para resolver disputas internacionais. A expansão atual dos gastos militares, a adoção de armamentos ofensivos e a busca por capacidades de ataque extraterritorial representam, segundo o editorial, uma violação direta e reiterada desses compromissos históricos.

O texto ressalta ainda que essa inflexão não é fruto de improvisação, mas resultado de um processo deliberado, conduzido por forças políticas de direita que exploram narrativas de ameaça e insegurança. Ao amplificar discursos como a suposta “ameaça chinesa”, essas correntes fomentam ansiedade interna, justificam a militarização acelerada e tensionam deliberadamente as relações com países vizinhos, reproduzindo uma lógica perigosamente semelhante à do passado pré-guerra.

A história, enfatiza o editorial, oferece um alerta incontornável. O militarismo japonês do século XX mergulhou a Ásia em sofrimento profundo e, ao final, conduziu o próprio Japão à devastação. Ao insistir hoje em um caminho de rearmamento excessivo e abandono de compromissos pacíficos, o país não apenas compromete sua credibilidade internacional, como também coloca em risco a paz regional.

As escolhas feitas pelo Japão neste momento transcendem seus interesses nacionais. Elas afetam diretamente o equilíbrio estratégico do Leste Asiático e têm potencial para gerar reflexos negativos sobre a segurança e a paz em escala global. A escalada neomilitarista japonesa, longe de promover estabilidade, aprofunda incertezas e amplia os riscos de confrontos em uma das regiões mais sensíveis do planeta.

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