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Fernando Capotondo

Jornalista argentino. Chefe de redação da revista Contraeditorial e diretor do site cultural Llibres

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A nova busca das feiras de emprego na China

Com os jovens como prioridade, elas funcionam em um sistema híbrido que segue uma rígida programação

A nova busca das feiras de emprego na China (Foto: Xinhua)

Após anunciar que a situação do emprego se manteve relativamente estável durante o período do XIV Plano Quinquenal (2021-2025) – com 59,21 milhões de novos postos urbanos, mais de 200 milhões de trabalhadores qualificados e cerca de 66 bilhões de dólares em subsídios – o governo chinês lançou uma série de medidas para facilitar o acesso ao primeiro trabalho dos recém-formados universitários, um segmento do mercado que neste ano somou nada menos que 12 milhões de jovens.

O Ministério da Educação, em conjunto com o Ministério de Recursos Humanos e Segurança Social (MOHRSS), coordenou uma campanha nacional para recrutar 1,08 milhão de graduados da turma de 2025 para trabalhar em pequenas e médias empresas. Além disso, construiu uma plataforma com 4,07 bilhões de macrodados sobre recursos humanos e organizou 112 feiras de emprego (virtuais e presenciais) que disponibilizaram mais de 2,6 milhões de oportunidades reais.

“Para quem busca trabalho depois de se formar, a China oferece orientação profissional, oportunidades de treinamento e vagas concretas”, afirmou o vice-ministro de Recursos Humanos e Segurança Social, Yan Qinghui, ao destacar a decisão de fortalecer o que chamam de um dos “grupos-chave de emprego”. Esse movimento ocorre em um contexto em que a taxa de desemprego juvenil chega a 14,5% (excluindo estudantes), segundo a Agência Nacional de Estatísticas da China (NBS).

A dimensão dessa política pública impressiona: em apenas um mês (de meados de janeiro até 11 de fevereiro de 2025), foram organizadas cerca de 22 mil feiras de emprego e eventos de recrutamento em todo o país, com aproximadamente 15 milhões de vagas para jovens – e também adultos – em busca de trabalho.

Além desse recorde, cerca de mil empregadores em Xangai ofereceram, em poucos dias, aproximadamente 26 mil oportunidades, segundo a Secretaria Municipal de Recursos Humanos e Segurança Social, divulgada pelo jornal China Daily.

Em Guangzhou, uma feira realizada no âmbito da iniciativa “Milhões de Talentos Reunidos em Guangdong” atraiu mais de 120 mil candidatos de cerca de 800 universidades nacionais e internacionais, com quase mil empresas oferecendo 50 mil vagas presenciais e quase 600 mil digitais.

No município de Tianjin, no norte da China, uma feira de emprego voltada a pessoas com deficiência disponibilizou mais de 100 vagas para jovens graduados do ensino superior, configurando um caso raro de inclusão laboral, segundo a agência Xinhua. E outros exemplos semelhantes devem se multiplicar.

Emprego planejado

Hoje, as feiras 100% presenciais já fazem parte do passado, embora ainda sejam vistas imagens de “multidões” em alguns eventos. Organizadas por governos locais, universidades, ONGs e plataformas privadas como a Boss Zhipin (que chega a processar até 30 milhões de interações por dia), mais de 80% dessas feiras funcionam agora em modelo híbrido, com forte componente virtual. Esse formato elimina barreiras geográficas, aumenta a eficácia e ajuda a cumprir o objetivo nacional de “conectar talento e oportunidade”, como destaca o MOHRSS.

O uso combinado de inteligência artificial e big data permite analisar bilhões de dados trabalhistas em tempo real, aplicar filtros inteligentes, responder consultas 24 horas por dia e criar uma “conexão precisa” entre candidatos e empresas. Isso ajuda a antecipar demandas de talentos, identificar defasagens de qualificação e oferecer recomendações personalizadas.

Com essas ferramentas, muitas feiras tradicionais (antes lotadas e pouco eficazes) se especializaram em nichos específicos, voltados a perfis altamente particulares, como “mestre do chá”, “sommelier de baijiu”, “curador de algoritmos de entretenimento”, “piloto e técnico de drones agrícolas” ou “guardião de patrimônios culturais imateriais”.

Segundo analistas, a transformação tem forte conotação política: as feiras deixaram de ser apenas espaços de contratação para se tornarem instrumentos de planejamento econômico, redirecionando talentos para os setores considerados prioritários pelo governo.

Essa lógica explica o impulso em áreas como biotecnologia, inteligência artificial e veículos de nova energia, incluídas na lista das 72 novas profissões do XIV Plano Quinquenal, em detrimento de setores tradicionais da manufatura, que perdem relevância diante da automação e do aumento dos custos trabalhistas.

Esse modelo combina a escala massiva da China com intervenção estatal direta e tecnologia de ponta. É nessa linha que o representante do Escritório de Pesquisas do Conselho de Estado, Huang Lianghao, afirmou em debate organizado pela Xinhua que, embora a economia esteja em recuperação, o mercado de trabalho segue pressionado, sobretudo diante dos 12 milhões de novos graduados.

“Muitas pessoas lutam por empregos adequados e muitas empresas têm dificuldade em contratar o talento certo, mas é preciso fazer mais para resolver os desajustes estruturais. Uma capacitação profissional em larga escala não apenas aumentará a competitividade dos candidatos, mas também criará novas oportunidades, impulsionará a produtividade e fomentará a modernização industrial”, declarou Huang.

Na China, até procurar emprego parece – e de fato é – parte de um grande plano nacional.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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