Ética de ocasião: a súbita crise moral da elite contra o STF
Críticas a Alexandre de Moraes reacendem práticas da Lava Jato e revelam interesses da elite econômica contra o Supremo
Rufem os tambores da moralidade seletiva! Eis que surge, diretamente dos salões iluministas da Faria Lima, uma revolta ética — e o Supremo Tribunal Federal, vejam só, é o novo vilão da temporada. O alvo da vez? Alexandre de Moraes, claro. Não pelo que o acusam de ter feito, mas pelo que já fez e simboliza: um freio incômodo no ímpeto destrutivo do bolsonarismo e nas manobras do centrão e seus financiadores.
Tudo começou com uma matéria publicada por Malu Gaspar, em O Globo, baseada em “fontes anônimas” e nenhuma prova concreta. A denúncia: Moraes teria pressionado o Banco Central em favor do Banco Master, que, por sua vez, tem contrato milionário com o escritório da esposa do ministro. Malu, vale lembrar, não é exatamente uma novata nesse tipo de narrativa: sua relação simbiótica com os vazamentos lavajatistas e com a fábrica de delações sem comprovação já é conhecida do público — ou deveria ser.
A imprensa tradicional, aquela que jurava ter aposentado os tribunais da moral lavajatista, reaparece indignada. Manchetes aos berros, editoriais com tremores de virtude e um novo escândalo para chamar de seu: R$ 129 milhões em contratos entre o Banco Master e o escritório da esposa do ministro. Um valor, digamos, modesto, considerando que a Faria Lima não levanta a sobrancelha por menos de meio bilhão.
Mas agora é diferente. Agora vale a pena parecer escandalizado. A ética — desaparecida desde o PowerPoint de Deltan — resolveu voltar das férias. E foi direto pra redação da Folha e do Estadão. Porque se tem algo que esses bastiões da seriedade nunca fizeram foi silenciar diante do abuso de poder, não é mesmo?
Suprema hipocrisia
Sim, o contrato é obscuro. Sim, falta transparência. Sim, o STF deveria ter um Código de Conduta — aliás, deveria desde 1988, mas só agora a elite descobriu isso. O timing é tudo: a indignação explode justamente quando Moraes se consolida como obstáculo à tentativa de golpe, desmonta o teatro golpista do 8 de janeiro e começa a incomodar os senhores feudais do orçamento secreto.
A pergunta que se impõe: quem tem medo do Supremo?
Spoiler: não é o povo. Não são os defensores da democracia. Quem treme diante de Moraes e companhia são os barões do Congresso que lavam bilhões em emendas RP9. São os banqueiros que oferecem “produtos financeiros” que fariam Pablo Escobar corar. São os órfãos da Lava Jato que, sem provas, sempre têm uma “narrativa”.
Lava Jato 2 – A revanche
A reestreia da velha fórmula vem completa: fontes anônimas, “dossiês” sem assinatura, suspeitas sem documentos, ilações com cara de furo. Tudo muito familiar. O novo nome da operação? Vontade Política de Vingança. O método? O mesmo: igualar agressores e instituições, golpistas e juízes, jornalistas e panfletários.
A Folha, por exemplo, decidiu dar um presente de Natal à credibilidade: um editorial que cobra moralidade do STF, mas esquece da própria colaboração com a ditadura militar e seus aparelhos de repressão e sua contribuição na transformação de Curitiba em república autônoma. O texto começa com tom professoral — “a falta de normas claras e específicas para reger a atuação privada de ministros do Supremo compromete a imagem da Corte e corrói sua autoridade” — mas logo cai a máscara: no auge da explicitação do alinhamento ideológico, exige que “não haja complacência com petistas e cupinchas de Lula pelo fato de amigos do presidente comandarem a Polícia Federal e vestirem togas no Supremo. A ruptura do pacto da impunidade fará mal apenas aos corruptos”.
E assim, a Folha — esse oráculo da imparcialidade — sela o editorial com um delírio lavajatista vintage, como se ainda fosse 2015, com Moro desfilando em eventos e PowerPoints virando manchetes. Só faltou um slide com “cupinchas do Lula” em vermelho e setas em neon.
O Estadão não ficou atrás: viu “ligações perigosas” no relacionamento do STF com o sistema financeiro — isso dito por quem até ontem escrevia editoriais apaixonados sobre o “empreendedorismo ético”.
O bom capitalismo (versão Instagram)
Eis que os paladinos da livre iniciativa acordaram: Arminio Fraga, Guilherme Leal, Salim Mattar e outros luminares da ética corporativa, quase todos banqueiros ou com fortes interesses no mercado financeiro, subscrevem manifesto pedindo um código de conduta para o Supremo. Uma coincidência absolutamente desinteressada, claro. Estão preocupados com a reputação da Corte. Sobre o Congresso capturado pelas máfias, os bilhões das emendas, os bancos que lavam dinheiro e se associam com traficantes de drogas? Silêncio. Afinal, quem nunca contratou um escritório por R$ 129 milhões que atire a primeira offshore.
Enquanto isso, ex-banqueiros e tecnocratas do velho BC lamentam que o STF ouse incomodar os “especialistas”. João Amoêdo, outro luminar do mercado financeiro e ex-presidente do Partido Novo, sempre pronto para defender os bons costumes de planilha, já pede o afastamento imediato de Moraes. Presunção de inocência? Coisa de comunista.
Felizmente, ainda resta alguém com bom senso: Lawrence Pih lembra que a gritaria contra Moraes é apenas o ensaio geral. Bah, mas Pih apoia Lula e é “desenvolvimentista”! O objetivo real? Abrir caminho para a revanche autoritária de 2026. Porque se o Supremo for desacreditado agora, tudo fica mais fácil depois.
Jornalismo ou chantagem?
O problema não é criticar o STF. Críticas bem fundamentadas são parte da democracia. Mas o que se vê hoje é outra coisa: fúria disfarçada de zelo, jornalismo travestido de vingança. E se há algo mais perigoso do que um ministro sem transparência, é um jornalismo que age como correia de transmissão dos interesses mais opacos do poder.
O STF não é santo. Mas também não é o mesmo tribunal que aplaudiu Sergio Moro e ignorou abusos por conveniência. O Brasil mudou. Os golpistas aprenderam com seus erros. Os financiadores estão mais discretos. E a imprensa — parte dela — parece disposta a tudo para recuperar o protagonismo perdido.
A julgar pelo esforço em demonizar Moraes, o recado é claro: o próximo passo não será um editorial. Será o fechamento do palco: o andar de cima não convive com a República.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.




