Trump minimiza imagem de IA vestido de papa, mas especialistas alertam para riscos democráticos
A aparente leveza com que Trump tratou o episódio contrasta com as preocupações de especialistas em comunicação e ética pública
247 - O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, voltou a causar polêmica após imagens geradas por inteligência artificial (IA) o retratarem vestido como o papa e empunhando um sabre de luz vermelho, típico dos vilões da franquia Star Wars. Postadas inicialmente em sua conta no Truth Social e depois compartilhadas por perfis oficiais do governo, as imagens foram classificadas por Trump como uma simples brincadeira. No entanto, especialistas alertam que o uso político de conteúdos criados por IA representa um novo e perigoso patamar de manipulação da opinião pública. As informações são da Reuters.
“Foi apenas uma piada. Alguém fez isso por diversão. Está tudo bem. Precisamos nos divertir um pouco, não é?”, disse Trump a repórteres na segunda-feira (5), ao ser questionado sobre a repercussão das imagens. Ele negou ter sido o autor da postagem original, embora a publicação tenha partido de seu perfil na rede.
A imagem que mais repercutiu mostrava Trump com vestes papais brancas e um solidéu, como se fosse o representante de Deus na Terra. Para muitos católicos, tanto nos Estados Unidos quanto na Itália, a montagem foi ofensiva. O ex-primeiro-ministro italiano Matteo Renzi criticou a publicação: “Esta é uma imagem que ofende os crentes, insulta instituições e mostra que o líder da direita global gosta de se comportar como um palhaço”, escreveu no X (antigo Twitter).
A aparente leveza com que Trump tratou o episódio contrasta com as preocupações de especialistas em comunicação e ética pública. Para John Wihbey, diretor do Laboratório de Estratégias de Mídia e IA da Universidade Northeastern, o uso de imagens sintéticas pode inaugurar uma nova fase de manipulação digital a serviço da política. “Acho que estamos vendo um novo fenômeno – a fusão das redes sociais com o poder da IA, organizada para fins de poder político e domínio narrativo”, afirmou. “Ele está explorando um território inexplorado. Suspeito que políticos ao redor do mundo comecem a usar IA generativa e redes sociais de maneiras inéditas.”
O estrategista democrata Michael Ceraso vê nas imagens uma tática calculada de Trump para gerar atenção e engajamento. “Ele é o primeiro presidente influenciador”, disse. “Trump se inspira no mundo do wrestling profissional: você pode ser o vilão ou o mocinho, desde que esteja gerando reação da plateia.”
Desde que reassumiu a presidência, Trump tem usado imagens geradas por IA para construir uma imagem fantasiosa de si mesmo. Já foi retratado como um rei, como um chefão mafioso ao estilo Al Capone e até em um resort de luxo fictício construído em uma Gaza devastada pela guerra.
Jennifer Mercieca, especialista em retórica presidencial da Universidade Texas A&M, acredita que essas montagens cumprem um papel estratégico num momento de desgaste do governo. “As políticas de Trump são impopulares, e sua presidência é impopular”, avaliou. “Dentro desse contexto, Trump criou uma fantasia visual de si mesmo como herói, tentando convencer o país (e o mundo) de que ele é, de fato, um herói.”
Segundo a última pesquisa Reuters/Ipsos, o índice de aprovação do presidente está em 42%, com 53% de desaprovação. No início do mandato, chegou a atingir 47%. O maior temor, apontam especialistas, é que o uso político da IA avance para a criação de imagens cada vez mais “foto-realistas”, capazes de reescrever simbolicamente a história.
“A grande prova virá quando Trump tentar se inserir em imagens que pareçam eventos históricos, mas que nunca aconteceram”, alertou Wihbey.
