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Jair de Souza

Economista formado pela UFRJ, mestre em linguística também pela UFRJ

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A turbulência atual é parte da luta de classes

A desmoralização do STF e do juiz Alexandre de Moraes neste momento favorece acima de tudo às pretensões da extrema direita nazifascista-bolsonarista

Brasília (DF) - 02/09/2025 - O ministro do STF Alexandre de Moraes (Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil)

Longe de esmorecer, a crise detonada a partir de revelações de fontes anônimas feitas por uma conhecida adepta do jornalismo lavajatista da rede Globo só ganhou em intensidade nos últimos dias. Tanto assim que, queiramos ou não, o principal tema na pauta de todos os meios de comunicação, inclusive dos pertencentes à chamada mídia contra-hegemônica, não é outro que a discussão a respeito da veracidade dos pontos divulgados, os propósitos por trás de sua divulgação e as consequências advindas da mesma.

Estou entre os que acreditam que, em sociedades compostas por classes com interesses conflitantes, as linhas mestras da política são traçadas pelos embates travados entre os diferentes grupos que a constituem. O que acabamos de dizer não é nada mais do que a tão conhecida, e temida, luta de classes. Por isso, em tais condições, não é possível entender as razões que determinam e impulsionam os comportamentos políticos de seus agentes sem que tenhamos clareza de suas expectativas, assim como da correlação de forças prevalecente entre os mesmos.

Apelos a motivações de cunho moralista, ou religioso, por exemplo, geralmente não passam de pretextos aos quais alguns setores de classe recorrem para induzir outros a aquiescerem com propostas favoráveis tão somente a eles, ou, por outro lado, com vistas a neutralizar as possíveis e indesejadas movimentações de resistência dos prejudicados.

Entretanto, quando não existe uma hegemonia marcante de uma classe, ou estamento de classe, sobre o conjunto da sociedade, de modo a permitir que as diretrizes políticas de um determinado grupo possam ser totalmente implementadas e acatadas pelo restante sem muita oposição efetiva, os vários grupos envolvidos no processo costumam estabelecer certas alianças temporárias com o objetivo de alcançar algumas metas consideradas prioritárias por todos os aliados, ou para evitar que pontos tidos como muito negativos ganhem força e se imponham. Evidentemente, estes aliados de um momento circunstancial podem voltar a se confrontarem com uma mudança do quadro contextual.

A meu ver, não é possível analisar coerentemente o atual panorama político sem levar em conta os postulados recém mencionados. Assim, nesta turbulência em que aparecem o Banco Master, o STF, Alexandre de Morais, a rede Globo e outros personagens, as primeiras perguntas que um analista comprometido com as maiorias populares deveria se fazer são: a) O que está por trás das revelações anônimas feitas pela jornalista lavajatista da rede Globo?; b) Em que os desfechos das mesmas podem afetar os interesses das maiorias trabalhadoras?; c) Quais os benefícios e/ou prejuízos para as maiorias populares ao aderir a uma ou outra das posições sendo defendidas?

Tentando raciocinar com estas preocupações em mente, cheguei à seguinte conclusão: a desmoralização do STF e do juiz Alexandre de Moraes neste momento favorece acima de tudo às pretensões da extrema direita nazifascista-bolsonarista e ao grande capital financeiro. Não pelo fato de Alexandre de Moraes e o STF como um todo representarem exemplos impolutos de aplicação da justiça, da imparcialidade, da garantia da defesa da Constituição, ou coisa pelo estilo. É que as únicas forças que tendem a ganhar com este debilitamento neste momento são os setores do grande capital financeiro e do rentismo. As forças populares nada devem esperar de bom com esse possível desfecho.

Bem, a partir do que eu disse no parágrafo anterior, deveríamos insistir em reforçar a imagem de um Alexandre de Moraes e um STF totalmente íntegros e incorruptíveis? Vamos nos mostrar insensíveis com a promiscuidade de juízes do STF com banqueiros e outros oligarcas? Vamos insistir em considerar como falsas quaisquer evidências apresentadas, por mais que pareçam verossímeis? Não creio que o caminho correto seja este.

A grande luta que nos cabe travar é a que se empenhe em mostrar que o objetivo real daqueles que lançaram o ataque contra Alexandre de Moraes e o STF neste momento não tem nada a ver com uma preocupação com a defesa da moralidade, com a luta contra a corrupção, etc. Aqui, o que seus propugnadores querem de fato é garantir que seus privilégios não sofram nenhum abalo. Por isso, nesta ocasião, para fazer valer seus interesses, eles arremetem contra Alexandre de Moraes e o STF em conjunto. Em outras circunstâncias, essas mesmas pessoas e entidades lhes eram úteis e favoráveis. Por então, eram defendidas e louvadas.

Nós não temos nenhuma pretensão de justificar contratos indecorosos de ninguém do Judiciário com bancos e outras corporações. Só não podemos admitir que, à pretexto de combatê-los, as classes dominantes e o nazifascismo-bolsonarista consigam reverter as justas condenações que foram aplicadas aos golpistas por sua atuação criminosa em 2022-2023. E nossa postura a respeito não se deve a nenhum punitivismo inveterado. Trata-se, sim, de impedir que a impunidade sirva como alento para novas empreitadas no mesmo sentido. Não podemos ter nenhuma ilusão: os grandes capitalistas financeiros e seus subordinados da mídia corporativa e do nazifascismo-bolsonarista não aceitam serem submetidos aos interesses das maiorias e, em consequência, sempre se mostram dispostos a retomar sua hegemonia.

Em outras palavras, a luta de classes continua em plena vigência por aqui. E é com base em seus postulados que nós deveríamos fazer nossas análises e tomar nossos posicionamentos. Na conjuntura em que estamos, os inimigos centrais das maiorias trabalhadoras não são o STF e o juiz Alexandre de Moraes, senão que os grupos e setores do grande capital que, coincidentemente, estão agora investindo contra eles. Tendo clareza disto, poderemos fazer o combate prioritário, sem precisar embelezar ou passar pano para certos aliados conjunturais, que já estiveram, e poderão voltar a estar, em trincheiras diferentes das nossas.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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