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Joaquim de Carvalho

Colunista do 247, foi subeditor de Veja e repórter do Jornal Nacional, entre outros veículos. Ganhou os prêmios Esso (equipe, 1992), Vladimir Herzog e Jornalismo Social (revista Imprensa). E-mail: joaquim@brasil247.com.br

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Há 129 milhões de motivos para não colocar a mão no fogo por Alexandre de Moraes

Setores da esquerda adotam uma defesa ingênua e apaixonada do ministro, como se qualquer questionamento fosse um ataque à democracia

Brasília (DF) - 03/09/2025 - O ministro do STF Alexandre de Moraes (Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil)

Em democracias maduras, a confiança nas instituições não se constrói com fé cega em autoridades, mas com transparência, explicações públicas e escrutínio permanente. É por isso que o debate em torno do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes não pode ser interditado por paixões políticas nem por lealdades automáticas. Há, hoje, pelo menos 129 milhões de motivos para perguntas legítimas continuarem sendo feitas.

O caso é conhecido: o escritório de advocacia de Viviane Barci, esposa de Alexandre de Moraes, firmou um contrato de 129 milhões de reais para representar o Banco Master. Até agora, porém, o ministro não explicou publicamente as circunstâncias desse contrato, nem respondeu a questionamentos sobre possíveis conflitos de interesse decorrentes da posição que ocupa no STF. Também não se sabe quanto desse valor foi efetivamente pago, já que nem Moraes nem Viviane Barci se manifestaram sobre o tema.

A jornalista Malu Gaspar relatou, em conversas em off, que o ministro teria procurado o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, para interceder em favor do Banco Master, num momento em que a instituição buscava autorização do BC para a venda de ativos ao BRB. Trata-se de uma informação jornalística que, até aqui, não foi esclarecida nem confirmada publicamente pelos envolvidos, e é  justamente por isso que permanece no terreno das perguntas, não das certezas.

É verdade que o silêncio é um direito. O contrato é entre partes privadas, e ninguém é obrigado a se autoincriminar ou a se explicar fora dos limites da lei. Mas também é verdade que questionar é um dever do jornalismo, sobretudo quando há figuras públicas, cifras vultosas e potenciais impactos sobre a credibilidade das instituições. Transparência não é punição; é requisito básico da vida republicana.

O quadro se torna ainda mais sensível quando se observa o papel do ministro Dias Toffoli em investigações conduzidas com pouca transparência e em desacordo com princípios jurídicos elementares, segundo críticos. Ao agir dessa forma, Toffoli acaba contribuindo para lançar desconfiança sobre setores do STF em meio ao que muitos já classificam como o maior golpe financeiro da história do Brasil. Mesmo que irregularidades não venham a ser comprovadas, a forma como os processos são conduzidos importa, e muito.

Chama atenção, nesse contexto, a reação de setores da esquerda, que adotam uma defesa ingênua e apaixonada de Alexandre de Moraes, como se qualquer questionamento fosse automaticamente um ataque à democracia. Esse comportamento ajuda a explicar por que a direita cresce enquanto a esquerda perde espaço junto ao eleitorado. Ao criar mitos e blindar figuras de poder, parte da esquerda se afasta daquele que deveria ser o verdadeiro motor da história: a classe trabalhadora, não indivíduos elevados à condição de heróis intocáveis.

Questionar autoridades não é flertar com o autoritarismo; é praticar cidadania. E enquanto perguntas legítimas seguirem sem resposta, ninguém deveria colocar a mão no fogo — nem por Alexandre de Moraes, nem por qualquer outro ocupante do poder.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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