O sepulcro da democracia
Violência na Câmara autorizada por Hugo Motta expõe escalada autoritária
247 - Na tarde desta terça-feira (9), cenas de violência tomaram o plenário da Câmara dos Deputados, em episódio que marcará indelevelmente a data como o dia da vergonha parlamentar.
A atuação do presidente da Câmara, o deputado Hugo Motta, é reveladora de um estilo fascistoide, que não se detém no uso da força e no recurso a práticas autoritárias no exercício do cargo.
O tumulto teve início quando agentes de segurança da Câmara, obedecendo a ordens diretas da presidência, retiraram de maneira brutal o deputado Glauber Braga, que fazia na mesa diretora um legítimo protesto em defesa do seu mandato. O parlamentar, um dos nomes mais combativos da esquerda, foi agarrado pelo pescoço, sufocado até perder momentaneamente a respiração e acabou arrastado para fora da Mesa Diretora e do plenário. Outros deputados também sofreram agressões e precisaram de atendimento no Serviço Médico da Casa, assim como o principal agredido.
O que se viu não foi um episódio isolado. A escalada autoritária de Hugo Motta, produto de um conchavo político costurado por seu antecessor e sustentado pela direita mal chamada de centrão, ficou ainda mais evidente com a proibição do acesso da imprensa ao plenário no momento da ação truculenta. A tentativa de impedir o registro audiovisual das agressões reforçou a combinação de violência e censura, numa atmosfera que remeteu a práticas de tempos sombrios da história brasileira, os tempos da ditadura militar.
O chefete do centrão que preside a casa legislativa agiu como carniceiro de Glauber. Este mesmo deputado de proveta agiu como cordeiro, quando se acovardou há quatro meses, durante a ocupação por deputados do centrão e da extrema-direita da mesa e do plenário da Câmara para impedir votações que contrariavam seus interesses. À época, o grupo bloqueou a Mesa Diretora, impediu o andamento dos trabalhos legislativos e exigiu a retirada de projetos que tratavam da responsabilização de aliados políticos. A ação se deu à luz do dia, diante dos servidores e da imprensa, e só terminou após intensa negociação. Hugo Motta adotou então postura complacente e submissa aos agressores do regimento e das normas democráticas, sem acionar qualquer medida enérgica contra eles.
A discrepância entre a docilidade exibida diante da ocupação e a violência empregada contra Glauber Braga nesta terça-feira revela a instrumentalização do poder interno da Câmara para atender aos interesses de uma coalizão entre a extrema-direita e setores do centrão.
O episódio desta terça-feira também foi marcado por ameaças vociferadas por deputados da extrema-direita contra os progressistas que tentaram proteger Glauber dos esbirros ordenados por Hugo Motta.
A agressão contra Glauber Braga ocorre no contexto da manobra conduzida por Motta para pautar simultaneamente os processos de cassação do próprio Glauber e dos bolsonaristas foragidos Eduardo Bolsonaro, Alexandre Ramagem e Carla Zambelli. A ação faz parte também do golpe legislativo destinado a pavimentar uma anistia ao ex-presidente Jair Bolsonaro, que se encontra preso por intentona golpista. Anistia maquiada sob o eufemismo de “dosimetria de penas”.
A condução antidemocrática de Motta e seu vínculo com a extrema direita alimentam denúncias de que a Câmara já opera sob um regime interno de exceção, no qual regras são reinterpretadas para favorecer aliados e intimidar adversários.
Diante da sucessão de abusos, é inevitável que cresça a pressão para que Hugo Motta deixe o comando da Câmara dos Deputados. Para setores democráticos, sua permanência representa o avanço de um modelo de controle autoritário sobre o Legislativo, calcado na força e em acordos com blocos como o centrão e a extrema-direita , que nos temas fundamentais atuam de forma coordenada.
Sob Hugo Motta a Câmara se tornou o sepulcro da democracia.
A crise desta terça-feira permanecerá como um marco do agravamento de uma crise institucional e evidencia os riscos de uma Câmara submetida ao arbítrio de seu presidente, num momento em que decisões importantes para o país dependem da preservação da normalidade democrática.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.




