G20 na África do Sul aprova declaração climática apesar de boicote dos EUA
Documento avança em temas sensíveis como clima e dívida de países pobres, mesmo sob pressão do governo Trump
247 – O encontro de líderes do G20 realizado em Joanesburgo aprovou, neste sábado (22), uma declaração que aborda a crise climática e outros desafios globais, apesar do boicote dos Estados Unidos. As informações são da agência Reuters, que acompanhou as negociações e o clima de tensão entre a África do Sul, país anfitrião, e o governo do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
Logo após a aprovação, a Casa Branca acusou Pretória de “armar” sua presidência do G20. Segundo a agência, o texto foi redigido sem a participação dos EUA, que rejeitaram qualquer menção às mudanças climáticas.
Ramaphosa constrói consenso sem Washington
O presidente sul-africano Cyril Ramaphosa manteve a posição de que o documento não poderia ser renegociado.
Segundo seu porta-voz, Vincent Magwenya, “tivemos o ano inteiro trabalhando para esta adoção e a última semana tem sido bastante intensa”.
A ausência dos EUA foi interpretada por Pretória como um gesto político. A Casa Branca afirmou que Ramaphosa estaria “recusando-se a facilitar uma transição suave da presidência do G20”, após declarar que entregaria o martelo da presidência “a uma cadeira vazia”.
A porta-voz da Casa Branca, Anna Kelly, declarou ainda que “eles armaram sua presidência do G20 para minar os princípios fundadores do grupo”.
Trump, segundo Kelly, pretende “restaurar a legitimidade” do G20 quando assumir a presidência rotativa em 2026.
Argentina se afasta no último minuto
O presidente argentino Javier Milei, aliado próximo de Trump, também se afastou das negociações finais. Seu ministro das Relações Exteriores, Pablo Quirno, disse que Buenos Aires não endossaria o documento, mas manteria “o espírito de cooperação” do grupo.
Quirno justificou que algumas referências a conflitos geopolíticos, especialmente ao Oriente Médio, eram insuficientes.
“Especificamente, aborda o conflito de longa data no Oriente Médio de uma forma que não captura sua complexidade”, afirmou.
Mesmo assim, Ramaphosa decidiu avançar com a adoção, alegando “consenso suficiente”.
Documento inclui temas rejeitados pelos EUA
Diplomatas do G20 elaboraram o rascunho sem qualquer participação norte-americana.
Um alto funcionário do governo Trump criticou a iniciativa: “É vergonhoso que o governo sul-africano tente se desviar da prática tradicional de consenso”.
O texto inclui:
- referências diretas à gravidade das mudanças climáticas;
- necessidade de adaptação a eventos extremos;
- metas ambiciosas para energias renováveis;
- críticas ao peso da dívida em países pobres.
Menções ao clima são vistas como afronta direta a Trump, que nega o consenso científico sobre o aquecimento global.
Clima tenso após acusações de Trump sobre a África do Sul
As divergências entre Trump e Ramaphosa já vinham se acumulando. Durante visita de Ramaphosa à Casa Branca, em maio, Trump repetiu a falsa alegação de que haveria um “genocídio” de fazendeiros brancos na África do Sul — informação desmentida por organismos internacionais. Ramaphosa tentou corrigi-lo, mas foi ignorado.
Os EUA justificaram o boicote ao G20 afirmando que o governo da maioria negra sul-africana “persegue” a minoria branca — alegações amplamente desacreditadas.
Tensões globais ampliam rupturas dentro do G20
As discussões ocorreram em meio à guerra da Rússia na Ucrânia e às negociações climáticas da COP30 no Brasil.
O Japão destacou a importância de consenso. “A diversidade do G20 às vezes apresenta desafios, mas também reforça a necessidade de encontrar terreno comum”, afirmou Maki Kobayashi, secretária de Assuntos Públicos do gabinete japonês.
A União Europeia também advertiu sobre riscos geopolíticos.
A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, alertou contra a “instrumentalização de dependências”, em referência às restrições chinesas sobre minerais estratégicos.
O primeiro-ministro chinês, Li Qiang, pediu unidade: “O G20 deve enfrentar esses problemas, explorar soluções e promover o retorno ao caminho da cooperação”, afirmou em comunicado oficial.
África do Sul rejeita proposta dos EUA para entrega da presidência
Pretória também recusou a proposta dos EUA de enviar apenas um encarregado de negócios para a cerimônia de transferência da presidência do G20.
Segundo Magwenya, “o presidente não entregará a presidência do G20 a um funcionário de embaixada júnior”.
O chanceler sul-africano, Ronald Lamola, reforçou: “O G20 não é sobre os EUA. Somos todos membros iguais”.





