Evangélico agredido em vigília bolsonarista se diz comunista marxista-leninista
Fiel de 34 anos afirma ser marxista-leninista e diz que defende a condenação de Jair Bolsonaro, episódio que desencadeou agressões em ato no Rio
247 - O evangélico Ismael Lopes, 34, tornou-se o centro de uma cena de violência após discursar em uma vigília convocada pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), no Rio de Janeiro. O encontro foi realizado horas depois da prisão preventiva de Jair Bolsonaro (PL), decretada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.
À Folha de S. Paulo, Ismael Lopes contou que decidiu comparecer ao ato sem grandes planos, embora admitisse ter cogitado “fazer uma galhofa” enquanto registrava vídeos no local.
Segundo Lopes, tudo mudou quando percebeu a chance de usar o microfone. Ele mesmo havia solicitado a palavra ao senador. “Não foi nada tão planejado”, afirmou. “Eu iria à vigília de toda forma […] mais para fazer uma galhofa, gravar um videozinho aqui e ali e ir embora". Quando finalmente falou ao público majoritariamente bolsonarista, surpreendeu a todos ao defender a condenação do ex-presidente.
Diante da multidão, disse: “Nós temos orado por justiça neste país. Temos orado para aqueles que abrem covas caiam nelas. Não mortos, porque não é isso que a gente deseja. A gente deseja que sejam julgados e condenados pelo que fizeram". Em seguida, dirigiu-se diretamente ao filho mais velho de Bolsonaro: “Como o seu pai, que abriu 700 mil covas na pandemia, seja julgado pelo devido processo legal. Tenha seu direito de defesa, mas que seja condenado e responda pelos crimes que cometeu".
A reação foi imediata. Lopes contou que tentou prosseguir, afirmando que também deveriam ser responsabilizados os aliados que compõem “essa horda do mal”, quando o público o interrompeu aos gritos. Na sequência, ele foi alvo de chutes, socos e empurrões até ser retirado do local por um policial militar, como mostram vídeos que viralizaram nas redes sociais.
O militante integra a Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito, grupo progressista que atua na defesa de pautas sociais dentro do segmento religioso e que divulgou nota afirmando que o ato teve “caráter individual”. A organização declarou apoio a Lopes diante das agressões sofridas. Ele próprio já havia participado de agendas com representantes do governo Lula (PT), como uma reunião com Márcio Macêdo, então ministro da Secretaria-Geral da Presidência.
Evangélico desde a infância, criado na Assembleia de Deus e posteriormente ligado a uma igreja batista, Lopes afirma ter encontrado na Teologia da Missão Integral sua base de leitura progressista da fé. Em suas redes sociais, costuma fazer referências a pensadores de esquerda. Uma mensagem destacada em seu perfil diz que “o amor ao próximo só é possível com ódio de classe”. À Folha, ele se definiu como comunista da linha marxista-leninista que luta por melhores condições para a classe trabalhadora.
Sobre o momento em que decidiu falar na vigília, relatou que um pastor previsto para discursar havia faltado, abrindo espaço para que se apresentasse. Naquele instante, lembrou-se de uma passagem de Eclesiastes: “Quem abrir uma cova, nela cairá.” “Fiz a reflexão sobre o conteúdo do texto, trazendo para a nossa realidade”, explicou. Pouco depois, a situação degenerou em agressões e tumulto.
As gravações mostram que, ao deixar o palco, Lopes foi perseguido por manifestantes, enquanto alguns participantes tentavam contê-los e alegavam que aquela cena seria “uma armadilha” montada por ele. O fiel acabou retirado por um policial militar e conseguiu deixar o local.


