União Europeia diz que acordo com Mercosul foi adiado e será assinado em janeiro
Von der Leyen indica maioria favorável, mas impasse agrícola adia assinatura para 2026
247 - Segundo informações divulgadas pelo G1, a conclusão do acordo de livre comércio entre a União Europeia e o Mercosul foi transferida para janeiro, após pressões políticas lideradas por França e Itália. A mudança levou agentes e diplomatas a recalibrar expectativas sobre o futuro do tratado, que vinha sendo tratado como iminente pela Comissão Europeia.
A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, comunicou a autoridades do bloco que o acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia não será assinado neste sábado (20), como estava previsto inicialmente. A decisão representa mais um adiamento em um processo que se arrasta há mais de duas décadas e reflete divergências internas entre os países europeus, especialmente em relação ao impacto do tratado sobre o setor agrícola.
A proposta original previa que o pacto fosse fechado ainda nesta semana, durante a reunião do Conselho Europeu em Bruxelas, o que criaria a maior zona de livre comércio do mundo. No entanto, a Itália decidiu se alinhar à França para exigir mais tempo de negociação e garantias adicionais de proteção aos agricultores europeus, alterando o cronograma.
O acordo entre Mercosul e União Europeia prevê a redução ou eliminação gradual de tarifas de importação e exportação, além do estabelecimento de regras comuns para o comércio de bens industriais e agrícolas, investimentos, serviços e padrões regulatórios. As discussões se intensificaram com o início da reunião do Conselho Europeu, que segue até esta sexta-feira (19).
França lidera oposição ao texto atual
A resistência francesa tem sido um dos principais obstáculos ao avanço do tratado. Antes de uma das reuniões de cúpula da União Europeia, o presidente Emmanuel Macron foi direto ao comentar a posição de seu país. “Quero dizer aos nossos agricultores, que expressam a posição francesa desde o início, que consideramos que as contas não fecham e que este acordo não pode ser assinado”, declarou.
Macron também afirmou que a França se oporá a qualquer “tentativa de forçar” a adoção do pacto com o bloco sul-americano. Entre agricultores franceses, o acordo é amplamente visto como uma ameaça, diante do receio de concorrência com produtos latino-americanos mais baratos e produzidos sob padrões ambientais diferentes dos europeus.
Alemanha e Espanha defendem avanço
Em sentido oposto, Alemanha, Espanha e países nórdicos avaliam que o tratado pode funcionar como uma resposta estratégica às tarifas impostas pelos Estados Unidos sobre produtos europeus e como uma forma de reduzir a dependência econômica em relação à China. Para esses países, o acordo ampliaria o acesso a minerais estratégicos e abriria novos mercados para empresas europeias.
“Se a União Europeia quiser manter credibilidade na política comercial global, decisões precisam ser tomadas agora”, declarou o chanceler alemão, ao defender a aprovação do texto.
Itália mantém posição ambígua
A primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni, adotou um discurso cauteloso. “O governo italiano está pronto para assinar o acordo assim que forem dadas as respostas necessárias aos agricultores, o que depende das decisões da Comissão Europeia e pode ser resolvido rapidamente”, afirmou.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva relatou que Meloni não se coloca contra o tratado, mas enfrenta um “constrangimento político” decorrente da pressão exercida por agricultores italianos. Segundo Lula, a premiê demonstrou confiança em convencer o setor. “Se a gente tiver paciência de uma semana, de dez dias, de no máximo um mês, a Itália estará junto com o acordo”, afirmou o presidente brasileiro.
Protestos de agricultores em Bruxelas
A tensão em torno do acordo também se manifestou nas ruas de Bruxelas. Agricultores organizaram protestos que reuniram centenas de tratores nas proximidades das instituições europeias. Durante a mobilização, manifestantes queimaram pneus e lançaram batatas e outros objetos contra a polícia nas imediações do Parlamento Europeu.
Houve registro de danos materiais, como a quebra de uma janela do prédio Station Europe, na Praça de Luxemburgo. A polícia interveio para dispersar o protesto, e ao menos uma pessoa ficou ferida, de acordo com as autoridades locais.
Processo de aprovação e riscos políticos
A aprovação do acordo passa pelo Conselho Europeu, órgão responsável por autorizar formalmente a Comissão Europeia a ratificá-lo. Diferentemente do Parlamento Europeu, onde basta maioria simples, o Conselho exige maioria qualificada: o apoio de pelo menos 15 dos 27 países do bloco, que representem 65% da população da União Europeia.
É justamente nessa etapa que se concentra o maior risco político para o avanço do tratado. Embora o debate público esteja fortemente centrado no agronegócio, o acordo Mercosul-União Europeia é mais amplo e envolve setores como indústria, serviços, investimentos, propriedade intelectual e insumos produtivos, o que explica o apoio de diferentes segmentos econômicos europeus.
Com o adiamento, a expectativa de que Ursula von der Leyen viajasse ao Brasil ainda neste fim de semana para ratificar o acordo foi descartada. A assinatura, agora, dificilmente ocorrerá antes de 2026, mantendo o futuro do tratado condicionado ao delicado equilíbrio político dentro da União Europeia.



