Jean Paul Prates questiona compra da Lightsource BP pela Petrobras
Ex-presidente da estatal avalia que possível negócio pode representar má alocação de capital e desvio estratégico na transição energética
247 - A possível entrada da Petrobras no capital da empresa Lightsource BP é alvo de duras críticas do ex-senador e ex-presidente da estatal Jean Paul Prates. Em artigo de opinião, ele argumenta que a transição energética não pode servir de justificativa para decisões que, em sua avaliação, fragilizam a estratégia da companhia e comprometem seu papel histórico no desenvolvimento industrial e tecnológico do país.
Jean Paul Prates questiona a possibilidade de aquisição de 50% da Lightsource BP sem controle acionário. Para o autor, esse movimento levanta “questões graves de coerência estratégica, racionalidade econômica e visão de longo prazo”.
Ao abordar o conceito de transição energética, Prates é categórico ao afirmar que o processo exige planejamento e consistência. Segundo ele, “a transição energética não autoriza improvisos” e tampouco justifica que “empresas estatais estratégicas se transformem em compradores de ativos que já não fazem sentido para seus antigos donos”.
Na avaliação do ex-presidente da Petrobras, a Lightsource BP atua em um segmento específico da geração renovável, voltado à energia solar em larga escala, com forte presença em mercados maduros e altamente concorrenciais. Ele define o modelo como “um negócio financeirizado, de margens comprimidas, baixo risco e retorno previsível”, adequado, em sua visão, a fundos de infraestrutura e empresas privadas, mas distante da vocação histórica da estatal brasileira.
Prates ressalta que o valor da Petrobras sempre esteve associado à complexidade técnica e à integração industrial. “A Petrobras sempre construiu seu valor a partir da engenharia complexa, da integração industrial, da gestão de risco tecnológico e da capacidade de operar em ambientes extremos”, escreve. Para ele, a vantagem competitiva da empresa nunca esteve em atividades “comoditizadas, pulverizadas ou excessivamente concorrenciais”.
Nesse sentido, o autor critica diretamente a entrada no segmento de solar fotovoltaica utility scale, que classifica como o mais saturado entre as renováveis. Segundo o artigo, investir nessa área “significa abandonar esse DNA sem colocar nada equivalente no lugar”.
O ex-presidente deixa claro que sua posição não é contrária às energias renováveis. Pelo contrário, ele afirma que a Petrobras reúne condições singulares para liderar esse processo no Brasil. “Não se trata de rejeitar renováveis. Ao contrário”, destaca, acrescentando que a companhia poderia conduzir “uma transição energética robusta, justa e industrialmente consistente”.
Na sua análise, os caminhos mais coerentes estariam ligados a áreas em que a Petrobras já possui expertise consolidada. Ele cita, entre outras frentes, “eólica offshore integrada à engenharia marítima”, “biocombustíveis avançados conectados ao refino e à química” e “hidrogênio de baixo carbono articulado com gás, captura de CO₂ e indústria pesada”.
Em contraste, Prates avalia que a solar em larga escala não gera ganhos estruturais relevantes para a estatal. “Solar utility scale não entrega nada disso”, afirma, acrescentando que esse tipo de investimento “não gera aprendizado estratégico relevante”, “não cria cadeias industriais nacionais” e “não fortalece a soberania energética”.
O artigo também chama atenção para o perfil internacional da Lightsource BP, que opera em quase vinte países. Segundo o autor, isso exigiria uma presença regulatória e operacional robusta no exterior, justamente após a Petrobras ter promovido um processo de desinternacionalização. Para Prates, “reconstruir essa musculatura para gerir parques solares no Reino Unido, nos Estados Unidos, na Índia ou na Austrália não é trivial, nem barato, nem coerente com o estágio atual da companhia”.
No mercado brasileiro, as possíveis sinergias também são vistas como frágeis. Ele argumenta que não há integração relevante com áreas centrais da Petrobras e conclui que “trata-se de um mercado já maduro, pulverizado e ocupado por inúmeros players privados mais ágeis e especializados”.
A hipótese de aquisição de 50% da empresa, sem controle, é apontada como o aspecto mais preocupante do negócio. “É o pior dos mundos”, escreve Prates, ao avaliar que a Petrobras assumiria riscos financeiros sem comandar a estratégia. Em sua definição, “isso não é parceria estratégica. É transferência de risco com retorno limitado”.
Por fim, o ex-presidente contextualiza a movimentação da própria BP, que estaria revisando sua estratégia após apostar de forma antecipada na expansão solar. Para ele, embora seja natural que empresas privadas busquem desinvestir ou dividir riscos, causa estranhamento que uma estatal brasileira assuma esse papel. Ao concluir, Prates sintetiza sua visão ao afirmar que “transição energética não é um portfólio de ativos. É um projeto de país”, que, segundo ele, não pode ser construído “com atalhos mal pensados, por mais bem embalados que pareçam”.



